ONU pode fechar pacto de vigilância arbitrária; o que fará o Brasil?

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Hacker, cibersegurança, segurança digital, golpe online, golpe digital, golpe na internet, cibercrime, invasão Imagem: PeopleImages/iStock

O Comitê da ONU que discute um tratado global sobre cibercrime está reunido em Nova York e o que for decidido por ele vai pavimentar os rumos de um mundo com poderes de vigilância excessivos ou, ao contrário, submetidos a garantias robustas de direitos fundamentais. A missão de construir um mundo justo frisada pelo presidente Lula em discurso na ONU em 2023 está também no lema do G20 sob a presidência brasileira. A aprovação deste tratado com escopo ampliado e sem garantias sólidas e vinculantes a nível global vai na direção contrária desta missão.

Com o mandato de elaborar uma convenção sobre o combate a crimes cibernéticos, o Comitê discute proposta que se tornou um extenso pacto de vigilância. Ela amplia perigosamente o entendimento do que são cibercrimes, impõe medidas intrusivas de investigação em nível nacional e exige a cooperação internacional no acesso e compartilhamento de dados mesmo para crimes que não envolvam TICs. Tais poderes viriam sem as devidas garantias para evitar sua aplicação abusiva.

A vigilância arbitrária facilitada por um tratado global é a antítese de um mundo justo. O exercício abusivo do poder estatal atinge desproporcionalmente os grupos mais vulnerabilizados. Apesar de a proposta prever que a implementação de obrigações de vigilância devem seguir os compromissos internacionais de direitos humanos, nem todos os Estados que venham a aderir ratificaram tratados importantes como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos ou possuem marcos legais internos que assegurem garantias suficientes. O texto não obriga que as medidas de vigilância tenham autorização judicial prévia, nem que só sejam realizadas diante de suspeita razoável ou que sejam necessárias para a investigação. Ainda: as autoridades poderiam manter tais medidas sob segredo indefinidamente, conforme a lei de cada país.

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A proposta exige que autoridades nacionais possam obrigar qualquer pessoa com conhecimento técnico a fornecer informações para facilitar o acesso a sistemas digitais. Autoridades poderiam interpretá-la arbitrariamente para forçar engenheiros de empresas a revelar uma falha de segurança não corrigida ou fornecer chaves de criptografia que protegem dados. Ela permite a interceptação em tempo real de metadados, como dados de localização, na investigação de qualquer crime. A interceptação de conteúdos está limitada a crimes graves, mas esta definição abarca qualquer crime punido com ao menos quatro anos de prisão. Condutas pouco gravosas ou mesmo legítimas podem se enquadrar nesta definição em determinados países.

Vale frisar que leis de cibercrime têm sido utilizadas de forma arbitrária para criminalizar a luta pela igualdade de gênero, aplicando de forma abusiva leis que apresentam definições vagas e amplas. Infelizmente, a vigilância e punição de ativistas LGBTQIA+ sob o pretexto de serem cibercriminosos têm sido uma tendência em diferentes países, conforme demonstram estudos na matéria.

O discurso de Lula na ONU se deu 10 anos após a posição firme de Dilma Rousseff contra a vigilância global arbitrária naquela mesma tribuna. Ali, Lula chamou a comunidade internacional a se opor ao aprofundamento das desigualdades e à erosão do Estado de Direito. É crucial que a posição brasileira nas negociações deste novo tratado reafirme que um mundo justo não é compatível com a vigilância indiscriminada.

*Veridiana Alimonti é doutora pela USP e diretora associada para América Latina da Electronic Frontier Foundation.
**Michel Roberto de Souza é doutor pela USP e diretor de políticas da Derechos Digitales.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do

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