Reconhecimento facial no estádio do Palmeiras abre debate sobre benefícios e perda de privacidade

O Palmeiras instalou no Allianz Parque um sistema de reconhecimento facial. Em vez de acessar o estádio com o ingresso convencional, o torcedor precisa cadastrar seu rosto no banco de dados e usá-lo para passar pela catraca. Existem benefícios imediatos, mas também riscos.

Everaldo Coelho, diretor de marketing, e Emerson Oki, estrategista em inovação, ambos representantes do clube, afirmam que o tempo de entrada do palmeirense na arena será drasticamente reduzido. Este é um dos ganhos pretendidos pelo clube com a implementação do mecanismo.

Allianz Parque terá sistema de reconhecimento facial — Foto: Divulgação 1 de 2 Allianz Parque terá sistema de reconhecimento facial — Foto: Divulgação

Allianz Parque terá sistema de reconhecimento facial — Foto: Divulgação

Se antes o indivíduo precisava apontar o ingresso para um leitor, tarefa que poderia levar poucos segundos ou até alguns minutos, espera-se que esse tempo seja diminuído com o olhar na direção do leitor biométrico.

Outra vantagem está no combate ao cambismo. Como todos os torcedores precisarão usar seus dados biométricos para acessar o estádio – em outras palavras, o próprio rosto –, não será mais possível comprar a entrada e eventualmente vendê-la ou entregá-la para terceiros.

Dinheiro em Jogo.

Comercialmente, abrem-se possibilidades. A mais rudimentar delas é o uso do equipamento para expor marcas de patrocinadores, para aproveitar que a atenção das pessoas será direcionada a ele.

Também será possível aumentar a precisão do CRM (customer relationship management, ou gestão de relacionamento com o consumidor). Como o Palmeiras saberá exatamente quem está dentro do estádio, terá um histórico mais fidedigno dos hábitos de consumo dos fãs.

Esse banco de dados tem usos variados pelo departamento de marketing. Ao saber da frequência de certo torcedor no estádio, o clube pode oferecer benefícios e produtos condizentes com o perfil dele.

Em relação à segurança dos dados, o Palmeiras afirma ter seguido as regras da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Torcedores precisarão individualmente entrar no sistema e cadastrar o próprio rosto, junto das autorizações para que os dados sejam colhidos e usados.

O clube garante que não comercializa esse banco de dados com nenhuma empresa e que existem travas de segurança para o acesso por parte de funcionários. Não é possível, por exemplo, que colaboradores palmeirenses abram os rostos dos torcedores nos computadores.

Rafael Zanatta é advogado e diretor da associação Data Privacy Brasil. Ele, palmeirense, ficou espantado quando soube da instalação por parte do clube do sistema de reconhecimento facial.

O ativista em privacidade lembra que o sistema de reconhecimento facial trabalha com as distâncias entre olhos, nariz, boca e queixo, usadas para gerar um identificador permanente do cidadão. A menos que ele faça uma cirurgia invasiva, não conseguirá nunca alterar a feição do rosto.

Dados biométricos são considerados sensíveis e estão protegidos por lei federal. Eles diferem, por exemplo, de dados não sensíveis, como documentos de identificação ou o número da conta bancária.

O segundo aspecto problemático, de acordo com Zanatta, está em mudança recente na Constituição Federal, que mudou o tratamento em relação à proteção de dados pessoais. Se uma empresa detiver dados de consumidores que carreguem algum grau de risco, terá de comprovar a necessidade e demonstrar a finalidade, para que não ocorram excessos.

É possível, ainda segundo o advogado, que a obrigatoriedade do reconhecimento facial seja contestada judicialmente por torcedores que não queiram ceder seus dados biométricos ao clube.

Do lado palmeirense, o diretor de marketing Everaldo Coelho garante que o clube fez estudos para resguardar a privacidade dos torcedores e evitar problemas a respeito do novo sistema.

Tom Morello, guitarrista — Foto: Getty Images 2 de 2 Tom Morello, guitarrista — Foto: Getty Images

Tom Morello, guitarrista — Foto: Getty Images

Nos Estados Unidos, esse debate ocorre há mais tempo. Existem empresas que tentam usar a base de dados biométricos para identificar, durante toda a jornada de torcedores no estádio, o que aquelas pessoas estão sentindo, baseadas em sorrisos, choros e feições.

Em 2023, o guitarrista Tom Morello, famoso por integrar as bandas Rage Against The Machine e Audioslave, mobilizou campanha contra o reconhecimento facial obrigatório em shows de música.

Ao lado de outros artistas, empresários e formadores de opinião em geral, o músico disse que não gostaria de ver um "Big Brother" e sujeitar os fãs a uma série de riscos durante os concertos, tais como:

@rodrigocapelo

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