“Nem sempre a decisão justa é popular”, diz Barroso

Luís Roberto Barroso

Para ministro do STF, Corte deve justificar razões e ser compreendido  (Imagem: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Em discurso proferido na noite de hoje (5) na sede do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), no Rio de Janeiro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, disse que nem sempre a decisão correta e justa é popular. Segundo ele, há momentos em que o Judiciário deve adotar posições contrárias ao desejo da população e, por isso, precisa ser transparente para que todos possam compreender os motivos que levaram à decisão.

“Numa democracia, todo poder é representativo. Ninguém exerce o poder em nome próprio. Ele sempre é exercido em nome e no interesse da sociedade. Portanto, o Poder Judiciário deve ser capaz de escutar a sociedade e identificar o sentimento social. O passo seguinte é filtrá-lo pela Constituição. Se o sentimento social não passar pelo filtro, o Supremo precisa produzir uma decisão contra-majoritária, porque a Constituição existe precisamente para proteger valores e direitos contra as paixões eventuais das multidões. Mas mesmo nesses momentos, o Supremo precisa ser capaz de manter uma interlocução com sociedade, justificar as suas razões e ser compreendido”, disse.

O ministro também defendeu a necessidade de uma reforma política capaz de baratear o custo das campanhas eleitorais, aumentar a representatividade do Congresso e facilitar a governabilidade. Segundo ele, é preciso combater a influência do poder econômico nas eleições e a multiplicação dos partidos, muitos dos quais não teriam nenhuma autenticidade programática.

Barroso foi o orador de cerimônia de homenagem do ex-ministro do STF, Sepúlveda Pertence, que recebeu do IAB sua mais importante comenda: a Medalha Teixeira de Freitas. Ela é concedida a pessoas que deram contribuição inestimável ao Direito e à Justiça no Brasil. O evento também celebrou os 176 anos da entidade. Fundado em 1843 pelo governo brasileiro durante o Segundo Reinado, o IAB se tornou a principal instituição do país voltada para a promoção do conhecimento jurídico na prática advocatícia.

Legado

Sepúlveda Pertence foi o primeiro procurador-geral da República após o fim do regime militar, tendo sido nomeado pelo então presidente José Sarney em março de 1985. Posteriormente, em 1989, foi indicado novamente por Sarney para o STF. Foi ministro da Corte até se aposentar em 2007 e a presidiu entre 1995 e 1997.

Luís Roberto Barroso

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, faz saudação ao ex-presidente do STF, Sepúlveda Pertence, homenageado com a Medalha Teixeira de Freitas do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) (Imagem: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Ao falar sobre o legado de Sepúlveda Pertence, Barroso o apontou como responsável por iniciar o processo que estabeleceu uma maior interlocução entre o Poder Judiciário e a sociedade e que encerrou uma tradição na qual os juízes viviam numa torre de marfim, preservados da convivência com a opinião pública. Barroso também destacou a influência que as ideias do ex-ministro teve sobre posições recentes do STF.

“Ele teve um papel notável na transição democrática brasileira e exerceu um papel decisivo na concretização dos direitos fundamentais. Foi um trabalho realizado ao longo dos anos. E hoje, se o Supremo tem por um lado muitas dificuldades em matérias de direito penal, por outro tem prestado um valioso serviço em matérias de direitos fundamentais e em proteção da democracia. Tivemos avanços nos direitos das mulheres, nas ações afirmativas em favor da população negra, na proteção da comunidade LGBT, na demarcação de terras indígenas”.

Tolerância

Em seu pronunciamento, Sepúlveda Pertence defendeu a necessidade de uma atenção permanente diante dos riscos iminentes de volta do autoritarismo. Segundo ele, é preciso fortalecer as instituições e os direitos humanos e combater a intolerância, que traz instabilidade para a democracia.

“A tolerância é recíproca. Para que se exista tolerância é preciso que se esteja ao menos em dois. Se um tolera o outro, mas o outro não o tolera, não há estado de tolerância (…) Já se disse que a democracia é uma obra sempre inacabada. É uma construção na qual é preciso estar sempre atento e acreditar que as instituições vencerão os desvarios de certas horas”, disse.

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