Sozinho, mas em boa companhia – como estar a sós com os seus pensamentos? - Fitness e bem-estar Lifestyle

Cada vez temos mais distrações. Cada vez parece mais fácil, automático e inconsciente retirar o smartphone do bolso, desbloqueá-lo e abrir a nossa aplicação preferida. Aumentam-se, assim, as distrações e diminui o tempo a sós com os nossos pensamentos, o que muitos consideram assustador, e até a evitar.

Num estudo feito pelo psicólogo social americano Timothy Wilson e seus colaboradores, com estudantes universitários, 67% dos participantes do sexo masculino e 25% dos do sexo feminino preferiram administrar-se a si próprios um choque elétrico a manter-se a sós com os seus pensamentos durante alguns minutos. Ou seja, para esta grande parte dos participantes, foi preferível estar sujeito a um estímulo externo negativo (choque), a estar na ausência de qualquer estímulo externo, o que nos ajuda a compreender como estar a sós, sem qualquer estimulação exterior, é muitas vezes encarado como negativo.

Apesar de os smartphones e outras distrações fazerem um ótimo trabalho a ocupar a nossa mente, são evidentes as consequências negativas desta utilização excessiva. Na verdade, quanto mais utilizamos estas distrações, mais facilmente voltamos a aceder às mesmas e mais dificilmente conseguimos saber lidar com os momentos a sós e aproveitá-los de forma positiva. Esta dinâmica torna-nos pouco habituados a estarmos connosco, aumentando a perceção negativa de o estar. Quanto mais evitamos esse momento, menos treinados estamos para lidar com os nossos pensamentos. Assim, quando finalmente surge o silêncio, seja ao iniciar uma tarefa laboral/ escolar, ou enquanto tenta adormecer, a mente é inundada com tudo aquilo que se foi evitado, desde memórias embaraçosas, a sentimentos e pensamentos dolorosos, trazendo uma experiência negativa a algo que poderia ser um momento de tranquilidade.

Enquanto não aprendermos a estar sozinhos, iremo-nos sempre sentir sós. Além disso, decresce também a capacidade de lidar com o aborrecimento, sendo esses os momentos que nos obrigam a lidar também com o tédio. Por isso mesmo, em atividades diárias e enfadonhas (como estar numa fila ou no comboio) tornou-se normal estar no telemóvel, que combate o aborrecimento, mas diminui a nossa capacidade de o gerir, aumentando também a dependência dos dispositivos.

Surpreendentemente, um estudo de 2022 publicado na revista científica Emotion, da Associação Americana de Psiquiatria (APA), concluiu que pensar sobre memórias e pessoa significativas pode ser tão ou mais prazeroso do que outras atividades distratoras como jogar videojogos, ver redes sociais, ou trocar mensagens. Além disso, os momentos a sós são momentos que ajudam a estimular a criatividade, assim como o foco mental e regulação emocional. Assim, para (re)aprender a estar consigo e com os seus pensamentos, deixamos possíveis sugestões:

1. Planeie o tempo para pensar

Ser intencional na criação deste momento a sós coloca-o a si mais sob controlo, facilitando este processo. Ao contrário dos momentos inoportunos em que os pensamentos se soltam, guardar um tempo específico para parar e pensar pode tornar-se surpreendentemente positivo. Pode ser importante, durante este tempo, desligar as notificações do telemóvel, ou deixá-lo à parte.

2. Faça uma lista sobre temas de interesse

Ter uma lista de temas que efetivamente gosta e quer pensar pode guiá-lo e tornar este momento mais prazeroso. A lista pode ser útil também quando a mente desliza para sítios menos confortáveis, sendo que a pode utilizar para voltar ao tema listado.

3. Utilize atividades quotidianas

Seja a conduzir, a passear, ou a fazer tarefas domésticas que não requerem um grande esforço cognitivo, pode utilizar esses momentos para se focar em si, nos seus pensamentos e mundo interno.

4. Aceite os pensamentos negativos – por vezes, os pensamentos negativos são persistentes e recusam-se a abandonar a sua mente. Quando assim o é, aceite que essa preocupação está presente e procure pensar objetivamente sobre o problema em causa, permitindo-se também encontrar soluções. Caso esteja apenas preso num ciclo de pensamentos negativos (ruminação), pode utilizar a lista de temas para se redirecionar, calmamente. Mantenha presente que os pensamentos são exatamente isso, pensamentos, e não factos ou a realidade. São hipóteses que o cérebro cria para entender o que o rodeia. Tomar os pensamentos por aquilo que eles são pode ajudá-lo a perceber que não são algo perigoso ou a evitar a todo o custo.

5. Treine! – como qualquer outra a habilidade, estar a sós deve ser treinado. Para tal, comece com apenas alguns minutos, aumentando gradualmente o tempo à medida que se sentir mais confortável. Pode começar com pequenos momentos, enquanto espera pelo elevador ou pela sua vez numa fila, em vez de aceder ao smartphone.

6. Escreva os pensamentos – são vários os benefícios da escrita terapêutica. Escrever os seus pensamentos pode ser uma forma interessante de os conhecer e avaliar, e de se distanciar, ganhando mais controlo sobre eles.

7. Seja curioso – por vezes não gostamos dos nossos pensamentos e por essa razão tornamo-nos pouco curiosos em relação aos mesmo, ou criamos um discurso autocrítico e duro dentro de nós. É difícil encontrar prazer numa atividade onde é constantemente criticado e julgado, por isso procure manter uma atitude curiosa, sem julgamento face àquilo com que se deparar.

Estar a sós é uma forma de cultivar a nossa relação connosco próprios, aprendendo mais sobre nós mesmos. Isso pode proporcionar-nos um momento desprovido de pressão em agradar os outros, em que podemos ser nós mesmos, sem opiniões e julgamentos externos. Para conhecermos e gostarmos de alguém, precisamos de aprender sobre essa pessoa, ouvindo-a e convivendo com ela. E consigo próprio não é diferente. Quando está sozinho(a), pode estar em boa companhia: a sua! Se estar a sós é algo extremamente difícil para si, por aquilo que encontra no silêncio, procure ajuda psicológica, que o poderá ajudar a lidar com os seus próprios pensamentos.

Um artigo dos psicólogos clínicos Samuel Silva e Mauro Paulino, da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.

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