Bruno Mérola: Manifesto das sete classes e além

Bruno Mérola

“Um investidor prudente não deveria negligenciar, no longo prazo, qualquer uma das sete principais classes de ativos — incluindo os multimercados” diz o colunista (Imagem: Divulgação/Empiricus)

Em 1911, quando o audiovisual ainda era um adolescente francês, o teórico de cinema italiano Ricciotto Canudo publicou seu manifesto “O nascimento da sexta arte”, propondo o cinema como o mais novo integrante das cinco artes clássicas definidas pelo filósofo alemão Hegel: música, pintura, escultura, arquitetura e literatura.

Anos mais tarde, revendo suas próprias ideias, Canudo publicou o “Manifesto das sete artes”, incluindo a dança no grupo e levando o cinema para o fim da fila, ganhando a alcunha mais famosa de Sétima Arte.

O motivo da troca de posições era simples: o cinema era considerado a combinação da ciência com as outras seis artes que o precederam.

Da música, surgiram os efeitos sonoros e a trilha; da pintura, escultura e arquitetura, a cenografia e o design de produção; da literatura, os roteiros; da dança, as artes cênicas e a interpretação teatral.

Sons, movimentos, cores, formas, espaços e palavras. Hoje, é difícil imaginar o cinema sem qualquer um desses seis elementos.

Alocação de investimentos também combina ciência e arte, acompanhadas de muita sorte, é claro.

Por pertencer a um campo em que descobertas “científicas” podem te deixar milionário da noite para o dia, como uma oportunidade de arbitragem ou um novo jeito de precificar ativos, a produção acadêmica sobre finanças é vasta. Desde a fronteira eficiente de Markowitz nos anos 1950 até💥️ estudos mais recentes sobre a geração de alfa em carteiras de ações orientadas por fatores 💥️ESG, há uma multidão de gente inteligente por aí em busca do Santo Graal nos 💥️investimentos.

Mas também há o lado artístico. Por mais que eu admire a gestão sistemática e a velocidade de modelos matemáticos, é inegável que há alguns gestores brilhantes e experientes nessa indústria — e é difícil dizer qual das duas qualidades causam seus bons resultados.

Nesta semana, por exemplo, em que o fundo Verde reabre para reservas, um assinante me perguntou, ao vivo, quanto do resultado acumulado de mais de 18.000% do Verde veio do brilhantismo de Luis Stuhlberger.

Desculpe, simplesmente não há como saber — e muito menos como separar ciência de arte e sorte. Caso fosse possível fazê-lo com precisão, aliás, não passaria a ser tudo ciência imediatamente, como propõem os fundos sistemáticos?

Há aqui uma ponderação justa: quanto mais ineficiente e sujeito a riscos idiossincráticos um mercado, como os político-fiscais brasileiros, mais são valorizados o conhecimento tácito e a experiência acumulada no longo prazo.

Luis Stuhlberger, André Jakurski e Rogério Xavier não passarão a compor, juntos, as três maiores posições da principal carteira de fundos da série 💥️Os Melhores Fundos de Investimento à toa. São décadas de eventos de cauda (aquela cauda à brasileira, menos fina do que o livro-texto propõe), tomadas de decisão sob o ângulo da incerteza e todo tipo de sorte e revés para moldar carreiras inquestionáveis.

Tanto o gestor de multimercado como o alocador de recursos, e, no limite, você, investidor pessoa física, equivalem à sétima arte do manifesto de Canudo. Se não há tantas restrições, a alocação da sua carteira é um grande conjunto das seis classes de ativos básicos no Brasil.

Em pós-fixados, não há mistério, é onde fica sua reserva de emergência, em um fundo DI com taxa zero, sem risco de crédito ou de mercado.

Os prefixados têm um papel praticamente unidirecional para a pessoa física: ganham dinheiro quando os juros caem mais ou sobem menos do que as expectativas de mercado — especialmente os de curto prazo, mais ligados às decisões de política monetária.

Já os títulos indexados à inflação têm duas funções importantes. De um lado, protegem seu dinheiro contra altas dos preços (e daí a recomendação de sempre ter um pouco na carteira); de outro, podem ser bons instrumentos para ganhar dinheiro quando o risco-país se altera, especialmente os de maior vencimento.

Nossa quarta classe não é unânime. Há quem diga que crédito privado deve fazer parte de uma das três acima, afinal quando se empresta dinheiro para uma empresa, a remuneração pode ser pós-fixada, prefixada ou indexada à inflação.

Prefiro, porém, separar o risco de crédito em uma carteira por dois motivos: pela sua natureza côncava, em que se ganha sempre um pouco e pode-se perder muito de uma só vez, e pela especialização dos gestores nessa classe, treinados para analisar balanços de empresas com uma ótica diferente dos analistas de ações ou traders de juros.

Na sequência, vem a mais artística das classes. Sujeitas ao escrutínio das interpretações de demonstrações financeiras e a “plot twists” em governança corporativa, as ações têm natureza oposta à do crédito privado. No lugar de credor, sócio. Em vez de pequenos ganhos frequentes, as ações podem multiplicar seu capital várias vezes, além do pagamento de 💥️dividendos.

Por fim, os 💥️fundos imobiliários. Solução mais acessível e eficiente para o investidor brasileiro realizar seu desejo da casa própria (ou da laje e galpão próprios), essa classe costuma ter baixa correlação com as anteriores e ainda paga rendimentos isentos na sua conta.

Segurança, títulos públicos, proteção contra a inflação, prêmio por risco de crédito, participação em empresas e exposição ao mercado imobiliário. Hoje, é difícil imaginar uma carteira completa sem qualquer um desses seis elementos.

“Nos últimos anos, temos reforçado a importância de o investidor brasileiro sair do tradicional e aumentar sua exposição a moedas como o dólar”, afirma Bruno Mérola (Imagem: Pixabay)

Há espaço, claro, para propostas inovadoras. Filmes como “Dogville”, de Lars von Trier, que retira todos os elementos de cenografia e design de produção; “O Artista”, de Michel Hazanavicius, que homenageia o cinema mudo pra valer; e “O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho, dando mais destaque ao som do que a qualquer outra coisa, são propostas fora da caixa, que dificilmente servem a todos.

Da mesma maneira, um investidor prudente não deveria negligenciar, no longo prazo, qualquer uma das sete principais classes de ativos — incluindo os multimercados.

Porém, o fato menos conhecido é que, um século depois do manifesto de Canudo, já são 11 o total oficial de artes, com a fotografia, a história em quadrinhos, os videogames e a computação gráfica tendo entrado para o grupo.

Analogamente, também não devemos nos limitar mais às sete classes de ativos brasileiros mais clássicas. Nos últimos anos, temos reforçado a importância de o investidor brasileiro sair do tradicional e aumentar sua exposição a moedas como o 💥️dólar, a 💥️commodities como o 💥️ouro e a 💥️prata, a investimentos internacionais de maneira geral e, mais recentemente, a investimentos alternativos como private equity e venture capital.

Na série 💥️Os Melhores Fundos de Investimento, o desafio daqui para a frente é encontrar os novos artistas, gestores de fundos brilhantes e experientes em cada uma dessas novidades.

No lugar de um Oscar, mais dinheiro no seu bolso. Melhor, não?

O que você está lendo é [Bruno Mérola: Manifesto das sete classes e além].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.

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