Venezuela: miopia estratégica ou cegueira deliberada?

As declarações do presidente Lula e de seu chanceler de fato, Celso Amorim, emprestando ares de pretensa normalidade ao arremedo de processo eleitoral na Venezuela, representam a gota d’água no desmantelamento institucional a que a política externa brasileira vem sendo submetida.

Em cenário de hipotética estratégia de ação externa que atendesse aos interesses pátrios, poderia ser essa oportunidade para demonstrar assertividade e algum verniz de liderança regional, ao passar a mensagem de que não se compactua com aventuras ditatoriais. Seria um daqueles momentos transformacionais em que o agente estatal constrói seu legado, mostrando integridade política e a grandeza da nação que representa. Não é o caso. A postura da dupla Lula-Amorim de dar tempo ao parceiro Maduro para a "entrega das atas eleitorais" significa tornar o Brasil cúmplice da perpetuação de uma ditadura sanguinária e corrupta.

Ao contrário de EUA, Argentina, Uruguai, Costa Rica, Peru, Equador e Panamá, que reconheceram a vitória de Edmundo González, Lula-Amorim ganham tempo se equilibrando no que um país sem bússola moral considera difícil cálculo político: não reconhecer a falcatrua madurista e contrariar sua base política, que subscreveu integralmente a fraude, junto com o "eixo do retrocesso progressista" formado por México, Bolívia e Colômbia, ou manter o rumo farsesco atual e isolar mais o Brasil na região, prejudicando as relações com o que resta do governo Biden (sem falar em possível novo governo Trump), e queimar o filme de "líder democrático" de Lula junto à claque europeia formada por Macron, Scholz e Starmer.

Embora tenha historicamente servido como vetor de nosso desenvolvimento, a política externa de Lula opera de forma errática, "progredindo" em sua marcha da insensatez rumo ao isolamento e descrédito internacional, com a substituição das tradições de nossa diplomacia por considerações ideológicas e preferências pessoais.

Essa posição se amolda às diretrizes do Foro de São Paulo, que julga indispensável a manutenção do regime bolivariano da Venezuela no projeto da "Pátria Grande" socialista. Conquanto se preveja substituição transitória por conservadores em função de ciclos eleitorais em países da região, o socialismo em Venezuela e Cuba é pilar dessa estratégia. Nesse contexto, o Brasil dispensa estratégia autônomas: trata-se do concurso da principal potência latina à manutenção da estratégia do foro, ainda que ao custo da supressão da vontade soberana dos venezuelanos e da destruição do patrimônio diplomático e da legitimidade do Brasil como mediador de boa-fé em situações conflituosas.

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