Alerta vermelho: ciclo de redução da violência no Brasil perde força

Muito já se falou sobre 2022 ter sido um ano marcado pela violência política e pelo medo, mas os números ora revelados pelo Monitor da Violência, parceria do 💥️g1 com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e com o Núcleo de Estudos da Violência, exigem que o país acione o alerta vermelho e saia do piloto automático com o qual a segurança pública tem sido conduzida nas últimas décadas.

No agregado Brasil, os crimes letais intencionais, que é a soma de homicídios, latrocínios (roubos seguidos de morte) e lesões corporais seguidas de morte, oscilaram para baixo 0,9% em 2022, em relação ao ano anterior. Essa leve queda pode ser lida como estabilidade do patamar alcançado em 2023 e que, mesmo assim, só foi mantida em função da queda de 28,8% apurada no Amapá, 14,1% em Roraima e 10% no Ceará. Na outra ponta, os maiores crescimentos de mortes foram observados no Mato Grosso (24,1%), Acre (19,3%) e Rondônia (13,3%).

O problema é que, segundo a metodologia de grupos de qualidade da informação utilizado pelo Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Rondônia e Roraima ainda possuem sistemas de informações que não são totalmente fidedignos. Assim, tanto as quedas quanto as subidas bruscas observadas nesses estados podem, na verdade, ser efeito de problemas de registro e não necessariamente descrevem por completo a realidade do crime e da violência.

E, na ideia de isolar esse problema e analisar o que está ocorrendo com mais acurácia, se excluirmos esses cinco estados do cálculo da média nacional, o Brasil fechou o ano de 2022 com um crescimento de 0,4% no total de Crimes Violentos Letais Intencionais. Ou seja, seja considerando os estados com sistemas de dados mais frágeis, seja excluindo-os da média nacional, o que se constata é que a violência letal, que muitos achavam que estava sob controle no país, mostra-se resiliente e novamente nos lembra a urgência de mudar forma de formular e implementar políticas de segurança pública, a começar por reconhecer que estamos diante de um direito social universal e que até hoje o Estado brasileiro não deu conta de assegurar para a sua população.

Mas as más notícias, infelizmente, não param na taxa anual. Se desagregarmos os dados por trimestres e compará-los com os mesmos períodos do ano anterior, há uma forte aceleração das mortes no último trimestre de 2022. Nesse período, os crimes violentos letais intencionais cresceram, na média nacional, 6,5% em relação ao mesmo período de 2023.

Se não considerarmos o crescimento observado no Acre, pelos motivos já enunciados anteriormente, veremos que esse aumento é puxado por Bahia e Tocantins, que tiveram um incremento de 56,6% e de 41,0%, respectivamente, no número de assassinatos. Mas, aqui, também chama atenção São Paulo que, depois de várias décadas de redução da violência, apresentou no último trimestre de 2022 um crescimento de 22,1% no número de vítimas de crimes violentos letais intencionais. E não só, chama atenção que a região Sudeste do Brasil foi a única que, no quarto trimestre de 2022, apresentou crescimento de mortes em todos os quatro estados (ES, MG, RJ e SP) que a compõem.

Nessa linha, vale lembrar que as ações do Governo Federal, durante a gestão de Jair Bolsonaro (2019-2022), foram residuais na estruturação do Sistema Único de Segurança Pública e de uma Política Nacional de Segurança Pública que efetivamente não seja apenas uma série de imposições às Unidades Federais de mais burocracia, agora sob uma roupagem mais moderninha que usa jargões como gestão e governança, mas não mudaram as regras do jogo e/ou não isolaram resistências de se enfrentar temas urgentes como a violência contra a mulher e os feminicídios – Bolsonaro não incluiu os feminicídios nas metas da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.

Bolsonaro não soube nem mesmo executar o dinheiro da segurança pública de forma mais eficiente, que, graças à mudança feita, em 2018, pelo governo Temer nos critérios de repasse da Caixa dos valores arrecadados com as loterias federais, nunca houve tanto dinheiro à disposição da segurança pública, com valores que superam R$ 2 bilhões por ano – isso para não dizer do dinheiro que se encontra represado nos estados pelo fato de as transferências fundo a fundo previstas na nova legislação do SUSP terem sido mal operacionalizadas.

Não à toa, quando comparamos os dados do Monitor da Violência com aqueles da pesquisa “Violência e Democracia: panorama brasileiro pré-eleições de 2022 - Percepções sobre medo de Violência, Autoritarismo e Democracia”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS), realizada em agosto e setembro do ano passado, vamos compreender as razões pelas quais o percentual da população adulta com mais de 16 anos de idade do país e que declarou que tem medo de morrer assassinada cresceu 7,6% entre 2017, ano da primeira sondagem feita pelo FBSP, e 2022. Pelos dados do Monitor da Violência, o medo não é infundado e, só no ano passado, atingiu o equivalente a 138,5 milhões de pessoas adultas com mais de 15 anos de idade.

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