Deputados estaduais de todo o país apresentaram 45 projetos contra linguagem neutra de janeiro de 2023 a fevereiro de 2022, diz
Uma pessoa segura bandeira do movimento trans — Foto: Brendan McDermid/Reuters/Arquivo
Um levantamento feito por um mestrando em linguística da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) apontou que, entre janeiro de 2023 e fevereiro de 2022, foram feitos ao menos 45 projetos de lei em diversos estados do Brasil contrários a linguagem neutra e de gênero, visando a proibição em escolas e também em locais públicos como hospitais.
Os dados foram coletados para uma pesquisa sobre as diferenças entre linguagem neutra e linguagem inclusiva, realizado pelo mestrando Robert Moura Sena Gomes, que se identifica como pessoa não binária (quem não se percebe como pertencente a um único gênero).
Cada vez mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+, a linguagem neutra tem como objetivo adaptar o português para o uso de expressões em que as pessoas não binárias (que não se identificam nem com o gênero masculino nem com o feminino) e/ou intersexo se sintam representadas.
Os estados com mais projetos de lei contrários à linguagem neutra são:
Todos os PLs de São Paulo ainda estão em tramitação.
No Brasil, em 2023, 23 projetos de lei foram propostos sobre o tema; em 2023, foram 19 e, até fevereiro de 2022, dois projetos.
Os estados de Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Rondônia também apresentaram propostas nesse sentido.
"Quando essas pessoas tentam controlar a língua, elas não estão apenas tentando controlar como as pessoas vão falar, com a marcação de gênero ou não, é além do discurso. Essas pessoas que são contrárias buscam o apagamento de quem não segue o padrão cis heteronormativo. Então a gente costuma dizer que o discurso autoriza a discriminação, o apagamento de direitos, como o direito social de ter a marcação não binária em documentos", afirma Robert.
O projeto de lei 531/2021, do deputado estadual Gil Diniz (PL), por exemplo, veda o "uso da chamada 'linguagem neutra' em quaisquer comunicações oficiais ou extraoficiais, internas ou externas à administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes do Estado, autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público".
Um outro exemplo é o projeto 703/2020 de autoria dos deputados Tenente Coimbra (PL) , Douglas Garcia (Republicanos), Carla Morando (PSDB) e Wellington Moura (Republicanos), que pede a proibição da "utilização da denominada 'linguagem neutra' por instituições de ensino da rede pública e privada e bancas examinadoras de seleções e concursos públicos em currículos escolares e editais, em contrariedade às regras gramaticais consolidadas".
Além da análise de projetos de lei, a pesquisa investigou também a construção do gênero neutro na língua portuguesa do Brasil, por meio de análises de textos escritos por linguistas profissionais (saber científico) e não linguistas (saber popular). Segundo a pesquisa, de um lado existe um controle religioso de discursos divergentes sobre a língua e, de outro, um posicionamento que vê na língua a possibilidade de representação e de luta por direitos.
Robert entrou no mestrado em 2023 e começou a realizar análises textuais com o objetivo de entender o que estava sendo falado sobre a linguagem neutra e a linguagem inclusiva.
"Eu sou uma pessoa não binária e, para mim, foi uma motivação tanto científico quanto de vivência. Para trazer uma questão que era algo que também estava sendo um processo de autodescoberta", afirmou.
Robert começou a notar que, na gramática, existe um movimento de tentar retirar da língua qualquer ligação com identidade de gênero. "Existe também uma discussão sobre o uso das inserções de marcação de gênero, como os '-@', '-x' e '-e', para se referir a pessoas não binárias como algo que pode ser inacessível para a população."
"É importante trazer essa discussão porque a linguagem é um direito. O direito não é só civil, mas também linguístico de se ver, de existir e resistir pela linguagem", afirma Robert.
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