Presidente Lula, não precisamos de uma juíza negra no STF, precisamos de 3

💥️Não há solução civilizatória razoável para o Brasil que não passe pelo enfrentamento de nossa desigualdade socioeconômica, espécie de marca do país (o termo a ✅brasilianização do mundo foi utilizado por estrangeiros, em alguns momentos do século passado e deste também, justamente para designar o tipo de padrão de sociedade em que, apesar da inegável potencialidade, a desigualdade socioeconômica é uma constante e é abissal).

💥️Toda movimentação político-econômica, toda política pública, não importa em que instância federativa, toda decisão judicial que não leve em conta o compromisso de diminuir essa desigualdade é procrastinação (quando não for perpetuação perversa) dessa condição que atrasa a possibilidade de um dia chegarmos à concretização do tal modelo de Estado Democrático de Direito e de um mínimo de respeito à dignidade da pessoa humana, tão ambiciosa e necessariamente inscritos em nossa Constituição Federal de 1988.

💥️A desigualdade socioeconômica brasileira (não há como escapar do critério econômico) tem um combustível que qualquer pessoa que conheça um pouco de História consegue identificar: o racismo. E, nesse contexto, como decorrências diretas do racismo (da lógica escravocrata que o sustenta e que afeta a todas as pessoas deste país, independentemente da cor da pele, do fenótipo, que não façam parte da elite, esse menos de um por cento da população), temos, entre outras menos urgentes, a fome, a violência, a precariedade no acesso ao trabalho, à educação, à saúde, à moradia, à segurança, uma segurança que proteja o cidadão (e não o elimine por conta do seu CEP). O que há de novo nesta lista é que, a partir da segunda década deste século, e da maneira mais despudorada imaginável, o não-enfrentamento dessa igualdade trouxe para nosso dia a dia o recrudescimento da gritaria delirante e assassina do fascismo.

💥️No Brasil, o fascismo se apresenta como uma espécie de cobertura de fuligem tóxica que vai se precipitando sobre a montanha do escravismo, sobre uma perversa ordem civilizatória que já é naturalmente violenta. Essa fuligem é conjunto de lógicas horrendas pelas quais, de maneira cada vez mais despudorada, se reafirma que a solução mágica dos problemas brasileiros está na eliminação das outras pessoas, das que, na lente fascista, insisto, são: os pobres, os trabalhadores mal remunerados, os sujos, os pretos, os gays, os pervertidos, os indígenas, os religiosos do candomblé, as mulheres que defendem o aborto, as mulheres que não se querem submissas, os possuídos pelo diabo e tantas outras pessoas rotuláveis a partir da moralidade escravista-fascistóide (que não é moral e nem ética) e criminosa em variados aspectos que ganhou corações e mentes neste país e continua em ascensão.

Sobre a relação entre escravismo e fascismo, é o seguinte registro do psicanalista Tales Ab'Sáber, na sua obra "O soldado antropofágico: escravidão e não-pensamento no Brasil": "Nossos grosseiros e tão comuns cidadãos que atacam a base acordada fundamental da cidadania moderna, que recusam felizes os direitos humanos universais, sempre com evidente prazer sádico do direito local de contradizer uma lei geral mais ampla, deveriam ser chamados abertamente de ✅neoescravistas brasileiros - e não genericamente ✅fascistas como costumamos chamar - se não forem os constantes ✅escravistas reais brasileiros, fundo autoritário extremo e interessado de egoísmo antissocial que os sustenta e que eles representam".

1 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal 2 - Justiça Federal - RJ/Reprodução - Justiça Federal - RJ/Reprodução A juíza federal Adriana Cruz

💥️Há vários nomes de mulheres negras que, atuantes no Direito, poderiam ser indicadas. Separei três: Adriana Alves dos Santos Cruz (juíza federal), Flávia Martins de Carvalho (juíza estadual) e Vera Lúcia Araújo (advogada e jurista). São mulheres notabilíssimas (para quem consegue ver notabilidade em subjetividades que não sejam a do tradicional homem branco, cavalheiro nobre defensor do feudo) com densa vivência empírica e teórica, com admirável passado relacionado à luta por ética na aplicação da Justiça neste país, pessoas que compreendem bem o que é defender os valores democráticos constitucionais e o imenso problema que é não haver uma democracia verdadeira no país.

Se a questão ética (porque só ela pode resolver o problema da desigualdade socioeconômica deste país) é importante para este governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então chega de esperarmos o futuro, chega de procrastinar as mudanças estruturais inclusive no poder judiciário. Contra o fascismo, contra o pensamento fascista que ganhou ainda mais espaço no judiciário, é preciso dobrar as apostas nas soluções progressistas e maduras, é preciso avançar e afastar o medo que leva as pessoas à falsa acolhida deste novo fascismo.

💥️Duvido que qualquer um dos nomes que citei titubearia em defender a Constituição Federal de 1988 nas situações em que o Supremo Tribunal Federal, como colegiado, vacilou, acovardou-se ou, simplesmente (o que seria mais grave) se dobrou à lógica neofascista que, por inúmeros motivos, ganhou as ruas a partir de 2013.

Por fim, um dos méritos da Constituição Federal de 1988 é que ela, mal ou bem, é a carta que renova um pacto, um projeto ético liberal (nunca pretendido para esta terra) e, dentro de todas as armadilhas dos pactos de elite, do liberalismo clássico, das ilusões do capitalismo e do Direito, fixa, no plano político, a dignidade da pessoa humana como um valor fundamental - um marco que precisa de um Supremo Tribunal Federal o mais corajoso e o mais ético possível, um Supremo Tribunal Federal que afaste o Estado brasileiro deste lugar de zeladoria de uma elite que não hesitará em abraçar o fascismo e a milicianização inerente ao fascismo para poder continuar ganhando, sugando, saqueando, usurpando esta terra, esta população, como invasora eterna que é, e que afirme um país que possa se colocar de maneira soberana diante do desafio de nossa colonialidade a impedir que O Estado brasileiro alcance a verdadeira democracia. O futuro é agora.

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