O que os levou ao Parque do Perdão: as histórias de quem se confessou com o Papa e com padres de todo o mu
Ainda pouco se falava da JMJ e já se sabia que ia existir, no Jardim Vasco da Gama, 150 confessionários para os milhares de peregrinos poderem realizar este sacramento, um dos sete possíveis no catolicismo.
Como já tinha sido anunciado, a estrutura dos confessionários nasceu do trabalho de 150 reclusos das prisões de Coimbra, Paços de Ferreira e do Porto e foi paga pela a Fundação JMJ Lisboa 2023, que fez uma parceria com a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.
Além de remunerar os reclusos na construção dos confessionários, a Igreja financiou também os respetivos materiais.
Ao observar o projeto terminado já no Parque do Perdão, é possível constatar uma diferença bastante evidente em relação aos confessionários normais. Não existe qualquer divisória e funcionam como uma "casa aberta que acolhe de uma forma muito pessoal e personalizada”, segundo revelou o Comité Organizador Local (COL) ao 7MARGENS, parceiro do 💥️SAPO24.
Aqueles que passem pelo Parque do Perdão, aberto desde o dia 1 de agosto a partir das 9h00 e até às 16h00, podem confessar-se com padres de diferentes nacionalidades, distribuídos pelos confessionários, disponíveis para receber os peregrinos que desejarem reconciliar-se. Estão disponíveis sacerdotes para confissões nos cinco idiomas oficiais da JMJ Lisboa 2023 - português, inglês, espanhol, francês e italiano - durante todo o horário de funcionamento do Parque do Perdão. Dependendo do dia, os jovens poderão ainda tentar confessar-se em outras línguas não oficiais, como albanês, eslovaco, indonésio, neerlandês ou mandarim.
Nas visitas que o 💥️SAPO24 fez ao recinto, foi impossível evitar a intensidade dos momentos ali vividos, momentos de profunda ligação à religião católica, a Deus e à ideia de perdão concedido pelos 150 sacerdotes.
Mas, o momento mais marcante no Parque do Perdão aconteceu na manhã desta sexta-feira, quando o espaço aberto desde dia 1 de agosto recebeu a visita do Santo Padre.
Inicialmente estava prevista a confissão de cinco peregrinos pelo Sumo Pontífice, acabaram por ser apenas três, um homónimo do Papa, o peregrino Francisco, um espanhol de 21 anos, a que se juntaram Samuel, italiano de 19 anos, e também Iézbi, uma peregrina guatemalteca de 33 anos.
O momento não foi um diferente em número de peregrinos de todos os outros momentos em que o Papa se deslocou por Lisboa esta semana. Milhares de pessoas aguardavam o Santo Padre quando chegou ao Parque do Perdão. Apesar do momento da confissão ser solene, os cânticos e vivas ao Papa estiveram sempre presentes durante os breves 20 minutos em que os três jovens se confessaram.
Pela singularidade, a confissão pelo Papa estava programada para um confessionário visível pela imprensa e por quem por ali passasse. Mas, por decisão de Francisco, foi escolhido outro, mais privado, o confessionário 12B. Deixou também para trás a cadeira que lhe tinha sido posta especialmente para confessar, um assento de cabedal branco. Depois de ter sido levado até ao confessionário em cadeira de rodas, levantou-se e sentou-se num banco semelhante ao que é utilizado por qualquer outro dos padres que ali confessou por estes dias.
"O coração está cheio e que vai estar assim durante um certo tempo"
Depois da confissão, falámos com Francisco. O jovem peregrino sublinha que, até hoje, tentou esquecer que ia usufruir deste privilégio, mas que durante a noite não conseguiu dormir muito. Refere "a emoção enorme" na "experiência de estar perto do Papa, falar com ele e olhá-lo nos olhos". Remata dizendo que "o coração está cheio e que vai estar assim durante um certo tempo". Diz já ser seu hábito confessar-se, mas que "isto foi um presente". De Francisco leva, além do terço, também as palavras que ontem disse aos jovens para "ser valente e não ter medo".
Já Iézbi, a peregrina mais velha dos três confessados pelo Papa Francisco, sublinha a "alegria que sempre caracteriza o Papa", e diz que levará para sempre os conselhos que o Santo Padre lhe deu. Estava ainda a segurar com grande vigor uma caixa branca com um terço oferecido por Francisco.
Não tinha ainda conseguido partilhar a experiência com a família por não ter internet, mas ao 💥️SAPO24 relata as "piadas" e o sorriso do Papa, e afirma estar "muito agradecida a Deus". Explica o sentido e a oportunidade de ali ter estado, "porque Deus nunca fica com nada, dá sempre tudo. Vale a pena entregarmos a nossa vida, o nosso tempo, a nossa juventude a Deus porque ele devolve sempre".
Refere também que quando recebeu a notícia de que seria confessada pelo Papa, ficou muito emocionada, mas também preocupada por estar a trabalhar. Ainda que fosse uma das voluntárias da JMJ, não podia deixar de aceitar "o presente de Deus". Não tem dúvidas de que foi uma bênção estar com o Santo Padre e "sentir através dele que Deus está ali e que me ama". No fim da confissão, arriscou e pediu "Querido Papa, somos latinos, posso dar-lhe um abraço?", e Francisco abraçou-a.
Relembra ainda as palavras de Francisco no Acolhimento de ontem, "Deus conhece-nos e chama-nos pelo nome", para depois concluir "eu confirmei isso hoje".
Até ao momento sabe-se que entre 10 e 15 mil pessoas confessaram-se diariamente nos 150 confessionários disponíveis no Parque do Perdão, por onde já passaram 825 padres por dia, segundo a organização.
A iniciativa terminou esta sexta-feira às 16h00, e agora a organização do evento pretende entregar um confessionário a cada um dos três estabelecimentos prisionais que os construíram. Os restantes serão disponibilizados às paróquias em Portugal que estiverem interessadas.
Na quarta-feira, recolhemos alguns testemunhos dos milhares de jovens que estiveram no Parque do Perdão para se confessarem. Entre eles estava Francesca, uma italiana de 35 anos, missionária que fala português, e que está pela primeira vez na jornada. Contou que confessar-se no contexto da JMJ "foi muito bom porque é uma alegria receber este dom".
Sublinhou também que no final da confissão se emocionou, e disse ao padre que agradecia pelo dom dos sacerdotes, porque são muitas as pessoas que se deslocam ao Parque do Perdão e não se confessavam há muito tempo. Por isso, este ato é de "uma graça enorme de reconciliação".
Destacou ainda que confessar-se na jornada é diferente "porque as pessoas de todo o mundo se podem confessar e todos sentem quantas pessoas têm sede de Deus", algo que classifica como "muito bonito".
Minutos depois encontrámos talvez o testemunho mais emocionante, o de Elisa, também italiana, de 25 anos, e que quando chegou à saída da área restrita dos confessionários ainda lhe corriam lágrimas no rosto.
Muito tocada pelo sacramento que tinha realizado minutos antes, disse que "foi um momento muito intenso com um padre que não conhecia, mas que era muito gentil".
Disse depois que "confessar-me aqui foi dolce, e só o posso explicar em italiano porque não existem palavras em outra língua que o descrevam melhor".
Por fim, acrescentou que este foi "um momento para estar com Deus e Deus ama-nos", e seguiu para rezar.
Da Colómbia falou o Walter, de 19 anos, que contou que já não se confessava há muito tempo e que sentiu necessidade de o fazer na JMJ. "Não sabia que necessitava tanto desta confissão e acabei por me sentir muito bem", revelou. Tal como a Elisa, disse ainda que existiam vantagens em confessar-se com alguém que não conhecia e que sobretudo sentiu "verdade".
Já o espanhol Alejandro, de 20 anos, que está em Portugal desde a semana passada, sublinhou que se sentiu "relaxado e calmo, mas também um pouco nervoso", isto porque não pensou muito bem no que devia dizer.
Recorrendo também à sua língua, porque a emoção não o deixava falar de outra forma, revelou-nos: "Sentia-me mal por não ter pensado muito bem no que dizer, mas depois de falar e confessar tudo, o meu coração alegrou-se e agora estou feliz".
De seguida, encontrámos um casal de italianos voluntários, Fábio e Chiara, ambos com 30 anos, que vieram pela primeira vez juntos à jornada e decidiram que tinham de se confessar neste contexto.
Chiara salientou que esta é uma "experiência linda, porque o padre com que falou era muito bom e deu-lhe conselhos muito importantes para a vida e que vai levar para sempre".
O namorado, Fábio, concordou e disse ainda que "esta é uma possibilidade que ninguém deve negar e é sempre extraordinário, sentimo-nos abraçados e acolhidos". Acrescentou também que "todos somos humanos e podemos errar, mas Deus perdoa sempre".
Chiara disse por fim que normalmente se confessa sempre com um padre que não conhece e aqui pode fazer isso sem qualquer problema. "Os padres que encontramos aqui podem ter outras experiências de vida, porque são de muitas nacionalidades e isso é muito bom".
Lisdy, com 28 anos e de El Salvador, pela segunda vez numa JMJ, sublinhou que esta foi uma "experiência maravilhosa simplesmente porque se sente o perdão de Deus e os conselhos dos padres".
Acrescentou que a confissão na JMJ "tem mais momentos de diálogo".
De Moçambique veio confessar-se uma jovem irmã do Sagrado Coração de Jesus, Elisabette, de 23 anos, que destacou "que encontrar-se com Jesus é sempre bom". Convidou ainda todos os jovens a fazerem sempre a confissão "porque confessar é liberta-se e seguir em frente com a vida".
Disse ainda que "todos nós somos pecadores e pedindo perdão encontramos a paz".
A mais nova das entrevistadas foi Anna, de 18 anos, que veio diretamente do Canadá com a família para a sua primeira JMJ. Muito contente depois da sua confissão, sublinhou que esta era a principal atividade que queria fazer em Portugal e que foi "fantástica".
"É um pouco diferente de me confessar em casa, mas o sentimento de perdão é o mesmo, e agora sei que tenho o perdão de Deus", acrescentou.
O último a falar conosco foi Gabriel, de 22 anos, um sul-coreano que vive no Paraguai e que veio acompanhado pela sua Igreja coreana que tem sede no Brasil.
Acabado de sair do confessionário, destacou que "esta foi uma confissão fora do normal porque nunca mais vou ver este padre". Diz ainda que se sentiu mais seguro e por isso confessou pecados que normalmente nunca revelaria.
"Sinto que deixei ali dentro uma parte de mim e isso foi diferente", acrescentou.
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