Estamos vivendo uma bolha da inteligência artificial?

A promessa da IA generativa está levando as empresas a planejarem investimentos de US$ 1 trilhão

A promessa da IA generativa está levando as empresas a planejarem investimentos de US$ 1 trilhão Imagem: DC Studio/ Freepik

O mundo da IA (inteligência artificial) parece um conto de ficção. Com promessas que vão desde um ganho quase irrestrito de produtividade até a criação de uma inteligência que supera a humana, os fundos de investimento estão apostando em qualquer iniciativa que envolva essa tecnologia. Ninguém quer perder o bonde do que pode ser a próxima grande inovação.

Mas toda essa fantasia começa a receber cutucadas da realidade. Surgem evidências e argumentos de que a tecnologia atual é limitada e que o retorno do investimento talvez não venha. O novo relatório do Goldman Sachs manda um sinal de alerta ao mercado: será que estamos perto de uma bolha de IA?

No documento de mais de 30 páginas, especialistas e acadêmicos discutem que a promessa da IA generativa está levando as empresas a planejarem investimentos de US$ 1 trilhão em pesquisa, data centers e consumo de energia nos próximos anos. É um valor exorbitante até para as big techs. E a pergunta que fica é se a tecnologia tem fôlego para dar o retorno financeiro esperado.

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Para David Cahn, da Sequoia Capital, uma das mais famosas empresas de capital de risco, a indústria de tecnologia teria que gerar US$ 600 bilhões por ano em receitas para bancar os investimentos feitos em IA.

💥️Embora não estejamos nem perto desse valor, as big techs não dão sinal que vão dar um passo atrás.

A verdade é que o mercado está em um surto de FOMO (Fear Of Missing Out). O lançamento do ChatGPT projetou o imaginário social para um futuro incerto, mas foi o suficiente para agitar o mercado. Todas as big techs estão acelerando o desenvolvimento de suas IAs a um custo altíssimo, temendo serem superadas pelas concorrentes.

A prova disso é que Sundar Pichai, CEO do Google, disse aos acionistas na última terça-feira (23) que reconhece o alto custo da IA, mas que "o risco de subinvestir é dramaticamente maior do que o risco de superinvestir. Não investir para estar na frente tem desvantagens muito mais significativas."

As big techs seguem uma competição alucinante entre si para saber quem faz o modelo mais poderoso que vai dominar o mundo, embora não tenham muito claro como se posicionar nesse cenário de futuro e nem mesmo como monetizar todos os seus serviços.

O Google está patinando em como colocar a IA como funcionalidade central em seu buscador sem canibalizar os links patrocinados, que são sua principal fonte de receita.

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E eu ainda tenho dúvidas de como a Meta vai monetizar a sua IA que estará disponível de forma gratuita no Instagram, WhatsApp e Facebook. Não dá para o povo usar uma tecnologia cara demais só para criar figurinhas, né?

Mas se a indústria segue guiada pelo hype e o medo de ficar atrás, pelo menos estudos acadêmicos nos ajudam a entender melhor as possibilidades de uso, os desafios e o retorno real que a tecnologia pode trazer.

Daron Acemoglu, professor de economia do MIT e participante do relatório do Goldman Sachs, é um dos nomes mais céticos em relação ao progresso da IA. Ele acha que a tecnologia atual é superestimada.

💥️Enquanto muitos dizem que os ChatGPTs da vida são capazes de automatizar tudo e mais um pouco, ele avalia que apenas um quarto das tarefas expostas à IA serão economicamente viáveis para automatizar nos próximos 10 anos, resultando em uma melhoria em menos de 5% de todas as tarefas.

Acemoglu também coloca em dúvidas o rápido desenvolvimento da tecnologia e prevê que a IA aumentará a produtividade dos EUA em 0,5% e o crescimento do PIB em apenas 0,9% na próxima década.

Essa estimativa difere um pouco de um outro estudo publicado pelo Goldman Sachs em 2023 que projeta a IA trazendo um aumento de 7% para o PIB global em 10 anos.

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A discrepância demonstra o cenário de incerteza e pouca concordância que temos.

O desafio é que não dá para fazer projeções olhando apenas para as variáveis financeiras e econômicas, mas é preciso analisar também as dimensões regulatórias, ambientais e da própria tecnologia. Como discuti em outra coluna, a IA tem um desafio enorme por demandar uma quantidade colossal de energia elétrica e água para rodar seus modelos.

Um exemplo é o Google, cujas emissões de gases de efeito estufa aumentaram 48% nos últimos anos devido à expansão dos data centers que rodam os modelos de IA. De acordo com a própria empresa, o impacto ambiental futuro da IA é complexo e difícil de prever.

A dimensão legal e de regulação também traz barreiras. Se antes as empresas navegavam em um oceano azul desregulado em que podiam tudo porque ninguém estava prestando atenção, agora aparecem medidas que limitam o treinamento e comercialização de modelos.

A Apple já disse que vai atrasar o lançamento da Apple Intelligence na Europa, e a Meta suspendeu o lançamento da sua IA no Brasil.

E no meio de toda essa confusão de projeções, muitas vezes se esquecem de colocar na equação a variável mais importante: a própria natureza da tecnologia.

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A IA ainda está na sua infância, portanto qualquer previsão sobre o seu futuro e impacto na sociedade tem alta probabilidade de estar errada. Não é tão trivial antecipar com assertividade o roadmap do progresso de uma área que recebe tanto dinheiro e esforço de pesquisa.

O lançamento do ChatGPT e seus desdobramentos no mercado pegaram todos de surpresa, até nós que fazemos pesquisas com IA há anos. O que pode vir a seguir?

Muitas das projeções econômicas são baseadas nas capacidades e configurações da IA atual, mas a cada mês a coisa muda um pouco.

Estão surgindo modelos menores e mais eficientes que podem ser o caminho para muitos usos reais das empresas. Um exemplo é o recém-lançado "GPT-4o mini", 60% mais barato e com desempenho superior ao "GPT-3.5", que foi a grande estrela apenas um ano atrás.

No meio do caminho também pode ser que apareça alguma grande inovação, uma nova arquitetura de IA, que mude mais uma vez o rumo da história.

O mercado já reconhece que a arquitetura chamada Transformers, a base de funcionamento dos Modelos de Linguagens, pode estar chegando perto do seu limite. É por isso que as big techs e os principais centros de pesquisas estão correndo atrás do que pode ser o próximo avanço revolucionário.

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Quando vai chegar, não sabemos, mas menosprezar o potencial de uma tecnologia é um erro absurdo. É preciso encontrar um equilíbrio entre a euforia e o ceticismo em qualquer processo de inovação.

💥️Se tem uma coisa boa da especulação de uma possível "bolha prestes a estourar" é ajudar a diminuir o hype da IA.

O mercado precisa reconhecer as capacidades e limitações dos diferentes modelos de IA e desenhar casos de usos que se justifiquem financeiramente. Assim, as organizações entenderão que o futuro com IA é cheio de oportunidades, só que mais restritas e desafiadoras do que muitos tentam vender.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do.

O que você está lendo é [Estamos vivendo uma bolha da inteligência artificial?].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.

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