Peça “Para além das águas” fala sobre extinção de uma aldeia pela barragem
A Filandorra estreia a 25 de outubro, em Vila Real, a peça “Para além das águas”, do escritor transmontano Pires Cabral, que fala sobre a extinção de aldeias provocada pela construção de barragens e a emigração.
A criação teatral, segundo foi hoje anunciado, é baseada no conto “Para além das águas” de António Manuel Pires Cabral e explora a ruralidade, o amor e as emoções de quem fica sem casa, por ação de uma barragem, e quem teve que emigrar nos anos 60 e 70 do século passado.
O diretor da Filandorra – Teatro do Nordeste, David Carvalho, disse que a nova produção é também uma homenagem ao escritor que colabora com a companhia há 32 anos.
Tal como no conto, a peça reinterpreta a cena da morte de Ofélia, uma das personagens do texto de Hamlet, de Shakespeare.
David Carvalho contou que esta “Ofélia rural” morre nas águas de uma barragem, no dia do seu casamento.
A mesma barragem que, na história, submerge a aldeia de Vilar Frio, obrigando os seus residentes a deixar uma forma de vida, a casa e até os mortos no cemitério.
“É o sentimento de apego à terra que vão perder, um apego, em alguns casos, silenciado pelas indemnizações”, referiu Pires Cabral, realçando que a peça aborda também a emigração a salto, atravessando fronteiras clandestinamente, a assimilação da cultura do país de acolhimento e a manutenção dos laços à terra, por exemplo, através do vinho.
O diretor do Teatro de Vila Real, Rui Araújo, elogiou a incorporação de peças de autores transmontanos no repertório das companhias, mas por mérito e qualidade, não por regionalismo.
Salientou ainda a missão do Teatro em apoiar as estruturas locais, ajudando a robustecer os seus projetos, um trabalho que tem ganhado dimensão depois da integração na Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses.
O espetáculo é dirigido a toda a comunidade, mas tem uma preocupação com o público escolar.
O elenco é, segundo David Carvalho, intergeracional e junta em palco 10 atores da companhia e do curso de teatro da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
A barragem entra em palco através de um grande ecrã, com as cenas a terem sido gravadas nas águas da albufeira do Sordo, em Vila Real.
Em 2023, a Filandorra foi uma de sete estruturas excluídas na modalidade quadrienal do Programa de Apoio Sustentado da Direção-Geral das Artes (DGArtes), na área do Teatro, na qual 48 foram apoiadas.
Depois de um “ano negro”, David Carvalho disse que a companhia resistiu e explorou as candidaturas específicas do Ministério da Cultura, conseguindo financiamento, no âmbito do programa de apoio a projetos – Criação e Edição, para a peça que agora estreia em coprodução com o Teatro de Vila Real.
Natural de Macedo de Cavaleiros, Pires Cabral reside em Vila Real e concilia a escrita com o trabalho no Grémio Literário Vila-Realense a que deu o nome.
Licenciado em Filologia Germânica, venceu os prémios Círculo de Leitores de 1983 com o romance “Sancirilo”, em 2006 foi distinguido com o prémio D. Dinis, atribuído pela Fundação Casa de Mateus e, em 2023, venceu o Grande Prémio de Conto 2010 da Associação Portuguesa de Escritores (APE) com o livro “O Porco de Erimanto”, editado pela Cotovia.
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