Estados se viciaram em socorro do Tesouro

Está em curso mais uma temporada da tediosa série de renegociações de dívidas dos governos estaduais. Desde o Plano Real, em 1994, houve ao menos quatro, que alteraram prazos e indexadores, sem falar na criação de regimes especiais, outras mudanças contratuais e nas interferências indevidas do Supremo Tribunal Federal.

Ressalvado acordo de 1997, que abriu caminho para um período de ajuste responsável e teve certa permanência, o enredo das outras se repete: as contrapartidas prometidas não são respeitadas e o problema não se resolve.

A postura oportunista de governadores, não raro com guarida do Judiciário e do Legislativo, leva a um quadro político em que a credora União se vê compelida a aceitar novos termos —com prejuízo para a responsabilidade gerencial.

É o que ocorre agora, com uma nova proposta de mudança nos contratos com foco nos maiores passivos. São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul respondem por algo próximo a 90% da dívida total, calculada em mais de R$ 760 bilhões.

Patrocinado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o projeto está em negociação entre governadores e o Ministério da Fazenda. Os termos devem ser anunciados nos próximos dias, mas algumas normas já indicadas não autorizam otimismo.

Em troca de aportes em educação técnica e outras condições, como amortização imediata de ao menos 20% por meio de transferência de ativos, seriam diminuídos os juros —de 4% ao ano atualmente para até 1%, mais o IPCA.

Uma parcela dessas reduções seria transferida a um fundo de equalização para beneficiar outros estados, uma vez que os grandes favorecidos da temporada atual são os poucos mais ricos.

Todo o conceito está errado. Os juros já foram reduzidos, em 2014, de 6% para 4% ao ano. Não se trata de agiotagem, como afirma o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil). A própria União hoje paga em seus títulos mais do que cobra dos estados.

As supostas contrapartidas em investimentos em educação técnica da quantia "economizada" em juros tampouco têm solidez, tendo em vista a dificuldade de monitoramento e a ausência de qualquer estudo sobre o assunto.

A negociação em torno desses temas de pouco alcance esconde o principal. Alguns estados até estão em boa situação de caixa, dadas as transferências federais durante a pandemia, mas não tardarão a enfrentar dificuldades.

A questão de fundo é que a maioria não modernizou sua máquina pública inchada nem fez reformas suficientes no sistema previdenciário do funcionalismo. É preciso que a autonomia federativa tão apregoada por governadores seja uma via de duas mãos. Autonomia pressupõe responsabilidade.

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