Nomear corretamente a discriminação que adolescentes sofrem é fundamental

Recentemente, fomos impactados pela notícia do suicídio de um adolescente de 14 anos, gay e negro, estudante do 9° ano de uma escola de elite da cidade de São Paulo. E constatamos que, como ocorre em inúmeras instituições brasileiras, continuamos falhando recorrentemente como sociedade.

Há décadas, organizações do movimento LGBTQIAPN+ vêm denunciando a violência endêmica que gays, lésbicas, pessoas trans e travestis sofrem simplesmente por serem quem são. Violência que se materializa inclusive no ambiente escolar, que hostiliza e expele estudantes que "não se encaixam" em uma "norma" identitária. Isso torna o fato de ser gay um elemento de insegurança e vulnerabilidade, afetando sua saúde mental e muitas vezes levando a quadros de depressão, ansiedade e, no limite, ao suicídio.

Achille Mbembe, filósofo e historiador camaronês, aponta um outro elemento importante: o suicídio de um jovem negro deve ser entendido como consequência de uma sociedade que o submete cotidianamente a traumas, desesperança e desumanização, demandando investigação sobre o contexto que o leva a essa situação extrema. E, nesse caso, o jovem era negro e gay.

Nomear corretamente a constante discriminação que adolescentes vivenciam é fundamental, pois estamos falando de homofobia, racismo e de convivência em ambientes nos quais as diferenças de classe econômica mostram seu impacto, principalmente num país campeão no território das desigualdades.

Cabe destacar aqui que a Fiocruz, por meio de sua pesquisadora Flávia José Alves, chama a atenção sobre o crescimento do índice de suicídio entre crianças e jovens no período de 2011 a 2022 (6% ao ano).

Como nos lembra Margareth Arrilha, psicanalista e pesquisadora do Grupo Nepo/Unicamp, falamos de processos coletivos, sociais, que devem ser tratados nessa dimensão, não algo relacionado exclusivamente ao jovem e à sua família. Famílias negras e com filhos LGBT são responsabilizadas por criar filhos fisicamente e emocionalmente sadios, numa sociedade na qual a identidade de seus filhos tem conotações negativas e enseja tratamento desigual e negativo.

Com certeza, escolas não são clínicas psicológicas, mas podem ser comunidades reparativas, nas quais interações com o "outro" não sejam constrangedoras e excludentes e onde seja possível desenvolver o sentimento de pertencimento. Implementar programas que possam alterar a realidade atual é urgente. E, nesse processo, as instituições brancas, ricas e com população majoritariamente heterossexual têm que refletir sobre si próprias inseridas numa sociedade tão plural e desigual como a brasileira. Precisam refletir sobre o lugar do não lugar. E aprender com e sobre o "outro".

Promover a inclusão e a equidade exige reconhecer as diferentes vivências e condições de vida enfrentadas por estudantes que fogem dos marcadores identitários hegemônicos.

É essencial que as instituições desenvolvam uma compreensão do contexto social, econômico e histórico do país. É primordial aprender sobre sua própria herança histórica e sua cultura e conhecer as realidades dos grupos que foram historicamente marginalizados e excluídos e dessa forma encontrar seu lugar para contribuir na construção de uma sociedade mais diversa, democrática e digna.

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Urge a criação institucional de instâncias que possam planejar, avaliar e monitorar os programas de equidade e inclusão para garantir que as iniciativas sejam efetivas e sustentáveis. Essas instâncias devem ser responsáveis por acompanhar processos, identificar gargalos e ajustar estratégias conforme necessário para promover um ambiente inclusivo, equitativo e respeitoso para seu corpo docente e discente.

Waldete Tristão, doutora em educação, escritora, mãe e uma amiga muito querida, nos reforça que "passou da hora de dizer que os jovens negros não se suicidam, eles são mortos por essa sociedade racista e opressora. E lembrar também o quanto a sociedade perde quando um jovem não vê nela a possibilidade de continuar existindo".


Esta coluna foi escrita em parceria com a psicóloga Júlia Rosemberg

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