Entenda a acusação da Premier League contra o Manchester City – e por que só agora a liga se mexeu
Perguntas práticas sobre a acusação da Premier League ao Manchester City, de múltiplas violações ao sistema de fair play financeiro, ninguém consegue responder. Qual será a punição aplicada ao clube? Haverá perda de pontos? Revisão de títulos conquistados, talvez? Nem os próprios britânicos sabem. Mas há o que se aprender com esta novela.
Novela, porque os abusos financeiros cometidos pelo City, desde que este foi comprado pelo xeique Mansour Bin Zayed al Nayan, estão em pauta há anos. O clube quase foi impedido pela Uefa de disputar competições europeias por duas temporadas, inclusive, mas anulou o banimento e reduziu a multa após apelação à Corte Arbitral do Esporte (CAS).
E, agora, por que a Premier League resolveu se mexer?
Em primeiro lugar, porque o governo do Reino Unido vem apertando o cerco ao futebol e está próximo de anunciar a criação de uma autoridade para fiscalizar a modalidade. Faltam dias, no máximo semanas, para que o primeiro-ministro britânico Rishi Sunak apresente a novidade.
O papel deste órgão regulador será garantir que clubes cumpram seus compromissos financeiros, além de vigiar a entrada de recursos por meio dos proprietários e de impedir que planos de "fechamento" do futebol, como no caso da malfadada Superliga, sejam colocados em prática.
A decisão da Premier League de comprar briga com o City pode ser entendida como um recado ao governo e à opinião pública: "resolvemos nossos problemas". Uma demonstração de autorregulamentação.
Não custa lembrar que o Campeonato Inglês tem dois clubes dominados por países, ambos com dinheiro "ilimitado" – o Manchester City pertence aos Emirados Árabes, enquanto o Newcastle foi comprado há pouco pela Arábia Saudita. Há motivos de sobra para preocupação.
1 de 2 Manchester City de Pep Guardiola foi campeão em quatro dos últimos cinco anos — Foto: ReutersManchester City de Pep Guardiola foi campeão em quatro dos últimos cinco anos — Foto: Reuters
As consequências desta novela se dividem entre as práticas e, digamos, as simbólicas. Um ponto que ajuda o torcedor a entender o futebol.
A maior parte do caso contra o City se baseia em reportagens produzidas pela revista alemã Der Spiegel, com base em documentos vazados pelo Football Leaks. Os fatos que só hoje a Premier League acusa foram mostrados ao público em uma série de textos publicada em 2018.
As violações do fair play financeiro, instituído pela Uefa para conter os gastos desenfreados de clubes por toda a Europa, começaram com a demissão do técnico Roberto Mancini em 2013. Foi ali que o diretor financeiro do City, em e-mail interno, avisou a direção de que o prejuízo estava quase 10 milhões de libras acima do permitido.
Soluções foram dadas tanto na vertente das receitas quanto na das despesas. A começar pelo dinheiro que entra, a artimanha foi elevar artificialmente valores de patrocínios, para que o clube tivesse um faturamento maior do que deveria e assim conseguisse reduzir prejuízos.
Outro e-mail do mesmo diretor financeiro revelou que, das 67,5 milhões de libras contabilizadas como patrocínio máster da companhia aérea Etihad, apenas 8 milhões viriam da empresa. O restante seria repassado pelo Abu Dhabi United Group, conglomerado do xeique Mansour.
2 de 2 Guardiola e xeque Mansour bin Zayed Al Nahyan — Foto: Getty ImagesGuardiola e xeque Mansour bin Zayed Al Nahyan — Foto: Getty Images
Do lado dos custos, o City "terceirizou" gastos que tinha com a imagem de atletas a uma empresa, chamada Fordham Sports Management, que teria seu caixa abastecido pelo mesmo Abu Dhabi. Como esses valores sairiam do balanço, aliviariam as contas do futebol.
Representantes do clube negam as acusações e dizem que os documentos obtidos pela reportagem foram tirados de contexto.
Graças às reportagens do Der Spiegel, abundantes em evidências, todo mundo pôde perceber que o Manchester City manipulava as finanças para escapar do fair play financeiro. Mas o uso formal de documentos vazados é limitado. Com seu time de advogados e o tempo contando a favor, o grupo tem conseguido se livrar de punições severas. Faltam provas que possam ser usadas e sobram prescrições para atos já antigos.
E é por essa razão que consequências práticas são diferentes das simbólicas. Simbolicamente, o vencedor futebol do time comandado por Pep Guardiola carrega um asterisco, algo como: . Na prática, no entanto, nada de realmente grave aconteceu até agora. A ver se no caso da nova acusação, desta vez feita pela Premier League, o caso terá o mesmo desfecho do movido pela Uefa.
@rodrigocapelo
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