Aprendi a arregaçar as mangas, diz Zezé Motta
Adriana Negreiros
De Universa, em São Paulo
"Um imbecil", define Zezé, ao relembrar a história. Por alguns segundos, enquanto olhava para o passageiro, indignada, ela pensou em devolver a grosseria. Em vez disso, aguardou a comandante concluir a decolagem e, uma vez liberada pela tripulação a levantar-se, procurou um assento disponível bem longe dali.
"Não ia fazer com que ele conseguisse mudar de ideia", conformou-se.
A amizade com Lélia Gonzalez
Aos 79 anos, Zezé já lidou de diferentes formas com comentários sexistas sobre a relação entre mulheres e trabalho. No caso dela, com um componente a mais. Porque, além de mulher, ela é negra —Zezé aprendeu sobre o cruzamento de múltiplas formas de preconceito (relacionadas a raça, classe e gênero) com uma das principais teóricas do feminismo negro, a filósofa Lélia Gonzalez, de quem foi "amiga, irmã e comadre", como define.
O encontro entre as duas ocorreu em 1976, ano em que Zezé despontou internacionalmente ao interpretar Xica da Silva no filme homônimo dirigido por Cacá Diegues —até hoje, passados 47 anos, ela o considera o trabalho o mais importante de sua carreira.
'Agoniada' com tempo livre
A militância e o investimento nos estudos sobre cultura negra não foram impeditivos para que Zezé Motta trilhasse uma carreira de sucesso no cinema, no teatro e na televisão. "Minha relação com o trabalho é compulsiva", diz.
Ela começou a pegar firme no serviço aos 16, quando conseguiu emprego na linha de produção de um fabricante de remédios. Seu trabalho consistia em colar o rótulo nos vidros dos xaropes produzidos pelo laboratório —e era preciso ser disciplinada e atenta o bastante para não sair do ritmo. Qualquer distração e o potinho avançava pela esteira diante dela, seguindo para a próxima etapa (talvez a colocação das tampas) sem o papelzinho colado nele.
"Era um trabalho simples, mas tinha que ser feito a sério", afirma.
Ali, naquela rotina frenética e mecanizada que lembrava a do clássico filme "Tempos Modernos", de Charles Chaplin, Zezé Motta adquiriria uma ética do trabalho que levaria consigo para a vida. Hoje, por mais que, eventualmente, reclame de estar sempre ocupada, prefere assim. "Se fico sem compromissos, no terceiro dia já estou agoniada", ela brinca.
Resultado disso é tudo em que Zezé está envolvida no momento. Neste 25 de julho —Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha— ela estreia a terceira temporada do programa "Mulheres Negras", no canal "E! Entertainment", conduzindo entrevistas com figuras como a atriz Taís Araújo, a cantora Iza e a ministra da Cultura, Margareth Menezes.
No fim do mês, ela irá se apresentar em São Paulo no show "Atendendo a pedidos", em que canta clássicos da música brasileira —dentre eles, canções de Caetano Veloso, Luiz Melodia e Elizeth Cardoso. A música, aliás, é central na vida de Zezé Motta, que tem seis álbuns gravados. "Sempre gosto de ter duas cartas na manga", ela diz. "Ou mais". No caso dela, pode-se dizer, sem exagero, que tem um baralho inteiro.
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