‘Ele sequer sabia o nome do meu filho’, afirma mãe de menino que teve imagem usada em tatuagem sem autorização dos pais
A mãe do menino negro que teve a foto do rosto usada sem autorização por um tatuador de São Paulo conta que busca informações há mais de um mês sobre quem é o homem que está com a imagem da criança gravada no braço. Para a empresária Preta Lagbara, a prioridade é que a tatuagem com a imagem de 💥️Ayo, de 4 anos, seja coberta. Ela afirma que o tatuador não se preocupou em saber quem era pessoa retratada.
1 de 4 Ayo, de 4 anos: imagem do menino foi tatuada sem autorização — Foto: g1/Miguel Folco
Ayo, de 4 anos: imagem do menino foi tatuada sem autorização — Foto: g1/Miguel Folco
Ela contou que, até o momento, está conversando sobre um acordo, mas não descarta entrar na Justiça para ter acesso à identidade da pessoa que foi tatuada e garantir o direito de imagem do filho.
Preta Lagbara destaca que quer que a imagem do menino seja respeitada.
“Eu vi outras fotos de outras crianças em várias páginas de tatuagem e, massivamente, essas crianças brancas estão tatuadas em corpos de familiares, pais, fazendo homenagem. Eles ainda colocam a legenda: ‘homenagem do pai’. Mas, o do meu filho, está tatuado no corpo de um homem que nunca viu a gente na vida, que a gente não sabe quem é”, disse a mãe.
O caso ganhou repercussão depois que Preta denunciou nas redes sociais o tatuador Neto Coutinho. Ele ganhou dois prêmios durante a convenção de tatuagem Tattoo Week, que ocorreu em outubro deste ano na capital paulista, e um deles foi com a reprodução da foto da criança. A imagem usada não teve autorização dos pais e nem do fotógrafo responsável.
2 de 4 Preta Lagbara e Ayo: respeito pelo filho e suas crenças — Foto: g1/Miguel Folco
Preta Lagbara e Ayo: respeito pelo filho e suas crenças — Foto: g1/Miguel Folco
A foto, originalmente, foi publicada pelo fotógrafo que fez a imagem do menino, Ronald Santos Cruz. Ele tem mais de 90 mil seguidores nas redes sociais e é conhecido por retratar pessoas negras no Brasil. Em 2023, ele chegou a ser selecionado para a exposição de fotografia pelo Centro Europeu e, em 2023, ficou entre os 💥️100 melhores fotógrafos do mundo na modalidade retrato masculino, pelo Concurso Internacional realizado pela empresa russa 35awards.
Preta conta que já havia recebido convites para que o menino posasse outras vezes, mas a única vez que autorizou foi para as lentes de 💥️Ronald Santos Cruz. O fato de terem a mesma fé e a sensibilidade no trato com crianças contribuiu para a autorização. A mãe acompanhou a sessão de fotos com Ayo, em janeiro deste ano.
Ela destaca que a questão não é a qualidade do trabalho do tatuador.
3 de 4 Tatuagem feita com imagem de criança de 4 anos sem autorização dos pais e fotógrafo — Foto: Reprodução/InstagramTatuagem feita com imagem de criança de 4 anos sem autorização dos pais e fotógrafo — Foto: Reprodução/Instagram
Ela também questiona como um evento de grande porte premiou a tatuagem do rosto de uma criança que eles não sabem quem é.
A mãe do menino afirma que o caso afetou a família e que ela deseja que a tatuagem com a imagem da criança seja coberta.
“Isso traz um desgaste emocional, um desgaste espiritual, um desgaste físico, mental. Eu sou uma pessoa de religião de matriz afriacana, o pai do Ayo é um nigeriano. Um cara iniciado nos ritos para ancestral lá. Eu sou uma pessoa iniciada nos ritos para ancestral aqui. E isso para a gente tem uma proporção maior do que parece”, disse Preta.
4 de 4 Ayo: alegria do menino não foi afetada pela polêmica — Foto: g1/Miguel FolcoAyo: alegria do menino não foi afetada pela polêmica — Foto: g1/Miguel Folco
Mesmo assim, ela tenta fazer com que Ayo não perca o sentido do seu nome. O menino, que vai completar cinco anos no mês de dezembro, tem o nome que significa alegria em yorubá.
O tatuador Neto Coutinho pediu desculpas para a família e quer resolver a situação de forma pacífica, segundo seu advogado de defesa, Gabriel Rodrigues 💥️(veja mais abaixo).
Já sobre quem é a pessoa tatuada, a defesa de Neto afirmou ao g1 na quinta-feira (1º) que não iria divulgar detalhes e que trataria do assunto apenas com os envolvidos.
Em seu perfil no Instagram, o fotógrafo Ronald ressaltou que não foi consultado pelo tatuador sobre o uso de sua foto.
"Como um cara branco deixa um tatuador tatuar uma imagem de uma criança negra que nunca viu na sua vida em seu corpo? Eu sou um cara que sempre fotografo muitas crianças e, uma hora ou outra, sempre chega um artista que pergunta se pode usar meu trabalho como referência. Eu sempre digo que vou ver com os pais quando não tem fins lucrativos. Mas essa tatuagem foi tão perversa, sem explicação", disse.
"Segundo o tatuador, ele achou a foto no Pinterest e achou que fosse pública, e resolveu tatuar a criança num corpo branco. A gente está em 2022 e, se voltarmos lá atrás, vemos que muita coisa não mudou. Como se nossos corpos, nossos rostos, não tivessem donos. E olhar o caso como esse é do mínimo absurdo. Primeiro, tem os direitos autorais de pegar a foto. Segundo, é a imagem de uma criança. Terceiro, participa de um prêmio com a foto de uma criança que achou bonito e vai lá tatua. É sem lógica."
Ainda conforme Ronald, ele está com apoio jurídico e vendo a melhor opção para tratar do caso. "No mínimo curioso porque é sem noção. Caso inédito de ter foto virar tatuagem sem permissão."
O advogado de defesa do tatuador, Gabriel Rodrigues, disse que o tatuador não teve má-fé e pediu desculpas para a família.
"Vamos tentar fazer um acordo e resolver a questão de forma pacífica. Estamos em tratativas, e existe esse diálogo já. Ele nunca pretendeu prejudicar ninguém. Realmente, tem toda uma questão artística e vamos tentar dialogar. Caso não se resolva no diálogo, vamos responder ao processo que poderá ser aberto", afirmou.
Em nota publicada em sua rede social, o tatuador também se retratou com a comunidade preta. Veja a nota na íntegra.
Já os representantes da Tattoo Week disseram que não receberam nenhuma comunicação da mãe da criança em seus canais oficiais e que está à disposição da família.
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