O caso Laís: que prevaleçam as boas intenções

Outro dia, um amigo que vive em Dublin há muitos anos me encaminhou uma notícia que mexeu com meu ✅corazón de sobrevivente de câncer.

Uma jovem brasileira, Laís Basílio, também residente na Irlanda, conseguiu o equivalente a mais de 30 mil reais em doações mentindo que tinha um câncer terminal.

Não só enganou um monte de gente bem-intencionada como um grupo filantrópico de apoio aos brasileiros com câncer na Irlanda que ajudou a dar visibilidade ao seu caso.

Ao contrário do que tem aparecido na imprensa, a associação Amor, Simples de Doar não é oficialmente uma ONG, e sim um grupo de sobreviventes, familiares e amigos que conhecem na pele o desafio de um diagnóstico -- que, para essas pessoas, além do mais, acontece longe de casa e, muitas vezes, na solidão.

"Nosso grupo tenta cobrir todas as necessidades de um paciente que está desesperado por respostas, que acabou de ser diagnosticado", explica Nathalie, uma voluntária (e sobrevivente) na página do Instagram do grupo. "A gente tenta amenizar um pouco essa situação".

Ela esclarece que o grupo não organiza vaquinhas diretamente, mas apoia e orienta familiares e pacientes nesse sentido.

Comovida, em um post que busca comentar o caso, ela pergunta: "Você tem noção de como é ser diagnosticado em outro país, longe da sua família, dos seus amigos? Isso é muito difícil".

Eu também fico profundamente chateada, Nathalie. E também fui diagnosticada longe de casa, em outro país, sozinha. Sou grata a alguns amigos e ONGs que me apoiaram nesse longo período de tratamento, repleto de incertezas, duro PAKA, pra dizer o indizível.

Laís, a menina do falso câncer, chegou ao ponto de raspar o cabelo pra simular os efeitos da quimioterapia (ainda que nem todos os tratamentos quimioterápicos gerem perda de cabelo, ao contrário da crença popular). Depois, começou a gerar desconfiança ao aparecer em festas se divertindo em redes sociais.

Laís, você não tem ideia. Tomara que não tenha nunca.

💥️BOAS INTENÇÕES

Logo depois de saber do caso, senti uma grande revolta e um profundo mal-estar.

Depois, pensei: vamos, sem dúvida, investigar e punir estafas do tipo.

Mas que seja este também um ensejo pra dar uma sacudida na vocação solidária de todos nós.

Em lugar de ceder a impulsos de ódio, animados pela comodidade dos comentários semianônimos em redes sociais, podemos também buscar nos informar e ajudar instituições e iniciativas que apoiem o paciente, o familiar e a pesquisa pela cura.

Essa seria a vingança mais doce.

"Não conseguimos descrever a revolta e indignação por uma pessoa brincar e mentir por algo tão sério", comenta Nathalie. "Esse assunto impactou diretamente cada familiar e cada pessoa que já perdeu um ente querido. E nós perdemos muitas pessoas -- inclusive, recentemente, duas pessoas com o mesmo câncer [que Laís dizia ter]. Se vcs soubessem... talvez entenderiam a revolta que estamos sentindo".

"Nós que passamos pelo câncer sabemos todos os desafios que a doença nos trouxe (...) Perdemos pessoas que amávamos, e isso impactou diretamente todos nós".

"Não vamos parar", concluiu. "Nosso grupo vai continuar".

Maravilhosos. Longa vida à solidariedade. Belíssimo projeto, como muitos outros que merecem nosso carinho e apoio. Com amor, de uma sobrevivente.

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