Perdi minha filha num incêndio e decidi ir à prisão ver o criminoso
Heloísa Barrense
De Universa, em São Paulo
Tempos depois, ela descobriu que o incêndio foi criminoso. Em uma tentativa de recomeçar a vida, decidiu visitar o autor do crime no presídio para perdoá-lo.
Hoje, casada novamente e à espera do segundo filho, ela contou a 💥️Universa como foi o processo de luto.
"Era quase impossível respirar ali"
"Era um domingo, madrugada do dia 15 de março de 2023. Eu estava no apartamento com a minha família e, por volta das 5h, acordamos com estouros, tiros, barulhos de alarme de carro disparando. Ainda estava escuro lá fora, mas o Thiago, meu marido na época, levantou e olhou na janela. Morávamos no quarto andar. Naquele momento, ele não viu nada de diferente na rua.
Quando acendemos a luz, tinha uma fumaça branca e um cheiro de fio queimado na sala. Imaginamos que seria um curto-circuito e ele foi pegar o chinelo no quarto para resolver o problema. Quando voltamos para a sala, a fumaça já estava muito forte e tinha aumentado. Foi então que decidimos sair do apartamento.
Ele pegou a nossa filha, a Helena, no colo e eu abri a porta para descermos. Então, veio uma fumaça muito preta, que não deixava a gente enxergar nada. Parecia que estávamos em uma chaminé. Ela entrou rapidamente por todo o meu apartamento. Quando coloquei o primeiro pé no degrau, desci caindo porque a escada estava toda escorregadia. Daí, não enxergava mais eles.
Escutei os dois caindo na escada e a Helena respirando, mas não os via. Era quase impossível respirar ali. Hoje falo que foi por Deus que saí daquele prédio. Quando cheguei na rua, olhei para o edifício e vi que estava em chamas. Era um incêndio de proporção enorme.
Imaginei que minha família não tinha conseguido sair, até que vi o Thiago, sem a Helena. Ele disse que não tinha conseguido salvá-la, mas voltou ao prédio inúmeras vezes. Empurrou todos os bombeiros tentando entrar, mas era impossível. No fim, ele ficou com 80% do corpo queimado. Na última vez que saiu do prédio, ele pediu ajuda porque o corpo já estava muito queimado.
Mãe conta que filha falava sobre morte constantemente
E a Helena me ensinou muito. Ela era uma criança intensa. Tudo o que eu fiz com ela foi muito marcante. Digo que era uma criança de outro mundo pelas coisas que ela falava e a forma que agia, desde pequena já era muito espiritualizada.
Desde que começou a falar, sempre falava sobre virar estrelinha e chorava dizendo que não queria isso. Cheguei a perguntar na escola se estavam falando sobre morte, porque me assustava a forma como ela dizia.
✅No sábado, antes de ela morrer, a gente estava brincando e ela falou pra mim que queria contar um segredo, que o pai dela não poderia saber. Disse: 'mamãe, você sabia que eu vou morrer?'. Eu levantei da cama na hora e falei: 'por que você está falando isso? Você sabe que mamãe não gosta'. E ela disse que o papai do céu estava aparecendo para ela todos os dias de noite e que ela estava com medo de ficar sozinha.
Fiquei apavorada, mandei mensagem para a minha mãe contando isso e disse que iria procurar um psicólogo. E no domingo aconteceu tudo isso.
Acredito que ela sabia que isso fosse acontecer e que ela tinha um propósito muito grande aqui no mundo de espalhar amor, de mudar a vida das pessoas com essa história.
✅Falar de morte é tabu, ninguém quer falar, mas todo mundo já passou por um processo de luto. Acho que a fé vem para dar uma força para esse momento. E a psicologia vem para me transformar e ajudar muitas pessoas. Recebi muitos relatos de gente que, ao saber do meu depoimento, valorizam mais a vida, a família.
Agora, por meio da psicologia, quero continuar ajudando as pessoas, especialmente na área hospitalar, onde existe gente vivendo perdas diariamente. Ninguém está preparado para a passar pela morte, mas nós conseguimos sobreviver."
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