Copa do Mundo Feminina: mulheres são muito frágeis para o futebol?
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Cristina Fibe
Por ser historicamente recente a regulamentação do futebol feminino, ainda estranhamos vê-las na disputa de bola, e passa pelas nossas cabeças que elas, talvez, não tenham corpos tão resistentes quanto os dos homens. Elas não vão aguentar, eles dizem.
A ironia está no fato de que pouca gente leva a sério o sofrimento da mulher. Especialistas em saúde apontam que somos mais afetadas por dores crônicas mas, também, mais questionadas e negligenciadas quando nos queixamos delas.
A alta tolerância para o sofrimento feminino atrasa diagnósticos de doenças que podem se agravar, como a endometriose. Escutamos que é "normal" sentir cólica, que é "natural" a relação sexual machucar. Às vezes demoramos anos a perceber que algo vai mal. Ou percebemos no mesmo instante, mas não somos ouvidas, mesmo por médicos.
Foi o que aconteceu numa das mais respeitadas clínicas de fertilização dos Estados Unidos. Ao longo de meses, uma enfermeira do Centro de Fertilidade de Yale desviou o opióide fentanil, que seria aplicado nas pacientes, e o substituiu por uma solução salina. O caso foi descoberto em 2023.
Um podcast recém-lançado pelo jornal "The New York Times" conta as histórias de algumas das centenas de mulheres que passaram pelo procedimento de retirada de óvulos sem anestesia. Mais do que relatar o crime de que foram vítimas, a produção, intitulada "The Retrievals", procura entender por que não se leva a sério a dor das mulheres.
Elas reclamavam, sim. Passar pelo procedimento era insuportável, e enfermeiros e médicos eram alertados de que a anestesia não surtia efeito nenhum. As mulheres conseguiam sentir a agulha entrando em seu corpo, fincando na parede do útero, sendo inserida mais a fundo para alcançar e puxar cada um de seus óvulos.
"Você sente cada agulhada", contou uma paciente. "Eu suava e avisava que a dor era demais, que eles precisavam parar. Uma enfermeira botava toalha molhada na minha cabeça, me consolava e me dizia para aguentar."
Outra mulher contou que chegou a ser segurada na maca para conseguir permanecer imóvel e para que a longa agulha usada no procedimento não fosse parar no lugar errado. "Eu levantava o meu quadril de dor e avisava que conseguia sentir tudo. Ninguém acreditava em mim. E o que você vai fazer? Você quer engravidar."
"A enfermeira dizia que já tinha dado todo o anestésico que podia. E eu pensava: 'Como isso é possível, como as pessoas passam por isso?'"
"Parecia que alguém estava arrancando algo de dentro de mim."
Era um coro de mulheres avisando que algo estava errado. Mas a dor feminina era absolutamente tolerada, minimizada —para não dizer ignorada. Os alertas das pacientes não serviram de nada. Nenhuma dor era grande demais quando havia um objetivo final como a maternidade.
Um chute na canela, aí não: isso já é demais.
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