Mães deveriam receber salário de R$ 7,3 mil, diz economista

Rute Pina

De Universa, em São Paulo

No mês passado, a norte-americana Allison Roozen viralizou com um vídeo no TikTok em que contava o que aconteceu após a morte da melhor amiga, em 2023. Ela era dona de casa e tinha um filho. O marido contratou duas babás, uma faxineira e uma equipe de jardinagem para exercer as funções da esposa morta.

"Não consigo parar de pensar, agora que ela se foi, no número de pessoas que foram contratadas para substituí-la", diz Allison, no vídeo. "[O ex-marido] ainda pede a ajuda de vizinhos e avós, além de ter uma namorada que faz o trabalho emocional. Agora eles têm uma aldeia, mas antes tinham uma mãe que fazia tudo."

@allisonroozen

💥️Universa consultou a economista Brena Paula Magno Fernandez, professora da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e coordenadora do Núcleo de Estudos em Economia Feminista, para fazer a seguinte estimativa: qual deveria ser o salário no mercado formal para uma mãe que se dedica integralmente ao cuidado dos filhos e da casa em uma capital como São Paulo? No mínimo R$ 7.392, calcula a economista — ela reforça que se trata de um valor aproximado, pois o tema é complexo e não existe uma metodologia consolidada para o cálculo.

Isso é mais do que o valor médio dos salários oferecidos para médicos do SUS (Sistema Único de Saúde): R$ 6.608,98 para uma carga de 20 horas semanais de trabalho, conforme levantamento feito em 2022 pelo Conselho Federal de Medicina em editais de concursos públicos. Ressalte-se, no entanto, que mães trabalham bem mais do que cinco horas diárias.

Para chegar ao valor de R$ 7.392, foram consideradas diferentes funções desempenhadas por uma mãe no dia a dia: um salário mínimo para uma trabalhadora doméstica, que cuidaria da limpeza da casa, lavagem das roupas e preparo dos alimentos; dois salários mínimos para cobrir dois turnos de babás; uma profissional folguista que assumisse serviços como conduzir a criança a pediatra, escola, casa de amigos e outras atividades (eventuais cursos de inglês e natação); e, por fim, 40% de adicional de custos de encargos sociais e trabalhistas previstos na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

É uma conta conservadora: os salários considerados foram os mínimos previstos por lei.

Essa renda — transferida pelo Estado — deveria ser, para a economista, compatível com o rendimento médio das mulheres brasileiras, de R$ 2.280,42 (valores de 2022). "Mas seria uma medida paliativa. O foco deve estar na assistência do governo para entrada e permanência de mulheres no mercado de trabalho."

Este valor é menor do que os R$ 7.392 porque não se trata de cálculo de salário (considerando valores de mercado), mas sim de benefício.

'Precisamos parar de pensar que mães trabalham por amor'

Uma frase da filósofa italiana Silvia Federici, 81, tornou-se lugar comum nos debates sobre remuneração das atividades domésticas: "O que eles chamam de amor, nós chamamos de trabalho não pago". Federici é uma das pioneiras na defesa de salários para quem executa tais tarefas.

Esta confusão entre amor e trabalho, para a pesquisadora Renata Senlle, integrante do coletivo "Política é a mãe", constitui um "obstáculo cultural". "Precisamos virar a chave e mostrar que há um trabalho de cuidado envolvido", afirma. "O que a mãe faz é visto como vocação e não uma série de trabalhos comprimidos ao longo do dia. Isso não necessariamente tem a ver com afeto."

À extensa lista de atividades desenvolvidas pelas mães, Senlle acrescenta as de psicóloga e educadora. "Quanto custa pagar uma psicóloga, já que fazemos o trabalho emocional no cuidado com os filhos? E de tutoria escolar?", questiona. A pandemia, diz a pesquisadora, evidenciou o comprometimento das mães com essas tarefas. "O custo de tudo isso pode ser calculado para precificar o trabalho de uma mãe."

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Em agosto de 2023, a deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ) apresentou projeto de lei estabelecendo aposentadoria por cuidado materno para mulheres com mais de 60 anos, além de permitir que o período de licença-maternidade seja computado como tempo de serviço. A proposta está em análise nas comissões técnicas da Câmara Federal.

O projeto de Petrone é inspirado na lei argentina. Um decreto publicado no país em 2023 permite que mulheres somem até três anos de tempo de serviço por filho nascido com vida para a aposentadoria.

Renata Senlle diz que o projeto ajuda a reconhecer o valor do trabalho do cuidado e reduzir desigualdade entre homens e mulheres na divisão das tarefas. Mas não propõe o modelo mais próximo do ideal, que seria a atribuição de um pagamento para as mães, "o reconhecimento pleno das inúmeras tarefas que as mulheres fazem no dia a dia".

Próximo do ideal porque não seria o bastante para que a vida fosse mais justa para as mães — "principalmente as pobres e pretas", maioria entre as empregadas domésticas, diaristas e babás "que fazem o trabalho de cuidado também fora de casa, de forma mal remunerada", como afirma Renata Senlle.

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