Matança de abelhas no Brasil alerta para risco dos agrotóxicos
Desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu o cargo em janeiro, o Brasil liberou a venda de um número recorde de 290 pesticidas, (Imagem: Patricia Monteiro/Bloomberg)
A morte chegou rápido para as abelhas do apicultor Aldo Machado. Menos de 48 horas após a primeira apis mellifera dar sinais de doença, dezenas de milhares perderam a vida, formando montes e mais montes de insetos mortos.
“Como elas têm um comportamento higiênico muito apurado, elas começam a limpar a colmeia”, conta Machado, vice-presidente da Associação dos Apicultores do Rio Grande do Sul. “Só que quando pegam a abelha contaminada e jogam fora, terminam se contaminando. Elas acabam morrendo em massa.”
Cerca de meio bilhão de abelhas morreram em quatro dos estados sulinos nos primeiros meses do ano. O fenômeno intensificou o debate sobre o mar de pesticidas que inunda a agricultura do País e o questionamento sobre se os produtos químicos estão chegando aos alimentos de consumo humano. Enquanto isso, o governo considera a liberação de mais químicos agrícolas. A maioria das abelhas mortas tinha traços de Fipronil, um inseticida proibido na União Europeia e classificado como possível carcinogênico para humanos pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA.
Desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu o cargo em janeiro, o Brasil liberou a venda de um número recorde de 290 pesticidas, 27% a mais do que no mesmo período do ano passado. Um projeto de lei no Congresso pretende flexibilizar ainda mais os critérios. Entre as fabricantes das substâncias recentemente liberadas estão as brasileiras Cropchem e Ouro Fino, bem como as multinacionais Arysta Lifescience, Nufarm e Adama Agricultural Solutions. As gigantes Syngenta, Monsanto, BASF e Sumitomo também puderam registrar novos produtos.
O uso de pesticidas no Brasil aumentou 770% de 1990 até 2016, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Já o Ministério da Agricultura argumenta que o Brasil ocupa o 44º lugar no ranking mundial de pesticidas por hectare e que é “incorreto” comparar as práticas de um país tropical com aquelas de regiões temperadas.
Ainda assim, o último relatório de segurança alimentar da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu que 20% das amostras continham resíduos de pesticidas acima dos níveis permitidos ou continham pesticidas não autorizados. E isso considerando que o estudo sequer fez testes para a presença de glifosato, o pesticida campeão de vendas do Brasil e proibido na maioria dos países. Para os críticos, as colmeias vazias são um alerta.
“A morte de todas essas abelhas é um sinal de que estamos sendo envenenados”, disse Carlos Alberto Bastos, presidente da Associação Apícola do Distrito Federal.
A agricultura é o setor que mais contribui para o crescimento doméstico, representando 18% da economia. Seu poder é incomparável — seja na cultura popular ou na política.
Assim como o presidente dos EUA, Donald Trump, Bolsonaro foi eleito com forte apoio do agronegócio e expressa desdém com preocupações ambientais. “Esse governo é de vocês”, prometeu Bolsonaro a parlamentares da bancada agrícola. O governo dele vem permitindo que o setor tenha ampla margem de manobra para utilizar na produção os químicos que bem entende.
Cerca de 40% dos pesticidas no Brasil são “altamente ou extremamente tóxicos”, segundo o Greenpeace, e 32% não são permitidos na União Europeia. Enquanto isso, a liberação dessas substâncias foi acelerada sem que o governo tenha contratado gente suficiente para realizar as avaliações, afirmou Marina Lacorte, coordenadora do Greenpeace Brasil. “Não há outra explicação para isso, além da política.”
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