Pai de vítima do incêndio no Ninho convive com saudade diária quatro anos depois: "Quase todo dia 8 é ruim para nós&
Às 22h45 de 7 de fevereiro de 2023, uma mensagem empolgada contando ao pai que, na manhã seguinte, treinaria no templo sagrado do futebol, o Maracanã.
Dois minutos depois, a resposta daquele que, além das funções da paternidade, também ostentava o título de melhor amigo, pedindo para que mandasse notícias e fosse dormir.
Um eu te amo recíproco selou o que seria a última troca de mensagens entre Gedson Beltrão e o filho, Gedson Santos, o Gedinho.
1 de 6 Gedinho ficou menos de 10 dias no Flamengo até incêndio acontecer — Foto: Arquivo PessoalGedinho ficou menos de 10 dias no Flamengo até incêndio acontecer — Foto: Arquivo Pessoal
O jovem de Itararé, no interior de São Paulo, então com 14 anos, não teve a oportunidade de desfrutar do gramado icônico. Cerca de seis horas depois daquela conversa, ele estava entre as vítimas do incêndio no Ninho do Urubu, que matou 10 meninos da base do Flamengo, no Rio de Janeiro, em 2023.
A tragédia completa quatro anos nesta quarta-feira. E se há quem diga que despedidas são amenizadas com o tempo, essa máxima não funciona para a família de Gedinho.
2 de 6 Gedson guardou a última conversa com o filho em um bloco de notas — Foto: Arquivo PessoalGedson guardou a última conversa com o filho em um bloco de notas — Foto: Arquivo Pessoal
O pai do garoto falou com o 💥️ge e conta como ele, a esposa Teresa, e os filhos Geraldo, de 7 anos, e Gael, de 3 anos, têm seguido em frente sem a presença daquele que completaria 19 anos em 2023.
3 de 6 Gedson e o filho Gedinho — Foto: Arquivo PessoalGedson e o filho Gedinho — Foto: Arquivo Pessoal
Gedson diz que, acima de tudo, sente falta das conversas com o filho, cuja maturidade e a fé impressionavam, apesar da pouca idade. Quando o assunto era a habilidade, então...
– Mesmo depois de tudo, eu gosto de falar dele. Vê-lo jogar era um grande prazer. E ele falava que seria jogador de futebol com muita convicção, não tinha incerteza.
Conseguir continuar, em meio à dor da perda, só tem sido possível graças a pilares como a família e a religião. Além disso, Gedson costuma focar no trabalho como gestor de uma loja de ferramentas para ocupar seus dias.
O sonho de Gedinho na equipe rubro-negra tinha recém-começado. Havia chegado há menos de 10 dias no clube até ser uma das vítimas do incêndio.
A trajetória com a bola nos pés teve início na Associação Atlética Banco do Brasil, em sua cidade natal. Depois, passou em um teste no Athletico Paranaense e foi morar em Curitiba aos 11 anos.
4 de 6 Gedinho com a camisa do Furacão — Foto: Arquivo PessoalGedinho com a camisa do Furacão — Foto: Arquivo Pessoal
Era daqueles meninos que, segundo a família, jogava futebol com o que estivesse ao alcance. Precisava de pouco para ostentar o talento na perna esquerda. Às vezes, uma tampinha de garrafa era mais do que suficiente.
– Seu único sonho era ser jogador. Dizia para os avós paternos que quando se tornasse jogador cuidaria deles. Por mais que digam que o sonho foi interrompido, não acredito. Desde a primeira vez que ele entrou para jogar já tinha se tornado jogador, o meu jogador – escreveu a mãe Teresa, em um texto que reúne memórias do filho.
Gedson reforça que um filho não substitui o outro. Mas sabe que Geraldo e Gael são fundamentais no processo de reconstrução da família. Ele, inclusive, observa algumas semelhanças de Gedinho em Gael.
– O Gael é bastante agitado, lembra bastante, no tamanho, na aparência, em alguns trejeitos. Já o Geraldo é mais tranquilo comparado com o Gedinho, que respirava futebol.
Por falar na relação dos filhos mais novos com o futebol, o pai garante que não se opõe a uma possível vontade de que sigam o sonho iniciado por Gedinho. Se necessário, promete ajudá-los nesse caminho.
5 de 6 Gedson, Teresa e os filhos Gael e Geraldo — Foto: Arquivo PessoalGedson, Teresa e os filhos Gael e Geraldo — Foto: Arquivo Pessoal
Durante a entrevista, Gedson abriu o jogo sobre o Flamengo. Fala que a decisão por um acordo (firmado por quase todas as famílias) foi mais “para não ficar remoendo a história”, mas também afirma que não guarda mágoas do clube. Desde a tratativa, comenta que não houve muitos outros contatos com representantes do rubro-negro.
6 de 6 Tragédia vista do alto: o incêndio no Ninho do Urubu — Foto: Agência Estado
Tragédia vista do alto: o incêndio no Ninho do Urubu — Foto: Agência Estado
O processo relacionado ao incêndio ainda não foi concluído. Nenhum dos acusados chegou a ser condenado. Em uma das últimas movimentações, o ex-diretor do Flamengo, Márcio Mongelli, um dos acusados, entrou com recurso para suspender o processo, o que foi negado pelo ministro OG Fernandes, do STJ.
– Se prezam tanto pelo sucesso, rendimento dos meninos que vão ter um retorno para eles, jamais poderiam ter deixado os garotos no lugar onde estavam. Na verdade, prezam mais depois que vão para o profissional, aí é outro tratamento. Isso deveria mudar. E não é só o Flamengo, mas muitos outros clubes – afirma Gedson.
No texto escrito por Teresa, ela explica que, eventualmente, o choro que toma conta é tranquilizado por um versículo bíblico do livro de Gênesis: “Porque Deus o tomou para si”.
– Ainda nos abalamos muito quando a saudade aperta. Ela vem arrebentando e rasgando nosso coração. O que nos dá forças é que temos um ao outro. Tem dia que meu marido está mal, outros dias sou eu, e vamos vivendo assim, um dia de cada vez, pois temos nossos dois filhos que precisam de nós. Tudo nesta vida tem um propósito e creio que nosso filho cumpriu o dele, e nós seguimos cumprindo o nosso, com a nossa dor, porque nisso tudo deve existir um propósito. Depois de alguns dias do sepultamento do Gedinho, eu dobrei os joelhos no meu quarto e orei, disse que estava devolvendo Gedinho a Ele, agradeci pelos 14 anos maravilhosos.
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