Bunge-BP: fusão em cenário de crise e futuro ainda apenas no papel
Aumentar a produtividade da cana é um dos desafios da nova empresa (Imagem: ASCANA)
A Bunge saiu de um problema, conseguindo um sócio quando até bem pouco esperava um comprador para seus ativos, e a BP resolveu outro, vindo a ter maior participação no mercado de renováveis e tentando tirar de si a pressão ambiental sofrida, especialmente no seu berço europeu, por sua participação global no petróleo. A join venture entre ambas, que traz ao mercado sucroenergético um novo grau concentrador, surpreendeu pelo momento que o setor vive e pela aposta em um futuro que ainda está só papel.
A situação de desequilíbrio estrutural, carregado há anos pela expansão e alavancagem na primeira década dos anos 2000, depois pelo engessamento dos preços dos combustíveis com Dilma Rousseff, e agora com a Índia deprimindo os preços com seus subsídios, deixaram a atividade com poucas empresas sustentáveis na parte agrícola. O calcanhar de Aquiles hoje, onde prevalece a baixa produtividade.
Daí advindo, por exemplo, a considerável exposição da Bunge, com 8 usinas, que o seu diretor-presidente, Gregory Heckman, comemorou como solucionada ao anunciar a fusão ontem. A BP vai dar US$ 775 milhões para a trading e processadora saldar a dívida, e as duas vão dividir a gestão e as ações, somando 11 unidades, 32 milhões de toneladas de cana, 1,5 bilhão de litros de etanol e 1,1 milhão de toneladas de açúcar, baseados nos dados de 2018.
Diante dessa situação presente, a ponte para futuro surpreende positivamente também porque há uma aposta no RenovaBio, que Alexandre Figliolino, consultor da MB Agro, pensa que só vai ter resultados concretos a partir de 2023/2024, projetando ainda se os “CBios vão funcionar e qual vai ser o impacto econômico”.
Esses papéis é que moldarão o desempenho do programa e sua real evolução em termos de dobrar a produção e consumo do etanol até 2030. As processadoras os negociarão com as distribuidoras em volume e valor de acordo com o grau de descarbonização medido nos processos produtivos. Os CBios depois serão negociados na B3.
“O RenovaBio é inteligente, mas temos que esperar”, avalia Figliolino, ex-Itaú BBA. Mas ele acredita ainda que a fusão entre a petroleira e a Bunge pode começar a ganhar antes se houver uma recuperação gradual do setor agrícola em termos de recuperação de produtividade via renovação de canaviais, “como já tivemos no passado”.
Em relação à sinergia, as operações dos ativos estão entre as que mais chama a atenção no total de unidades, ressalvando, de acordo com o consultor, três unidades da Bunge (Mato Grosso do Sul, Tocantins e Norte).
A concentração de mercado vai deixar a nova empresa combinada disputando o segundo lugar com a multinacional Biosev, de outra trading na origem, a Louis Dreyfus, com a Raízen (Cosan-Shell) mantendo pouco mais que dobro em moagem de cana, em torno dos 65 milhões de toneladas.
Longe de chegar perto do que foi o passado que abriu a crise do setor, com a consolidação de vários grupos e a chegada das multinacionais, também de certa forma pode ser um começo de “reorganização do setor”, com menos participantes no mercado, analisa Alexandre Figliolino.
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