Retorno de Fujimori à política do Peru expõe estratégia para driblar corrupção e manter poder

A família política mais poderosa do Peru volta a alvoroçar o instável país. Em uma dramática jogada, a ex-congressista Keiko Fujimori, que responde a vários processos por corrupção, resolveu apelar ao sentimento popular e lançou, na última semana, a candidatura à Presidência de seu pai, o ex-ditador Alberto Fujimori (1990-2000).

Condenado a 25 anos de prisão por crimes de corrupção e abuso aos direitos humanos, Fujimori, 85, contou com os filhos Keiko e Kenji em uma intensa campanha para deixar a penitenciária de Barbadillo, sob o argumento de ter uma doença terminal —não raro aparecendo em fotos acamado ou em cadeira de rodas e conectado a tubos de oxigênio. Em dezembro de 2023, o Tribunal Constitucional do Peru determinou que ele fosse transferido para a casa de Keiko, embora continue impedido de sair do país. Fujimori havia ficado atrás das grades por pouco mais de 15 anos.

Quem pensava que o gesto humanitário anunciaria uma decadência maior de sua saúde ou mesmo de sua morte próxima se equivocou. Começou aí a ser armada uma estratégia, arquitetada por ele e levada adiante por Keiko e pelo Força Popular, partido do qual ela é líder e que domina a aliança de direita com maioria no Congresso. Hoje, a presidente Dina Boluarte, originária da esquerda, da sigla do ex-mandatário Pedro Castillo, atua basicamente como se estivesse sequestrada pela bancada fujimorista.

Fujimori lançou-se como influencer, contando casos de sua passagem pelo poder no TikTok e em um podcast. Também publicou um livro sobre a operação Chavín de Huántar, com os bastidores do plano de invasão e recuperação da residência do embaixador japonês em Lima, em 1996.

Na ocasião, guerrilheiros do MRTA (Movimento Revolucionário Tupác Amaru) tinham ocupado a mansão, fazendo reféns os cerca de 800 convidados da festa da qual o embaixador era o anfitrião naquela noite. Eles reivindicavam a liberação de outros membros e denunciavam as más condições de vida no campo. Durante quatro meses, o Exército arquitetou uma maneira de entrar na residência e fazer o resgate. A ação foi considerada um sucesso: só um refém morreu, e todos os 14 terroristas foram mortos pelos agentes.

Receba no seu email uma seleção semanal com o que de mais importante aconteceu no mundo

Fujimori saiu muito fortalecido, assim como quando conseguiu prender, em 1992, Abimael Guzmán (1934-2021), líder do Sendero Luminoso, guerrilha cujo enfrentamento de décadas com o governo peruano deixou mais de 70 mil mortos. Teve grande repercussão a imagem de Guzmán vestindo uniforme de prisioneiro, com listras, como desejava Fujimori: "Queria que fosse parecido a como é nos filmes americanos."

Se esses triunfos do ex-ditador são hoje contados à população até mesmo em um livro infantil de quadrinhos, os crimes contra a humanidade pelos quais foi condenado obviamente não aparecem nessa recuperação de sua imagem. Entre eles as operações de seu esquadrão da morte, o Colina, responsável pelo assassinato ou desaparecimento de centenas de peruanos e por ações de extermínio em povoados, como nos casos de Barrios Altos e La Cantuta, ambos no início dos anos 1990.

Outra acusação de crime de lesa-humanidade que estava sendo julgada e agora ficou suspensa diz respeito às esterilizações forçadas de mulheres pobres, a maioria de localidades andinas em que nem sequer se fala espanhol, apenas o quéchua ou outras línguas indígenas. Segundo o processo, baseado em depoimentos de milhares de peruanas, o governo Fujimori realizava o procedimento sem explicar às vítimas. O argumento oficial era de "planejamento populacional" para controlar a pobreza, mas os relatos apontam para uma prática de violência de gênero que deixou mais de 250 mil mulheres estéreis.

O que você está lendo é [Retorno de Fujimori à política do Peru expõe estratégia para driblar corrupção e manter poder].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.

Wonderful comments

    Login You can publish only after logging in...