Caso Eloá: sem lei do feminicídio, imprensa viu crime como passional
De Universa, em São Paulo
entrevista com o criminoso durante o cárcere privado, cobertura em tempo real e o uso da expressão crime passional para justificar a atitude de um homem após o fim de um relacionamento com uma adolescente.Durante o programa, a jornalista Cris Fibe apontou erros da polícia e da imprensa na condução do caso e das negociações. Para ela, além de um papel bastante nocivo da imprensa em um desfecho trágico, a polícia também cometeu uma série de equívocos.
✅É lógico que a polícia cometeu sucessivos erros, inclusive de não tratar o risco à vida da Eloá com a devida seriedade. Os policiais, que eram homens, banalizaram o risco da misoginia e do ódio à mulher, que era a motivação daquele crime. A motivação não era a paixão. 💥️Cris Fibe
Além dos erros das forças de segurança pública, Fibe também questionou a atuação da imprensa, que ao fazer a transmissão ao vivo do sequestro acabou fornecendo uma série de informações para Lindemberg.
✅A gente [imprensa] entregou informações ao assassino em tempo real que permitiram que ele soubesse quais seriam os próximos passos da polícia. Enquanto isso também dava palco, que era o que ele mais desejava. Foi feito daquilo um circo e, pior do que isso, o crime foi romantizado. 💥️Cris Fibe
Ainda de acordo com Fibe, os equívocos fizeram com que a mensagem fosse transmitida da forma errada, dando a impressão que Lindemberg não era um assassino, e sim um herói apaixonado que não aceitava o fim do relacionamento. "A gente deveria ter deixado claro que o Lindemberg não era um herói, e sim um homem covarde que tem ódio das mulheres que contrariam ele e usa da força para mantê-las por perto", disse.
Em conversa com 💥️Universa, a diretora do documentário "Quem Matou Eloá?" e pesquisadora em gênero e audiovisual Lívia Perez, apontou também tolerância da polícia e da Justiça, ao deixarem o caso se estender por dias. Ela assistiu ao programa a pedido da reportagem. "Tem uma dramatização caricata do Lindemberg", opina. "Coloca ele como pessoa monstruosa, mas os crimes de violência contra a mulher são praticados por homens comuns, que são bons pais, bons amigos. O programa mostra alguém completamente fora de si e faz isso na iluminação, na trilha sonora, com o intuito de criar suspense. A meu ver, erra."
Fibe também concordou com Perez e, em sua visão, a construção da figura do monstro acaba sendo conveniente porque dá uma falsa sensação de conforto e a ilusão de que é possível para a mulher se prevenir desse tipo de crime.
✅Isso ajuda também a culpar a vítima, porque a gente coloca nela a responsabilidade de ter se colocado naquela situação, como se ela pudesse evitar ter se aproximado daquele que é um monstro. O Lindemberg não é um monstro, ele é um homem absolutamente comum e que está entre nós o tempo todo. Um homem misógino, que sente ódio das mulheres e que acha que é o dono dos nossos corpos. 💥️Cris Fibe
Semayat: 'Femicídios de mulheres negras e periféricas não geram comoção nacional'
Também durante o 💥️Sem Filtro, a jornalista Semayat Oliveira chamou a atenção para o caso de Eloá ter sido um dos poucos que gerou comoção nacional mesmo tendo acontecido em uma região periférica. Ela destacou que números do Fórum de Segurança Pública apontam que 62% dos feminicídios no Brasil acontecem com mulheres negras, mas que a comoção é quase inexistente.
✅Onde estão essas histórias e onde está a comoção? O que me chama muito a atenção é o fato de ter acontecido em um território periférico e as periferias ficam muito mais suscetíveis ao espetáculo da violência. Me questiono se teria acontecido da mesma forma se o local fosse uma região mais elitizada. A periferia acaba sendo esse palco muitas vezes, existe uma comoção seletiva e o espetáculo da violência é muito mais fácil de acontecer na periferia. 💥️Semayat Oliveira
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Assista ao 💥️Sem Filtro
✅Quando: às terças e sextas-feiras, às 14h.
✅Onde assistir: no YouTube de Universa, no Facebook de Universa e no Canal.
Veja a íntegra do programa:
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