A corrida pelo topo: como os privilégios da elite drenam o orçamento público

Em 1980, a Assembleia Legislativa da Paraíba determinou que as viúvas de desembargadores, governadores e deputados estaduais deveriam receber, além da pensão, 50% da remuneração do falecido enquanto estava na ativa. Quatro anos depois, esse benefício foi ampliado para incluir as viúvas e dependentes dos juízes.

Este privilégio, inalcançável para a maioria dos cidadãos, perdurou até ser considerado inconstitucional pela ministra Rosa Weber em 2023. Esse e outros casos de regras especiais para a elite do funcionalismo público são detalhados no livro de Bruno Carazza: "O país dos privilégios – Volume 1: Os novos e velhos donos do poder".

Para demonstrar a dimensão do problema, Carazza apresenta dados específicos do Judiciário. No Brasil, os gastos com todos os ramos de Justiça representam 1,6% do PIB. Em países emergentes, o custo do Judiciário é, em média, 0,5% do PIB, e em países ricos é de 0,3%. Esse 1% a mais que gastamos com o Judiciário seria suficiente para financiar o atual formato do Bolsa Família. Além disso, pequenas elites concentram salários e benefícios em várias áreas, como fiscais da receita, cartorários, militares e procuradores.

Como várias carreiras conseguem chegar não só próximo, mas até ultrapassar o teto de remuneração? Parte da resposta está na "comparação para cima" e no efeito âncora, que ocorre quando indivíduos usam uma informação de referência em suas decisões, mesmo que de forma desconexa. Na prática, a Emenda Constitucional nº 19/1998, que visava limitar os rendimentos no setor público e coibir abusos, virou uma meta salarial, não mais um teto.

Para ilustrar esse mecanismo, Carazza cita um caso mencionado no livro "Previsivelmente Irracional", de Dan Ariely. O governo americano pretendia expor a política salarial das grandes empresas para, através da divulgação dos salários de presidentes e diretores, constrangê-las a cortar excessos. Contudo, o efeito foi contrário. Em 1993, um CEO americano ganhava, em média, 131 vezes mais do que a mediana dos empregados de sua empresa. Em 2008, essa diferença saltou para 369 vezes.

Segundo Ariely, fatores psicológicos e comportamentais, como inveja e a necessidade de comparação, explicam esse resultado. As pessoas tendem a se preocupar mais com sua posição relativa do que absoluta, avaliando-se em comparação com seus pares e superiores, raramente considerando os menos favorecidos. Com a divulgação, os CEOs passaram a se comparar com os de outras empresas, gerando uma corrida para obter benefícios superiores. Em vez de reduzir a média salarial, a decisão incentivou uma escalada rumo ao topo. Similarmente, o teto do funcionalismo parece ter ancorado as expectativas salariais das carreiras que têm alto poder de barganha.

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