Até quando os ucranianos conseguem defender Bakhmut?
Tanque se dirige para a frente de batalha em Bakhmut — Foto: Reuters/Lisi Niesner
O chefe da força mercenária russa 💥️Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, disse nesta sexta-feira (03) que seus combatentes cercaram quase completamente 💥️Bakhmut, cidade no leste ucraniano que há semanas está no centro de uma feroz disputa entre forças da Rússia e da Ucrânia. "Só resta uma estrada", afirmou ele em um vídeo – a declaração não pôde ser verificada de forma independente
Na gravação, Prigozhin mostra supostos prisioneiros ucranianos – dois jovens e um homem mais velho – e afirma que a cidade agora é defendida apenas por "velhos e crianças".
O lado ucraniano insiste que a localidade continuará sendo defendida. "Sim, é difícil e duro, mas sabemos como prosseguir", disse o secretário do Conselho de Segurança da Ucrânia, Oleksiy Danilov, ao portal de notícias RBK-Ukraina.
"Para as forças ucranianas e russas, Bakhmut é de grande importância estratégica", diz Marina Miron, pesquisadora do Centro de Ética Militar do King's College London. Ela acredita que a captura da cidade resultaria em um novo avanço das tropas russas – talvez na direção de Kramatorsk. "Elas então controlariam estradas importantes, isolariam as forças ucranianas e tornariam muito mais difícil para elas se defenderem", diz.
A tese é compartilhada pelo coronel reformado Ralph Thiele, ex-funcionário do gabinete do comandante em chefe da Otan. "O lado ucraniano também vem sendo aqui pressionado a apresentar resultados – inclusive por seus parceiros ocidentais. De alguma forma, também deve ser constantemente justificado frente à opinião pública por que está sendo dado tamanho apoio à Ucrânia", diz o especialista alemão.
Thiele ressalta, ainda, o 💥️fator psicológico envolvido na defesa de Bakhmut. "As pessoas têm que ser, de alguma forma, motivadas a perseverar. Claro, isso também envia um sinal para toda a Ucrânia – tanto para a população civil como para os soldados em outros lugares", explica.
Mike Martin, também pesquisador da King's College, atribui à meta de "libertar o Donbass", anunciada por Putin, a insistência de Moscou em tentar capturar Bakhmut a todo custo. "Se você observar como correm as estradas e a rede ferroviária, você encontra duas grandes cidades a oeste de Bakhmut que ainda estão no Donbass: Sloviansk e Kramatorsk. E, para capturá-las, o que é necessário para seu objetivo estratégico, eles têm primeiro que tomar Bakhmut."
Ralph Thiele avalia como mínimas as chances dos ucranianos na luta por Bakhmut. Segundo ele, as forças russas quase cercaram a cidade. "Há uma pequena faixa de quatro quilômetros de largura que ainda é livremente acessível para fuga, reforços ou suprimentos. Mas quatro quilômetros não é nada, e os russos cercam a cidade como uma ferradura e estão tentando envergar essa ferradura para juntar suas pontas", diz Thiele.
Além disso, ele afirma que os russos são superiores aos ucranianos em Bakhmut. "Se você olhar para a situação geral, poderá ver muitos tipos de equipamento do lado russo, sejam veículos blindados, tanques, artilharia ou aeronaves", diz o especialista, acrescentando que os ucranianos, por outro lado, teriam que esperar a chegada da ajuda militar ocidental.
Quanto a essa ajuda, Thiele é menos otimista. "Quando vemos que a Europa inteira está produzindo menos munição para a Ucrânia em um mês do que os russos disparam em um dia, você pode ver como será difícil conseguir ter o apoio necessário. O assunto dos tanques também é extremamente difícil. Na discussão pública, as pessoas sempre disseram: tanques sim, mas os tanques têm que chegar lá de alguma forma. Eles têm que ser transportados, mas muitas pontes não conseguem suportá-los. Portanto, é difícil conseguir com que eles cheguem até lá. Se um tanque quebra ou precisa de manutenção, você não pode fazer isso no local, pode ter que viajar 900 quilômetros de volta à Polônia ou à Eslováquia."
Após vitórias perto de Kharkiv e de Kherson, a Ucrânia decidiu lançar uma terceira ofensiva com relativa rapidez – de Zaporizhzhia a Melitopol. Segundo o militar, no entanto, devido à pressão que as forças ucranianas estão sofrendo nas proximidades de Bakhmut, Kiev é forçada a transferir forças para lá.
Segundo ele, o Exército ucraniano está preparando oito brigadas em busca de um local adequado para uma ofensiva. Essa poderia ser a área ao norte de Melitopol. Em caso de sucesso na empreitada, as forças russas na Crimeia, assim como na região de Zaporizhzhia e nos arredores de Kherson, poderiam ter cortadas suas rotas de suprimento através da ponte da Crimeia. "Então, os russos teriam outras preocupações, ou seja, o abastecimento de suas tropas nesta área, ao invés de novas ofensivas no Donbass", diz Reisner.
"Mas ainda não chegou a hora de uma contraofensiva ucraniana", diz Gustav Gressel, especialista em Rússia do think tank European Council on Foreign Relations (ECFR). "Para lançar uma contraofensiva, é necessário se organizar longe das linhas de frente e dos combates e reunir recursos para um avanço. Isso seria arriscado neste estágio. Mesmo que a Ucrânia penetrasse nas linhas russas e expandisse seu controle, os russos ainda teriam fortes reservas e um grande número de tropas para lançar na batalha", explica Gressel, lembrando que os russos poderiam atacar os ucranianos de lados diferentes ao mesmo tempo.
"Todo mundo tem interesse em que esta guerra termine agora, e é claro que os lados estão pressionando, de preferência do lado ucraniano, e talvez agora do lado russo, via Índia e China", afirma Ralph Thiele. No entanto, ele considera irreal a ideia de uma derrota da Rússia, ressaltando que Moscou ainda tem um grande potencial de escalada – não somente com armas nucleares. "Isso inclui armas supersônicas, que nem percebemos, mas que permitem a Putin colocar uma bomba em qualquer mesa do mundo sem que possamos nos defender dela", adverte.
Segundo o militar alemão, agora é tarefa do Ocidente impedir uma escalada. "Temos que ver como podemos convencê-lo a ceder, e isso tende a ser feito principalmente por aqueles que o apoiam. Isso seria o caso de China ou Índia, Arábia Saudita, Brasil e África do Sul. É um grupo grande que poderia realmente pressionar a Rússia." E, no caso da Ucrânia, de acordo com Thiele, qualquer sucesso militar ajudaria Kiev a fortalecer sua posição antes de um cessar-fogo.
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