Felipe Miranda: A vida como ela é

💥️Por Felipe Miranda, CEO da Empiricus Research

Começamos a semana da forma tradicional: primeiro, a instituição Angela Bittencourt. Depois eu, Felipe.

COMO NEGOCIAR COM UM CAPITÃO?

Quantos amigos você tem? Olha, eu não tenho muitos, e entre os poucos que tenho, um está quase abandonando o bote. A coisa foi assim, o Eduardo não me deu trégua na quinta-feira. O Edu é cheio de convicção. E não quis me ouvir. Apelei até para a minha idade, sabe? Naquela de inspirar algum respeito… eu posso ser mãe dele. Mas o Eduardo nem deu bola. Eu gosto dele, é um amigo, e me preocupa que se apresente (dia sim e no outro também) como “fiador” do presidente Bolsonaro. Ele se acha…

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Não votei no Bolsonaro. Acho que o Edu não me perdoa por isso. Sei que é feio contar que anulei meu voto no ano passado. Mas lá, de frente para a urna, me pareceu melhor esperar o governo começar para, depois, escolher “um lado”.

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Na quinta-feira (21), eu disse para o Edu que não vejo com bons olhos a relação do presidente com o Congresso. E não vejo mesmo! Essa conversa de que ele não vai negociar NA-DA é conversa para boi dormir. O presidente pode não negociar, mas alguém vai e em seu nome… de outro jeito não vale.

Só espero que não seja nenhum daqueles filhos dele. Uns trapalhões. Eu aprendi, nesta minha longa vida de jornalista, que Congresso é coisa para “profissa”. Coisa para ministro, secretário, gente descolada. Sabe como é…?

Falei para o Edu que a reforma da Previdência periga não resolver nada. Ele acha bem o contrário. Amarrou a cara. Disse que a reforma está “no papo”!

Meu amigo (quase ex) acredita no interesse dos políticos que, diz ele, precisam agradar à maioria e, por isso, cedem. Não fosse assim, diz o Edu, os políticos nem estariam eleitos. Concordo com ele nesse ponto.

Ainda que no fim das contas a reforma da Previdência tenha um final feliz, até lá o presidente vai ter trabalho. O Paulo Guedes, então, nem se fala.

Se o governo já está neste pé, imagine os investidores…

Eu estou de olho para ver o que os políticos querem mudar na reforma para que fique mais branda para os funcionários públicos e para os militares. Os investidores também estão de olho… E ficam de cabelo em pé, principalmente aqueles quem nem moram no Brasil.

Penso que entendo alguns investidores e alguns devem pensar como eu. Será que o Brasil só tem a fazer a reforma da Previdência? O resto vem por milagre? Não seria melhor o governo ir tocando outros assuntos fora do Congresso? Alguma coisa que traz emprego? Gente empregada come melhor, dorme melhor e pensa melhor. Dizer que gente empregada não faz bobagem é uma bobagem. Mas faz menos.

Há dez dias, o governo leiloou 12 terminais de aeroportos e foi um baita sucesso. Arrecadou 2,38 bilhões de reais, mas, de início, poderia ter arrecadado apenas 219 milhões. O interesse foi grande, principalmente, de empresas estrangeiras. Na sexta-feira (22), o governo fez outros leilões. Desta vez, de áreas para armazenagem de combustíveis em portos na Paraíba e no Espírito Santo e entrou mais uma grana. Foram 219 milhões de reais, quando o governo esperava menos, 199 milhões.

Esse negócio de privatização, desde que feito direitinho, com regras claras, é o melhor que o governo tem a fazer, até porque não fica dependendo do Congresso.

O presidente Bolsonaro vive dizendo, e até já disse lá fora, nos EUA, quando visitou o Trump, que a reforma da Previdência é para garantir a aposentadoria das “próximas gerações”. Não é bem assim. Não dá para levar tudo o que o presidente fala ao pé da letra. Ele é espontâneo e usa a força da expressão. Aquelas frases de impacto que faz todo mundo prestar atenção.

Quando a nova Previdência for aprovada, ela vai indicar que o Brasil estará nos trinques quando o futuro chegar. E todo mundo sabe, você com certeza, que um Brasil menos endividado e mais confiante no futuro vai animar o investidor a trazer mais dinheiro para cá e até a construir fábricas. Mas e até lá?

Pulga atrás da orelha

Juntar dinheiro não é fácil. Eu até exagero. Tenho medo de que o meu futuro seja muito maior do que o dinheiro que tenho juntado. Minhas amigas têm parentes com mais de 100 anos!

Na semana passada, o meu chefe (sabe o Felipe Miranda?) me deixou com a pulga atrás da orelha. Acho que você leu, porque ele é mais lido que eu, mas vou repetir. O Felipe disse que se os “fundamentos” são bons, alguns eventos políticos só fazem ruído. Então decidi falar com uns entendidos. Nem perguntei para o Felipe para ele não pensar que deu emprego para a pessoa errada. Eu!

Entendi que o meu chefe quis dizer que os investidores se salvam, apesar das brigalhadas, dos desentendimentos entre o presidente, os filhos dele, os políticos e os juízes. Não dá para esquecer desses porque também aprontam.

O Felipe pode ter razão, mas eu sou desconfiada…

Um dos gestores que consultei disse que “fundamentos e senso de oportunidade” são variáveis importantes para o retorno do investimento. E que atendem interesses diferentes. Parece verdade.

Para o investidor de longo prazo, os fundamentos são as informações que mais interessam, disse o gestor. Já para os investidores de curto prazo, senso de oportunidade é o mais importante.

No longo prazo, a estrutura de uma economia ou sua consistência pode ser vista em vários indicadores. No longo prazo, o que conta é ter a certeza que o Brasil vai para a frente.

No curto prazo, interessa a brigalhada envolvendo Rodrigo Maia (DEM-RJ), Sérgio Moro, o vereador Carlos Bolsonaro e até o presidente, que disse, com outras palavras, que a reforma da Previdência é um problema do Congresso.

Será? Ele venceu a eleição porque disse que iria botar a casa em ordem… E, você sabe, presidente que não tem voz no Congresso acaba devendo para o eleitor. Tem decisão que o presidente não toma sozinho, por maior que seja a vontade.

Agora, veja bem! Eu não disse que presidente da República deve “comprar” apoio no Congresso. O presidente, qualquer um, deve “conquistar” apoio porque o seu programa econômico é bom, etc. e tal. O resto é chororô.

Mas voltando ao ponto, na semana passada os ativos financeiros mudaram radicalmente de posição e as guinadas favorecem as aplicações de curto prazo. Tem gente que gosta, claro, ainda que correndo riscos.

E um desses riscos, até comum, sabe qual é?

É comprar um ativo pensando que será fácil passá-lo adiante (quando seu preço estiver mais elevado) e não conseguir fazer isso.

Aqueles investidores que perceberam, na semana passada, que o diz-que-diz no Twitter entre autoridades estava aumentando de volume poderiam ter comprado dólar mais barato para vender a 3,90 reais, como era cotada a moeda americana, na sexta. Nem precisava ter comprado muito antes. Quem, por exemplo, comprou o dólar cedinho e vendeu no fim do dia ganhou 2,6 por cento. Outra guinada, mas ao contrário, deu o Ibovespa. Na terça-feira (19), o índice bateu novo recorde, cotado a 100.439 pontos. Na sexta, porém, caiu mais de 3 por cento, para 93.735 pontos.

O segundo gestor com quem falei sobre ruídos políticos e fundamentos foi em outra linha. Interessante também.

Ele explicou que a política é muito importante e pode estar por trás de muito ganho ou perda nos mercados.

No caso do Brasil, a reforma da Previdência está no Congresso e o projeto do governo provocará divergências entre parlamentares até ser aprovado, o que não será tão rápido. E a disputa entre os que gostam das propostas do governo e aqueles que querem outras propostas podem interferir no preço do dólar, do Ibovespa e também na taxa de juros.

Até propina faz diferença

O gestor que falou comigo na sexta-feira deu um exemplo externo de ruídos políticos que afetam os mercados: a divergência entre o presidente americano, Donald Trump, e os congressistas por causa do muro que ele quer construir na fronteira com o México. Para construir o muro, o presidente precisa de dinheiro e o Congresso não quer dar. Essa novela dura meses, e quando Trump fala mais grosso o dólar sai do lugar. A Bolsa também, mas o dólar é batata porque, como todos sabem, o dólar é a moeda dos Estados Unidos.

A política também influencia a estabilidade ou a manutenção de regras em um país. Condições que os governos estabelecem para fechar negócios, assinar contratos, por exemplo, podem alterar preços de outros ativos além de dólar, Bolsa e juros. Esse é o caso das privatizações de patrimônio da União, de Estados e municípios e também das empresas estatais.

O Congresso pode não estar diretamente ligado às privatizações, mas, indiretamente, pode estar porque é lá que as leis são feitas ou modificadas e podem ser contestadas posteriormente e afetar os preços do que está sendo vendido. Pode até inviabilizar as operações.

A adoção, concessão e mesmo a retirada de benefícios fiscais são decisões em que os congressistas atuam e podem impactar o retorno financeiro de setores da economia e até de empresas individualmente.

E tem ainda a questão da propina que conhecemos porque já aconteceu no passado recente do Brasil. A propina, que pode ser paga direta ou indiretamente por quem deseja garantir algum benefício em contratos, públicos ou privados, tende a trazer vantagens para empresas ou setores.

O investidor precisa mesmo é ficar esperto, procurar estar bem-informado sobre o que acontece no país, na sua cidade, na empresa onde trabalha e, principalmente, saber muito bem que riscos pode estar correndo quando escolhe este ou aquele investimento.

É preciso ficar claro, tim-tim por tim-tim, que enquanto deputados e senadores aprendem a negociar com o capitão (e vice-versa), semanas como a passada, de muitos altos e baixos no mercado financeiro, poderão ser mais frequentes e perturbadoras. Podem até dar a impressão de que nada mudou no país. E mudou! A começar pelo Congresso.

O Congresso precisa mostrar sua cara. Muita gente nova foi eleita e muitos políticos antigos foram embora. Com a renovação que ocorreu na Câmara e no Senado, e a geração de políticos que está chegando às duas Casas, líderes agora desconhecidos vão surgir e, com eles, velhas práticas devem desaparecer. Não é do dia para a noite. E nada acontecerá se as novas forças em Brasília não pisarem na água…

Aprender a negociar com o capitão é um desafio e uma necessidade. E o capitão deve dar uma chance para que esse aprendizado prospere. O capitão deve lutar? Claro que deve, mas talvez tenha primeiro que recuar para, então, avançar.

Nesta segunda-feira, os mercados voltarão toda sua atenção à Brasília para conferir o restabelecimento (ou não) de alguma harmonia entre os poderes Executivo e Legislativo. É improvável que a arrancada do dólar e a forte queda do Ibovespa, na sexta, sejam revertidas em uma sessão, inclusive, porque a semana reserva eventos importantes para a formação de preços dos ativos financeiros. Hoje, o Ibovespa Futuro abriu em queda de 1,6 por cento e, às 9h21, a baixa estava reduzida a 0,8 por centro com o índice aos 92.855 pontos.Nesta semana, o ministro da Economia, Paulo Guedes, comparece duas vezes ao Congresso. Na terça falará na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e, na quarta, será o centro da reunião conjunta da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e Comissão de Direitos Humanos (CDH). Trecho escrito por Ângela Bittencourt

“Quem é? Toca qual fundo? É tesoureiro de qual banco? Fundou qual empresa grande? É algum bilionário que eu não conheço?”

Ouvi essa bateria de perguntas de um grande gestor na semana passada. Há uma única linguagem respeitada pelos verdadeiros ganhadores de dinheiro e ela está descrita no parágrafo de abertura.

Lembrei-me do clássico de Warren Buffett: “Wall Street é o único lugar do mundo em que pessoas que andam de Rolls-Royce pedem conselhos a quem anda de metrô”. Pablo Triana também oferece versão parecida em “Lecturing Birds on Flying” — vamos nós, só porque conhecemos as regras da aerodinâmica, ensinar os pássaros a voar? Analogamente, como ensinar bilionários a ganhar dinheiro?

Fico sempre constrangido ao conversar com esse pessoal. Por trás do personagem, que, diga-se, também é verdadeiro, esconde-se uma pessoa bastante tímida.

Na sexta-feira, pude conversar com um tesoureiro de grande banco e um bilionário. Confesso que a melhor conversa mesmo foi com o meu filho, João Pedro, mas as outras duas foram bem boas também. E se digo “conversa” é pela ausência de termo melhor, porque, na verdade, nessas ocasiões assumo apenas a condição de ouvinte e aprendiz. Acho mesmo que tenho pouco, quase nada a oferecer-lhes e, portanto, fico calado tentando absorver o conhecimento alheio. Ao tratar de finanças, minhas orelhas ficam maiores e parecem se multiplicar diante de gente mais rica e inteligente do que eu, o que engloba apenas 99 por cento da população.

Aqui repasso as valiosas informações capturadas

O tesoureiro estava vendendo dólares. O gestor bilionário estava trocando parte de suas posições em ações de empresas exportadoras por companhias apegadas ao ciclo doméstico, com destaque para Kroton e Braskem.

Embora sejam posições distintas, partiam basicamente do mesmo racional: os acontecimentos da semana passada, ao deteriorarem o preço dos ativos de risco brasileiro, abriram uma oportunidade de compra interessante. A leitura era de que, apesar da volatilidade e dos sustos em torno do tema Previdência, isso era mais ruído do que sinal. Poderia até ter ficado mais difícil ou atrasar, mas, no final, a imposição inexorável das condições materiais garantiria a aprovação da reforma previdenciária no final.

Ninguém disse que seria fácil, tampouco rápido ou livre de momentos de incerteza e insegurança. Muito pelo contrário. Aqui, reiteradas vezes argumentei em prol da necessidade de preparação psicológica do investidor para o que viria. Disse que notícias seriam vazadas para proteger determinados grupos de interesse, que certos deputados tentariam vender caro suas posições, que jogos de poder seriam jogados e que, por várias vezes, haveria choro e ranger de dentes. Reforma da Previdência é complicada em qualquer lugar do mundo, porque mexe com interesses estabelecidos e com grupos de interesse. E o Brasil insere-se no grupo dos países mais complicados do mundo. Então, podemos nos preparar para tiro, porrada e bomba.

Minha sugestão segue a mesma de sempre: senta na mão. Essa é a hora de disciplina mental, tolerância à volatilidade e, se possível, adição marginal e gradativa de posições.

Não se trata aqui de dourar a pílula, tampouco da esperança ingênua típica dos ignorantes — o pessimismo sempre foi percebido como postura filosófica superior, de certa profundidade intelectual, enquanto o otimismo seria mais superficial e dotado de uma alegria imatura (Schopenhauer, Montaigne e, em alguma instância, Nietzsche sempre estiveram entre uma espécie de tríade incontestável da sabedoria; parte disso se deve a sua postura pessimista).

Reconheço que a semana passada foi péssima. E aqui me refiro à movimentação na margem, pois, como todos sabemos, importam mesmo os movimentos na margem, não no nível.

A reformulação da carreira dos militares veio em momento bastante ruim — ainda que possa ser meritória, dada a defasagem da categoria frente às demais, passa uma sinalização horrorosa neste momento, de falta de isonomia com as corporações e os grupos particulares; enquanto todos são cobrados por um sacrifício, os militares teriam melhoras de condições?

A prisão do presidente Temer tirou visibilidade sobre articulação no Congresso e sobre a postura do MDB principalmente (ainda que eu, Felipe, ainda prefira viver num país em que o combate à corrupção seja irrestrito).

Rodrigo Maia, importante nas negociações no Congresso, e o presidente Jair Bolsonaro estranharam-se nas redes sociais e em entrevistas à imprensa — sabe lá Deus todos os interesses que estão por trás dessa disputa pública, mas não parece uma boa ideia brigar com o dono da casa que vai servir o jantar; rusgas com o presidente da Câmara pouco agregam. Vale a volta também: não gera valor para o presidente da Câmara brigar com o chefe do Executivo; em especial, esse presidente da Câmara.

Maia cobra uma definição explícita do presidente Bolsonaro sobre o que seria a nova política. O Poder Executivo rebate dizendo que não jogará a velha política.

Comum à velha ou à nova, há apenas a política. E é disso que se trata aqui: do sentido clássico e etimológico da coisa, da polis grega, em seu sentido de cidade, essenciais para a organização social por meio de debates, diálogos, negociações.

Aqui é preciso diferenciar o que é meramente a conotação negativa dada a tal “velha política” do que é a essência do presidencialismo de coalizão. Marcos Lisboa e Samuel Pessôa chamaram brilhantemente atenção para esse ponto em artigos na Folha de ontem, em que lembram da possibilidade (talvez até mesmo necessidade) de se compartilhar poder em torno de um programa dentro do presidencialismo multipartidário, o que envolve negociar cargos e posições no gabinete após a negociação de um programa e de um projeto de país. Ao afastar essa possibilidade, o presidente Bolsonaro pode perder a parte mais nobre da política.

Apesar disso, não me parece razoável supor que tuítes mal colocados e alfinetadas na imprensa possam fazer-nos desviar da rota da recuperação. A reforma da Previdência é uma imposição inexorável. Sem ela, o país explode. E não temos vocação para explodir. Sem um ajuste nas contas previdenciárias, essa linha de despesa vai responder por 120 por cento do Orçamento em poucos anos.

Ninguém quer isso. Os parlamentares não querem porque precisam de suas emendas. O presidente quer porque sabe que seu governo acaba antes de começar se não aprovar a reforma da Previdência. Os governadores querem porque estão quebrados e precisam de dinheiro. E a população precisa porque o crescimento econômico e a melhor distribuição de renda exigem acerto das contas públicas.

O caminho vai ser tortuoso. Quando se está no meio de um furacão na travessia, a visibilidade é baixa. No final, porém, vai dar certo. É preciso apegar-se ao estrutural. A ação mexe pra cá e pra lá. O diabo da renda variável é que ela varia. No final do dia, acaba seguindo o lucro da empresa.

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