Terremoto na Turquia e na Síria: um mês depois, um balanço da catástrofe
Criança é vista no dia 14 de fevereiro de 2023 em meio a destroços de imóveis destruídos por terremoto na cidade de Kahramanmaras, na Turquia — Foto: Suhaib Salem/Reuters
As cifras são assustadoras: pelo menos 50 mil mortos, 214 mil prédios desabados ou em estado precário; somente na Turquia, as mortes e a destruição abrangem 11 províncias. Além disso, milhões perderam suas moradias e dependem de ajuda urgente.
Um mês após o devastador terremoto na Turquia e na Síria, ainda não é possível fazer um balanço completo das perdas e danos. Desde já, porém, está claro que se trata de uma das mais graves catástrofes naturais das últimas décadas na região.
Logo após o desastre, entre os sobreviventes a raiva se uniu ao luto. Como podem ter desabado tantos edifícios, supostamente à prova de terremotos? Grande parte da culpa pela gravidade das consequências é atribuída à negligência do Estado turco.
2 de 4 Mulher chora sobre corpo de vítima encontrada em escombros causados por terremoto na Turquia — Foto: Reuters
Mulher chora sobre corpo de vítima encontrada em escombros causados por terremoto na Turquia — Foto: Reuters
Além disso, diversas medidas preventivas recomendadas simplesmente não foram aplicadas. Há anos, relatórios do Afad, o departamento de defesa civil da Turquia, alertam sobre os graves efeitos de um eventual abalo sísmico. Em seu documento "Planos para minimização dos riscos de catástrofe", de 2023, o órgão previa um terremoto de magnitude 7,5 na província de Kahramanmaraş. Ignorado pelas autoridades, ao que tudo indica, esse prognóstico se concretizou em 6 de fevereiro de 2023.
Um dos grandes temas de debate na sociedade turca é o futuro das crianças atingidas, cujo número chega a 5 milhões, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
O órgão rechaça boatos de que algumas teriam sido entregues a grupos e associações islâmicas ligadas ao governo. No entanto, a emissora Halk TV reportou que 60 crianças desamparadas foram acomodadas em três casas do bairro Beykoz, em Istambul, onde estariam sob a guarda de grupos islamistas.
Uma reportagem da DW revelou também que nove crianças foram tomadas dos pais e inseridas num assim chamado "curso de Alcorão", promovido pela comunidade radical Ismailaga. Em ambos os casos, uma associação pelo bem-estar de mulheres e crianças apresentou denúncia.
3 de 4 Um homem caminha perto de prédios destruídos em Antakya, província de Hatay, Turquia, em 21 de fevereiro de 2023 — Foto: REUTERS/Thaier Al-SudaniUm homem caminha perto de prédios destruídos em Antakya, província de Hatay, Turquia, em 21 de fevereiro de 2023 — Foto: REUTERS/Thaier Al-Sudani
Segundo o Departamento de Estatísticas (TÜIK), as 11 províncias da área da catástrofe totalizam 14 milhões de habitantes. A economia da região, centrada em têxteis, aço e energia, além de agropecuária, é responsável por cerca de 9,8% do PIB nacional.
O Banco Mundial calcula os danos materiais em até US$ 34,2 bilhões. Em seu estudo detalhado sobre o impacto econômico do terremoto, por sua vez, o economista Mahfi Egilmez, ex-secretário de Estado no Ministério das Finanças turco chegou a US$ 48,7 bilhões.
Seu cálculo inclui a remoção das ruínas e destroços, construção de novos prédios e reparos dos danificados e da infraestrutura, aos quais somam-se US$ 2,5 bilhões de dólares em assistência financeira estatal.
A gigantesca tarefa de reconstrução incide numa época de crise econômica na Turquia. Especialistas antecipam que a destruição aumentará a demanda por diversos produtos e serviços, incrementando a inflação já elevada. O economista Murat Kubilay estima que a taxa alcançará no mínimo 50% até o fim do ano.
Também nos estádios de futebol manifestações de opinião indesejadas são objeto de punição. Após acusar o presidente Recep Tayyip Erdogan e seu governo de "20 anos de mentiras e fraude" e exigir sua renúncia durante uma partida, os torcedores do importante clube Fenerbahce foram proibidos de assistir a jogos futuros. Numa manifestação semelhante, fãs do Besiktas inundaram o campo com bichinhos de pelúcia, recordando sobretudo as vítimas infantis do desastre.
Há 12 anos a Síria enfrenta uma guerra civil, basicamente já vencida pelo regime de Bashar al-Assad com ajuda da Rússia e do Irã. No norte do país, o terremoto golpeou uma região já exaurida: segundo a mídia, cerca de 8,8 milhões de pessoas foram atingidas, e muitas estão desabrigadas. Até agora registraram-se 5.900 mortes, mas a cifra real deve ser muito mais elevada.
Nos primeiros dias após o terremoto, as vítimas sírias não receberam qualquer tipo de assistência; entre outros motivos, devido ao fechamento das passagens de fronteira. Nesse ínterim, ocorrem entregas de ajuda para o país, porém muitas não chegam até sua destinação, pois grande parte da área devastada não está sob o controle de Assad.
4 de 4 Imagem aérea mostra uma mesquita danificada na Síria, em 24 de fevereiro de 2023 — Foto: REUTERS/Khalil AshawiImagem aérea mostra uma mesquita danificada na Síria, em 24 de fevereiro de 2023 — Foto: REUTERS/Khalil Ashawi
A cidade de Idlib, por exemplo, é considerada o último reduto do rebeldes, sob o poder de milícias na maioria fundamentalistas islâmicas, e seus mais de 2 milhões de habitantes são refugiados de outras partes do país. Assim, o auxílio oficialmente direcionado à Síria nunca chega lá, denunciam observadores e atingidos.
No noroeste, antes mesmo do terremoto cerca de 1,8 milhão de pessoas já viviam em barracas, abrigos ou casas simples. Agora, muitos têm que pernoitar ao relento sob temperaturas glaciais, ou morar em casas destroçadas ou em seus próprios automóveis.
Esse é o caso do pai de família Ammar Fayyad, de Idlib: "Meu filho e eu estamos traumatizados. As barracas custam de 200 a 400 dólares, não temos como pagar. Então decidimos ficar aqui."
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