Contestação de urnas nunca prosperou no TSE e acusador sem provas pode ser punido
Especialistas frisam que petições consideradas de má-fé podem resultar na punição de quem as promoveu inclusive com inegibilidade (Imagem: REUTERS/Diego Vara)
A coligação de partidos que apoiou o presidente 💥️Jair Bolsonaro (PL) na campanha derrotada à reeleição apresentou nesta terça-feira uma representação ao 💥️Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na qual pede uma “verificação extraordinária” dos resultados eleitorais apontando o suposto mau funcionamento de alguns modelos de urnas eletrônicas no segundo turno, questionando a vitória de 💥️Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Trata-se de uma contestação do tipo administrativa e que não é inédita em 2014, o então candidato derrotado 💥️Aécio Neves (PSDB) pediu uma auditoria dos resultados que mantiveram no Planalto a então presidente 💥️Dilma Rousseff (PT).
O procedimento pedido por Aécio naquele ano não encontrou nenhuma irregularidade. De fato, nenhum questionamento do tipo jamais prosperou no país em mais de duas décadas de funcionamento do sistema eletrônico de votação, alvo de ataque sem provas de Bolsonaro e aliados.
O andamento ou não da representação bolsonarista depende do TSE. Formado por sete ministros efetivos três são provenientes do 💥️Supremo Tribunal Federal (STF), dois vêm do 💥️Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dois são juristas vindos da advocacia, o TSE é atualmente presidido por 💥️Alexandre de Moraes, ministro do Supremo.
Especialistas frisam que petições consideradas de má-fé podem resultar na punição de quem as promoveu inclusive com inegibilidade.
Apresentação de Provas
O caminho para se contestar o resultado das eleições é apresentar eventuais provas de fraudes e formalizar um pedido ao tribunal.
No caso da representação movida pela chapa de Bolsonaro nesta terça, a alegação é que houve um suposto mau funcionamento de alguns modelos de urnas eletrônicas no segundo turno que deram equivocadamente a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O consultor em eleições digitais, Giuseppe Janino, um dos criadores da urna eletrônica brasileira, disse que o arquivo de log usado como base para a petição ao TSE “nada tem a ver com o núcleo do ecossistema da urna eletrônica”.
Segundo ele, não há qualquer interferência dele no que diz respeito ao recebimento do voto, ao registro do voto ou à apuração dos resultados.
“O log é um mecanismo de auditoria, dentre os vários outros mecanismos de auditoria que a urna eletrônica tem. Ele faz um registro de todas as operações que ocorrem na urna eletrônica, desde o momento que ela é carregada até o momento que ela é desligada”, disse, ao comparar ele a uma caixa preta do avião, um “arquivo satélite que simplesmente registra os eventos que acontecem na urna eletrônica”.
“Portanto, se o log falhar, o que certamente não foi o caso, não interferiria em absolutamente nada no funcionamento do recebimento do voto e sua apuração”, destacou ele, que foi durante anos secretário de Tecnologia da Informação do TSE.
Segundo ele, não há qualquer interferência dele no que diz respeito ao recebimento do voto, ao registro do voto ou à apuração dos resultados (Imagem: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)
Segundo Janino, a urna não depende, em termos de auditoria, exclusivamente do log.
“Tais argumentos levantados neste momento nada mais são do que novas tentativas de descredibilizar a urna eletrônica e o processo digital de eleição. O mesmo processo que vem elegendo os governantes de nosso país há 26 anos, contribuindo com a democracia”, disse ele.
Dois Caminhos Para a Contestação
Por meio da via administrativa é possível requerer ao tribunal que faça uma auditoria em relação à contagem dos votos.
Trata-se de um procedimento administrativo que tem como objetivo discutir a ocorrência de irregularidades no pleito eleitoral, tal como eventual falha na contagem dos votos.
Cabe ao interessado expor à Justiça Eleitoral as irregularidades levantadas, sempre de maneira fundamentada e com a devida comprovação de seus indícios.
Além disso, os custos com a realização da auditoria devem ser arcados pelo interessado.
“Esse procedimento foi utilizado em 2014, quando o então candidato derrotado Aécio Neves (PSDB) questionou os votos obtidos pela presidente Dilma Rousseff (PT)”, destacou Camilo Onoda Caldas, diretor do Instituto Luiz Gama e pós-doutor em Democracia e Direitos Humanos.
Na época, o PSDB alegou que havia denúncias e desconfianças sobre o sistema na internet e nas redes sociais. Após a realização da auditoria, feita pelo próprio partido, o TSE informou que o documento confirmava que não havia sido verificada nenhuma evidência de adulteração de programas, de votos ou mesmo qualquer indício de violação ao sigilo do voto no pleito em questão.
Já na esfera judicial, há a possibilidade de mover ações de impugnação do mandato eletivo (Aime) e de investigação judicial eleitoral (Aije).
A primeira delas, segundo Caldas, é a mais utilizada quando candidatos entendem que o adversário cometeu abuso de poder econômico, corrupção ou teria havido fraude nas eleições.
Esse tipo de ação, previsto na Constituição, tem de ser proposta em até 15 dias após a diplomação do candidato vitorioso. A diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva vai ocorrer até o dia 19 de dezembro.
A Aije, por sua vez, é prevista na Lei Complementar 64, de 1990 (Inelegibilidades), tem que ser apresentada até a data da diplomação e tem objetivo semelhante a Aime, ou seja, apurar eventuais abusos de poder.
A diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva vai ocorrer até o dia 19 de dezembro (Imagem: Flickr/ Lula Oficial/Ricardo Stuckert)
Os dois tipos de ações podem levar à inelegibilidade do candidato e a perda do mandato, caso sejam julgadas procedentes.
“Importante ressaltar que as hipóteses de contestação devem estar fundadas em circunstâncias robustas e devem ser acompanhadas de provas sólidas sobre a irregularidade levantada. Além disso, há de ser examinada a consequência desta contestação para o resultado final das eleições. São questões que devem ser avaliadas conforme o caso concreto e com a devida cautela”, disse Costódio Rodrigues, especialista em Direito Administrativo.
Plenário
Rodrigues afirmou ainda que, nos casos que envolvem candidatos a presidente da República, tanto o processo administrativo quanto as ações judiciais são julgadas pelo plenário da corte eleitoral.
Isso vale tanto para, por exemplo, a admissibilidade de um pedido de auditoria quanto o julgamento após a realização das diligências para instrução do caso, acrescentou.
Julgamento
O partido ou coligação que tenha recolhido provas sobre fraudes tem de apresentá-las ao TSE. O tribunal avaliará se a documentação tem o mínimo de lastro para abrir uma apuração e, ao final da investigação, a instância avalia se há ou não procedência no pedido.
Caldas alertou para o fato de que, conforme a Constituição, uma ação para impugnar uma pessoa eleita sabendo que ela foi proposta de forma temerária e de má-fé sem qualquer lastro de provas, por exemplo pode levar à responsabilização do autor do processo.
Para o coordenador-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Luiz Fernando Pereira, se Bolsonaro e aliados atacarem as urnas a partir de dados sabidamente inverídicos, o TSE deve impor uma pena de inelegibilidade de oito anos.
Pereira disse que isso é uma novidade desse processo eleitoral e decorre da decisão do tribunal de cassar, em outubro do ano passado, o mandato do deputado estadual pelo Paraná Fernando Francischini (então no PSL), aliado de Bolsonaro, por ter disseminado notícias falsas sobre a integridade das urnas eletrônicas.
O TSE condenou o parlamentar por uso indevido dos meios de comunicação e abuso de poder político e de autoridade, tornando-o inelegível.
Importante ressaltar que as hipóteses de contestação devem estar fundadas em circunstâncias robustas e devem ser acompanhadas de provas sólidas sobre a irregularidade levantada (Imagem: Rovena Rosa/ Agência Brasil)
Segundo o especialista, após a decisão sobre Francischini a corte eleitoral alterou um artigo de uma resolução para dispor a possibilidade de inelegibilidade por oito anos, inclusive com a cassação do mandato.
“É vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinja a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo eleitoral, a requerimento do Ministério Público, determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação”, diz o artigo 9º-A, da resolução 23.671 do TSE.
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