Agenda ambiental: o agro corre risco de ser surfista da sua própria dependência externa
Exportações de soja dependem muito da Ásia, com China em particular, ´região por enquanto longe da agenda ambiental (Imagem: REUTERS/Paulo Whitaker)
Surfar na onda da China, dos outros países do Sudeste asiático e da Rússia é o que o agronegócio, ou a maior parte dele, está fazendo. A aposta em mercados que não defendem a agenda ambiental (e correlatas) como os europeus pode ter um limite a qualquer tempo. Não foi apenas a recente fala do ex-ministro Blairo Maggi, mas pode-se lembrar do que disse Roberto Brant, da insuspeita Confederação Nacional da Agricultura (CNA), com exclusividade ao Money Times (5/8), segundo o qual a Ásia poderá acabar sendo suscetível à pressão europeia.
Tanto o presidente do Instituto CNA, quanto na entrevista ao jornal Valor Econômico de Maggi, o maior exportador de soja, deixam em suspenso o fato de que tudo pode mudar na relação comercial. Não basta termos a oferta que aqueles países necessitam, e muito.
O perigo não é o que os grandes consumidores fariam sem os produtos brasileiros. O perigo é o que o Brasil fará com a oferta sem a demanda deles ou até com compras menores. Restaria muito excedente e menor receita externa.
E não precisa ser apenas uma crise envolvendo diretamente o agro, mas há as tais situações correlatas. Pouco antes de falar com exclusividade aqui sobre os chineses, em palestra para empresários do agronegócio em São Paulo, Brant foi taxativo em apontar a questão do garimpo em terras indígenas, defendida por Jair Bolsonaro, como “política desnecessária” e que poderá respingar no agronegócio.
Muitos outros grandes agentes do mercado estão começando a se incomodar com as brechas que o governo vem dando para que as críticas se espalhem como rastilho de pólvora, mas ainda não sabem como lidar publicamente e muito menos como discutir com o governo. Ainda estão presos ao discurso de apoio eleitoral, como o próprio governo ainda. Além disso, há o discurso atual de mostrar força política internacional, a reboque do orgulho nacional, que domina muitos apoiadores do governo, como se isso fosse importante para aqueles que dependem de dólares externos.
Por enquanto o Brasil também se ampara no alinhamento com o governo de Donald Trump, também pouco afeito à agenda da produção sustentável. Porém, o pragmatismo americano, se for pressionado pela sua opinião pública, pode se reverter em desfavorável. E não somente nas compras diretas, mas quem pode duvidar que a pouca coerência do presidente dos Estados Unidos acabará incluindo alguma cláusula oportunista nas negociações com demais nações que estas possam barrar produtos brasileiros?
Ora, Brasil e Estados Unidos são concorrentes em carnes, soja, milho e poderá ser em etanol.
A Europa fecha o cerco. De um lado, os governos de França e Alemanha podendo barrar o acordo com o Mercosul, ou demorar para que seja aprovado no parlamento – além do dispositivo acordado em Bruxelas que pode barrar importações de países que não atendam suas políticas. E para meio entendedor, essa cláusula foi imposta diretamente contra o Brasil.
Do outro, a imprensa veicula cada vez mais críticas ao Brasil e ao presidente Jair Bolsonaro, como a TV alemã mostrando-o como o monstro da motoserra. E abertamente pedindo boicote aos produtos brasileiros.
Mas mesmo que na Europa, e menos nos Estados Unidos, os governos não tomem alguma ação concreta, um movimento mais amplo na sociedade pode acabar sendo desastroso. Aliás, uma rede de supermercado da Suécia já saiu na frente há várias semanas.
E chegará na Ásia e na Rússia, talvez numa velocidade e abrangência menores, porém não se deve apostar contra.
Por muito menos, sem pressão nenhuma externa, esses países defendem seus mercados com firmeza. A Rússia, por exemplo, ficou em 2018 sem comprar um kg sequer de carne brasileira, especialmente suínos, mas não faltou a proteína na mesa da população. A China já deu problemas com corte de frangos, parou de comprar açúcar brasileiro e impõe limites na pressa do governo e frigoríficos que querem ver novas plantas habilitadas e exportarem para lá.
Por qualquer período que se tome, as exportações totais do agro crescem via Ásia. Somente em 2018, passou dos US$ 100 bilhões as compras internacionais, sendo em torno de R$ 50 bilhões a soma daqueles países. China? Mais de 65%.
Dependência perigosa que um leve suspiro para baixo poderá afetar drasticamente alguns atores no Brasil.
Ainda apenas no campo da União Europeia, não se deve desprezar seu peso. É o segundo bloco de destino das exportações do agronegócio, com um incremento de 5% em 2018, batendo no total de US$ 17 bilhões. Carnes e farelo de soja, entre os principais, acabam tendo outras janelas importadoras, mas se ficarmos na fruticultura de mesa, suco de laranja e café, imagina-se o estrago se as compras dos europeus diminuírem.
São setores que dependem da Europa. Acrescente-se os Estados Unidos nisso.
Dito isto, não foi destacado o papel que Japão e Coreia do Sul, mercados exigentes em qualidade e com muita força da opinião pública. Estão abrindo mais compras do Brasil, sobretudo a até mais fechada Coreia.
O que você está lendo é [Agenda ambiental: o agro corre risco de ser surfista da sua própria dependência externa].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.
Wonderful comments