PCC faz censo do crime nacional para definir investimentos, combater rivais e direcionar alianças

Fazer um mapeamento nacional em um país com dimensões continentais é um desafio até mesmo para institutos reconhecidos. Mas um estudo produzido pela pesquisadora Camila Nunes Dias para o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) revela que a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) produz uma espécie de censo para quantificar não apenas os membros de suas fileiras, mas também de siglas rivais. E se esforça para repeti-lo a cada 15 dias, segundo Dias.

Obtido pela BBC News Brasil, o estudo de Dias foi feito inicialmente com base em dados obtidos nos estados da região Norte e mostra a intenção do PCC em saber quantos membros existem em cada facção e ainda as distinguem entre "amigas", "inimigas" ou "neutras". A intenção é logística e estratégica, para distribuir recursos e planejar sua expansão.

O primeiro "censo do crime" encontrado pela pesquisadora, com data de outubro de 2016, aponta quais eram as sete facções que atuavam nos estados do Acre, Amazonas e Pará naquela época.

Dias diz não ser possível precisar se essa foi a primeira vez que a facção fez esse tipo de levantamento, mas ressalta que foi na mesma época em que surgiram os primeiros conflitos relacionados à ruptura entre CV (Comando Vermelho) e PCC.

Autora do livro ✅PCC: Hegemonia nas prisões e monopólio da violência, a pesquisadora explica que a facção paulista e o CV mantinham um pacto para a compra de drogas e armas em regiões de fronteira e para a proteção de seus integrantes em prisões controladas pelos grupos.

O fim dessa aliança - que pode ter ocorrido por conta de uma disputa pelo controle de presídios - causou mortes em penitenciárias, rebeliões e acirrou as tensões também nas ruas.

Dez meses após o primeiro censo que se tem conhecimento, o estudo apontou que o PCC passou a ter mais detalhes em seus levantamentos.

Em agosto de 2017 - sete meses após uma chacina deixar 56 mortos em presídios de Manaus - a facção FDN (Família do Norte) tinha 6.000 membros contra 194 do PCC no Amazonas, segundo relatório da facção obtido pela pesquisadora.

O Atlas da Violência 2024, divulgado em junho, aponta que, pela primeira vez desde o início da série histórica (2016), o Amazonas apresentou a segunda maior taxa de homicídios do Brasil. Com 43,5 casos a cada 100 mil habitantes, o Estado fica atrás apenas da Bahia, que possui uma taxa de 46,8. A média do país é de 24,5.

Em entrevista à BBC News Brasil, Camila Nunes Dias, que também é pesquisadora do NEV (Núcleo de Estudos da Violência) da USP, diz que esta é a primeira vez que um censo como esse é usado para fazer uma análise do crime organizado na região Norte. Ela diz ter se surpreendido com os detalhes.

"Eu nunca ouvi falar em algo parecido. Isso demanda uma organização, o que os outros grupos não têm. Para isso, é necessário que cada integrante do PCC, responsável por cada Estado, responda e mande informações para essa central, a sintonia (liderança, no jargão do PCC) dos Estados e Países, que reúne todas as informações de cada Estado brasileiro e países onde a facção tem negócios", diz a pesquisadora, que também é professora de Políticas Públicas na UFABC (Universidade Federal do ABC).

Dias diz que é difícil ter certeza de que a facção faz o levantamento com uma periodicidade quinzenal, por conta da volatilidade e dificuldade para transmitir essas informações. Isso é dificultado porque a maioria dos responsáveis por esse levantamento está presa.

"Se você tem alguém que vai para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD ou castigo), ele é transferido de prisão e fica em isolamento. Isso vai impactar nas atividades da facção naquela unidade durante algum tempo até repor essa pessoa. O que consegui identificar é que há pelo menos a intencionalidade de uma periodicidade quinzenal", diz a pesquisadora.

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