Descoberta sem querer em pomar, estátua de 500 anos vira treta política
Quando raiou o primeiro sol de 2023, uma família de agricultores no interior do estado de Veracruz, no México, se reuniu para traçar um plano de remoção da grande pedra que havia em seu pomar. César Cabrera já tinha percebido que ela não sairia tão facilmente, então seus filhos engenheiros prepararam uma remoção mais profissional, com laços, tiras e trator.
Impressionados, eles viram que se tratava de uma estátua de uma mulher. Notificaram a prefeitura e, três dias depois, María Maldonado Vite, arqueóloga do Instituto Nacional de Antropologia e História (INAH), chegou à vila de Hidalgo Amajac, em Álamo, a quatro horas e meia de distância da Cidade do México.
Maldonado constatou, impressionada, que a estátua, pertencente à civilização huasteca, era autêntica e estava em ótimas condições, apenas com um arranhão causado pela escavadeira. A obra tem 2 metros de altura, mas a mulher esculpida tem só 1,30 m (o resto é a base). Os braços estão juntos ao corpo, com as mãos sobre a barriga, uma posição que remete à deusa Teem, relativa à fertilidade e às colheitas na cultura huasteca.
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Mais uma vez, ela encontrou resistência. A rotatória/rótula/rotunda/giradouro etc. já havia sido tomada pelas manifestantes, que grafitaram os nomes de dezenas de ativistas e de mulheres assassinadas. A praça virou ponto de encontro de feministas, local de apoio a parentes de vítimas de feminicídio e centro de informação sobre mulheres desaparecidas. Esses grupos anunciaram que não arredariam o pé dali.
Lideranças indígenas declararam apoio a Sheinbaum para instalar a Jovem de Amajac na praça. Mas não todas. "Não queremos ser legitimadas em pedra, e sim com justiça", declarou Argelia Betanzos, ativista mazateca e filha de um preso político.
A proposta não andou muito em 2022, mas no mês passado, às vésperas do 8 de março, a governante voltou a defender a instalação da obra e respondeu enfaticamente àquelas que a criticavam: "As mulheres que não a querem são profundamente racistas e classistas. Nós lutamos contra todos os preconceitos, todos, porque não queremos preconceito. Nem machismo nem racismo nem classismo, isso se chama humanismo mexicano."
A situação voltou a esquentar, as feministas se recusaram a deixar a praça, mas, após negociações entre as líderes, tudo caminha para que a Jovem de Amajac e a menina do antimonumento fiquem juntas na praça onde Colombo reinou por mais de 140 anos. Isso sem contar que a Paseo de la Reforma vem ganhando, desde 2023, estátuas de importantes (porém pouco conhecidas) mulheres da história mexicana. O conjunto é conhecido como Paseo de las Heroínas.