IA é importante, mas como se implementa ? - Opinião Tek

Muitas empresas ainda caem na armadilha de aplicar IA de forma generalizada, esperando que qualquer iniciativa traga resultados imediatos mas Rui Figueiredo avisa que nem todos os casos trazem resultados rápidos. IA é importante, mas como se implementa ? © Gonçalo Barriga

💥️Por Rui Figueiredo (*)

Depois da WebSummit, bem como nos últimos anos, temos assistido a um crescimento exponencial na adoção de soluções de Inteligência Artificial (IA) por parte das empresas nacionais. A promessa seria única e altamente aliciante: o aumento de eficácia, com uma redução drástica e radical de custos, melhorando e otimizando a tomada de decisão.

A complexidade desta temática é algo que as empresas não têm em conta quando embarcam na aventura da transição digital e integração de IA em sistemas integrados num ecossistema corporativo.

A proposição é simples e é o fundamento deste artigo: os desafios críticos que as empresas enfrentam com a implementação da Inteligência Artificial e a importância de uma estratégia bem estruturada para alcançar valor sustentável.

Um dos primeiros desafios na implementação de IA é a escolha de casos de uso que gerem valor tangível. Muitas empresas ainda caem na armadilha de aplicar IA de forma generalizada, esperando que qualquer iniciativa traga resultados imediatos. No entanto, a realidade é que nem todos os casos de uso trazem retornos rápidos ou mensuráveis.

Por exemplo, iniciativas focadas no aumento da receita, como a implementação de mecanismos de preços inteligentes ou o uso de IA generativa para personalização de recomendações, podem gerar impacto financeiro direto, como foi, por exemplo, o caso de uma empresa de moda que aumentou o engagement com o cliente e previu elevar as vendas em milhões de euros. Por outro lado, objetivos voltados para aumento de produtividade, como a automatização de processos administrativos ou o desenvolvimento de ativos de marketing internos, podem reduzir custos, mas o seu impacto pode ser mais difícil de medir e sem retorno imediato.

Essa distinção é essencial para definir expectativas e avaliar o sucesso de cada projeto. Os gestores devem priorizar iniciativas cujo impacto no negócio seja claro e mensurável, especialmente em fases iniciais de adoção de IA. Caso contrário, corre-se o risco de alocar recursos sem garantir um retorno significativo. Portanto, é fundamental que as empresas escolham projetos de IA com base no potencial de criação de valor, priorizando iniciativas que estejam alinhadas com os objetivos estratégicos e ofereçam um impacto palpável.

Outro aspeto frequentemente negligenciado é a complexidade de transformar um Prova de Conceito (POC) num projeto em produção. Um POC é muitas vezes um protótipo que visa demonstrar a viabilidade técnica de uma solução de IA. No entanto, colocar essa solução em produção – isto é, integrá-la nas operações quotidianas da empresa – é uma tarefa muito mais desafiante. Envolve assegurar que a tecnologia se integra com os sistemas existentes, que os processos operacionais são adaptados e que as equipas de IT estão preparadas para suportar e manter a nova solução.

Este desafio é amplificado quando consideramos que muitos dos POCs de IA não são desenhados com a produção em mente. As equipas de desenvolvimento focam-se na criação de um protótipo funcional, mas não têm em consideração os requisitos de escalabilidade, segurança, e continuidade operacional que são críticos numa implementação real. Este problema é comum e está a tornar-se mais evidente à medida que empresas que investiram em IA nos últimos anos tentam agora passar para fases mais avançadas de adoção.

A atual onda de entusiasmo em torno da IA lembra o que aconteceu nos anos 2000, quando surgiu o boom das aplicações. Naquela época, a solução para quase tudo parecia ser o desenvolvimento de um CRM ou de uma aplicação personalizada. No entanto, muitas dessas iniciativas falharam por falta de planeamento e integração estratégica. O que parecia ser uma solução universal tornou-se uma dor de cabeça para muitas empresas, que acabaram por lidar com sistemas redundantes e mal integrados, com silos de bases de dados que populavam nos diversos gabinetes e departamentos.

Hoje, enfrentamos um risco semelhante com a IA. Uma empresa que lance este tipo de sistema, sem uma estratégia clara e sem uma visão de longo prazo, pode, facilmente, dispersar os seus recursos em projetos que, à primeira vista, parecem promissores, mas que, no final, se revelam ineficazes.  O outcome aqui é que a tecnologia por si só não é suficiente; é necessário um alinhamento com os objetivos e os processos empresariais para que os projetos de IA realmente agreguem valor.

Outro fator essencial a ter em conta para o sucesso na implementação de IA é a capacidade de construir uma ponte sólida entre a equipa técnica e os objetivos de negócio. Muitas vezes, as discussões sobre IA são dominadas pela perspetiva técnica, focando-se em algoritmos, modelos e infraestrutura. Contudo, a verdadeira vantagem competitiva reside na capacidade de compreender como essas soluções impactam o negócio. Empresas que conseguem ter uma visão integrada – onde a equipa técnica e os líderes de negócio trabalham de forma colaborativa – são as que mais probabilidades têm de extrair valor sustentável das suas iniciativas de IA.

Aqui, a comunicação desempenha um papel fundamental. As equipas técnicas devem ser capazes de explicar os aspetos técnicos numa linguagem acessível e relevante para o negócio, enquanto os gestores de negócio devem entender o suficiente de IA para definir prioridades realistas e alinhar os projetos com a estratégia da empresa. Esta ponte é o que permite a implementação de soluções que são viáveis do ponto de vista técnico, mas que também são úteis e seguras do ponto de vista operacional.

Por fim, é importante que as empresas adotem uma abordagem responsável e pragmática na implementação de IA no seu sistema integrado. Implementar IA não é apenas uma questão de tecnologia; deve-se considerar o impacto nos processos e nas pessoas da organização. Adicionalmente, a utilização de IA acarreta riscos que devem ser geridos com cuidado, especialmente em áreas críticas como a segurança dos dados e a integridade dos sistemas de IT.

A Inteligência Artificial continua a ter um potencial inegável para transformar os negócios, mas essa transformação não ocorre automaticamente. Para que a IA traga valor real, é fundamental que as empresas tenham uma visão clara dos desafios e das armadilhas que podem surgir pelo caminho. Escolher os casos de uso certos, compreender a complexidade de colocar um projeto em produção e construir uma ponte sólida entre o técnico e o negócio são passos essenciais para o sucesso. Mais importante, as empresas devem adotar uma abordagem pragmática e responsável, onde a IA não é vista apenas como uma ferramenta, mas como uma parte integral e estratégica do negócio.

(*) Co-Founder and CTO da DareData Engineering

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