Para despiorar o socorro aos estados

Nos anos 1980 e 1990, a desordem fiscal nos estados era grande. Governadores contavam com a inflação para corroer a folha de salários e aumentar as receitas dos bancos estaduais, que financiavam diretamente os seus controladores.

O Banco Central, então responsável por autorizar operações de endividamento subnacionais (a partir de regras fixadas pelo Senado), era chamado à mesa de negociação toda vez que havia necessidade de socorro. A execução era feita via bancos federais, flexibilizando exigências prudenciais a bancos estaduais ou "emprestando" títulos de sua emissão para os estados captarem dinheiro em mercado.

O Plano Real desmontou o financiamento inflacionário dos bancos e dos tesouros estaduais, revelando o desequilíbrio que a inflação escondia. Foi necessário um programa de saneamento e privatização dos bancos, bem como a federalização das dívidas estaduais.

Esses socorros embutiram subsídio aos estados e custaram muito aos contribuintes. Em contrapartida, exigiu-se um programa de ajuste fiscal e aprovou-se a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).

O Banco Central foi retirado do processo de autorização de endividamento, afastando o risco de ser dragado para nova operação de socorro. A tarefa foi transferida ao Tesouro, que cumpriu bem a função, empoderado pela LRF e pelos instrumentos que garantiam o cumprimento do ajuste pelos estados, como a possibilidade de confiscar depósitos daqueles que não honrassem a dívida.

Os estados deixaram de ser um problema fiscal e melhoraram a qualidade e eficiência na prestação de serviços públicos.

A partir de 2008, esse arranjo institucional começou a ruir. Primeiro, porque o governo federal afrouxou os limites de endividamento. Segundo, porque os estados aprenderam a explorar brechas nos limites da LRF.

Em 2014, o desequilíbrio fiscal estadual já havia voltado a ser problema de primeira ordem. E o jogo político mudou. Os estados amealharam forte apoio no Congresso, onde cada parlamentar tem interesse em beneficiar o seu estado e jogar a conta para os contribuintes do resto do país. Governadores conseguiram obter vitórias sobre a União no STF, mesmo em causas sem fundamento jurídico ou econômico, geralmente sob o argumento de que o atendimento da população não poderia ser prejudicado.

Rompeu-se a principal cláusula da LRF: a proibição de novos socorros fiscais. Todos os governos, desde Dilma, foram forçados a renegociar a dívida. O Tesouro, que antes tinha poder para exigir ajuste aos estados, ficou acuado, sob pressão de governadores, Congresso e STF.

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Há incentivo a comportamento fiscal irresponsável, dada a alta probabilidade de repassar a conta para a União.

Tornou-se comum um estado tomar empréstimo no mercado com garantia da União, não pagar, e forçar a União a saldar o débito. Quando esta tenta executar a contragarantia, o estado consegue uma liminar do STF bloqueando a execução.

A coação ao Tesouro evoluiu ao ponto de os estados que estão no Regime de Recuperação Fiscal passarem a ter, por lei, o direito de não honrar as garantias e refinanciar o valor em 30 anos.

Desde 2016, a União já honrou R$ 70 bilhões e executou apenas R$ 6 bilhões em contragarantias.

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