No cinema, o inferno são os outros

Meu pai, entre outras atividades profissionais, era projecionista de cinema. Ganhar a vida honestamente tem disso.

Graças a ele frequentei muitos cinemas em que trabalhava, das salas de bairros, como o Ouro Verde e o Bandeirantes, às da Cinelândia Santista, ao longo da Avenida Ana Costa, casos do Cine Gonzaga, depois Atlântico, e de meu preferido, o saudoso Cine Indaiá, que tinha em suas paredes poemas de Vicente de Carvalho.

Na época, anos de 1960 a 1970, tempos de minha infância e adolescência, não havia os cinemas "multiplex". As salas eram enormes, algumas com mais de mil lugares, incluindo "pullmans", mezaninos que ficavam ao fundo. Ali eu ficava, geralmente sozinho, sob os olhos de meu pai, que me via pelas janelas de projeção.

Antes disso, ele me levava até a cabine, onde eu podia apreciar sua arte. Meu pai rebobinava os rolos de filme, recortava partes danificadas e fazia colagens imperceptíveis à assistência. Ele acoplava as lentes adequadas nos projetores, posicionava os carvões que geravam os arcos luminosos que serviam para projetar as películas. Também alternava os projetores para não perder a sequência do filme, colocava a música ambiente antes do início da rodagem, que era precedida por uma simulação imponente de três badaladas de sino.

Filmes impróprios? Nem pensar! A não ser quando eu levava comida para ele nas maratonas de domingo. Ele entrava à tarde e ia até a última sessão. Aí, eu dava umas espiadelas, antes de levar uma bronca. Eu era como o menino de Cinema Paradiso.

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