Felipe Miranda: Muito obrigado
CIO da Empiricus comemora os 10 anos da empresa
A Empiricus completa 10 anos hoje. Tecnicamente, ainda somos crianças e quem já conhece isso aqui sabe que é sempre um Day One. Hoje, tudo começa, com você. Vale para a empresa, vale para o investidor — a cada dia, sua carteira reinicia e você há de revisitá-la todas as manhãs, sob a pergunta: esse é mesmo o melhor portfólio para o momento?
Seja como for, uma década é uma década. E aqui estamos, de pé, prontos para iniciar e reiniciar quantas vezes forem necessárias. Não há como fugir de si mesmo. A alma tem seus próprios ancestrais. Como diz um dos ditados favoritos de Michel de Montaigne, “só há como andar sobre as próprias pernas e sentar sobre o mesmo traseiro”.
Em 10 anos, trabalhamos feito loucos, dormimos pouco, perdemos cabelos, perseguimos obstinada e obsessivamente nossa vocação de levar ao investidor, de forma não conflitada, ideias tão boas ou melhores do que aquelas antes restritas aos profissionais e, ainda mais importante, erramos muito. Assim, muito.
Olhando para trás, posso dizer que foi duro, sim. Muito mais duro do que eu poderia imaginar ex-ante. Empreender no Brasil é uma irresponsabilidade. Empreender no Brasil numa indústria inexistente é um ato de loucura.
Mas, passados esses primeiros 10 anos, posso dizer: eu não me arrependo de nada. Nem mesmo dos erros, porque foram eles que nos permitiram criar casca, arrumar a casa e nos preparar para o futuro. Temos muito, muito mesmo a evoluir, mas ficamos melhores a cada dia. Para mim, seguidor de Carol Dweck, importa muito menos o que você é, e muito mais no que está se transformando. A travessia e o processo são muito mais relevantes do que o destino final, até porque não há destino final.
Certamente, o modelo que nos trouxe até aqui não será o mesmo que vai nos guiar até 2029. Por isso é tão importante a capacidade de se adaptar. A empresa mudou de porte, o mercado mudou, o Brasil mudou. Tenho certeza de que tudo mudará muito pelos próximos anos e muito rápido. Se as coisas mudam, eu mudo — e você?
Sabe, eu não me sinto na condição de dar conselhos. Sobre nada. Não quero dar dicas, pagar de guru, escrever livro de autoajuda, rabiscar potenciais atalhos — até porque não acredito em atalhos. Mas, olhando para trás, acho que aprendi uma coisa ou outra. E as escrevo aqui não como prescrição para sua própria vida. Apenas como princípios que funcionam para mim, na expectativa de que talvez possam, em alguma instância, abrir os olhos dos três leitores para uma nova perspectiva.
Listo abaixo 10 coisas que me parecem úteis, uma para cada ano de vida, não na esperança de que esgotem o aprendizado absorvido nesse ínterim, apenas como uma tentativa de sintetizar coisas mais proeminentes, todas válidas, na minha humilde visão, para três dimensões: empreendedorismo, investimento e cotidiano. No final, se você parar para pensar, é a mesma coisa.
1. Tenha em mente que o ego é seu principal inimigo. Não queira impor suas vontades, suas opiniões ou suas convicções sobre as coisas. Aliás, você não deve ter opiniões. Deixe que o dado, o teste, a realidade decidam por você. A turma do Garantia trouxe para cá a ideia da “ditadura do argumento”, parece que replicando a estratégia da Goldman.
Dizem que no Pactual é assim também. Valoriza-se o melhor argumento, independentemente da hierarquia. É visto como algo positivo, mais horizontal e, supostamente, mais eficiente. Eu sou contra a ditadura do argumento. O Pactual não aprendeu com um-sócio do Pactual. Quem ganha um embate entre teses, ideias ou argumentos não é necessariamente aquele que dispõe da melhor teoria, mas simplesmente aquele com as melhores regras de retórica.
Pérsio Arida foi, junto com Deirdre McCloskey, o primeiro a formalizar essa perspectiva. A única ditadura possível é a do dado e do teste. Coloque duas coisas para rodar e deixe a demanda, fria e material, decidir por você. Como gestor, aprenda a importância de saber gerir egos — confesso que errei várias vezes neste ano nesse sentido e será muito rico poder ouvir o Bernardinho em nosso evento. Como investidor, o ego é um dos motivos para a aversão a perdas, para o viés de confirmação e para a dificuldade de se sair de posições perdedoras — você pode mudar de ideia sobre uma ação ruim e ganhar em outra boa.
2. Encare a verdade de frente. Por mais dura que seja a realidade, ela é melhor do que uma visão alternativa mais amena. Não há meritocracia sem transparência, tampouco bons investimentos sem observação dos erros na montagem de posição ou mesmo admissão da própria responsabilidade.
3. Aprenda a errar, por uma simples razão: você vai errar. Duas lições básicas para mim sintetizam como errar. A primeira: prefira o erro tipo 2 ao erro tipo 1. Ou seja, tomar como falso algo que é verdadeiro é muito menos grave do que tomar como verdadeiro algo que é falso. Comprar uma ação e ver ela caindo 99% é bem mais grave do que deixar de comprar uma ação que sobe 99%. Na verdade, a todo momento cometemos o erro tipo 2, e tudo bem.
Exatamente agora está acontecendo um super bull market em algum lugar do mundo e estamos de fora. Lide com o FOMO (“fear of missing out”). Não há problema algum em perder uma festa. No Instagram, a vida de todo mundo é mais interessante do que a sua. A grama do vizinho é sempre mais verde. Aliás, o verdadeiro fundo verde foi lançado pela Vitreo e ninguém reparou.
Felipe Miranda recomenda tentar, dia e noite, coisas que podem dar muito certo (Imagem: Pixabay)
4. Exponha-se sistematicamente à sorte. Como assim? É isso mesmo. Há como se programar para ter sorte. Tente, dia e noite, coisas que podem dar muito certo. E se não derem certo, você não vai se machucar tanto. Depois de mil tentativas, uma vai dar certo. Alguém vai chamá-lo de um grande sortudo, porque ninguém terá observado as 999 vezes em que você tentou e não deu certo. A sorte só atinge aqueles que a ela se expuseram.
5. Saiba pagar por opcionalidades. Eu nunca me arrependo de ir ao cinema, ao teatro ou a uma exposição, porque sempre vou com a cabeça de que estou pagando pela chance de experimentar algo bacana. Cada vez mais, por conta da maior disponibilidade de informação, as ações são apreçadas mais corretamente, mais em linha com o que seria predito pela hipótese de mercados eficientes. Então, ficam cada vez mais valorizadas justamente as opcionalidades. Se você souber pagar barato por várias opcionalidades, uma delas vai dar certo. É uma extensão do item anterior. Sempre — e sempre — compare o quanto você tem a ganhar versus o que você tem a perder, em qualquer decisão da sua vida.
6. Entenda que o perfeccionismo é um defeito, e um defeito grave. Feito é melhor que perfeito. Com 20% do esforço, você pode alcançar 80% do resultado. É muito mais eficiente fazer quatro coisas legais do que uma coisa impecável. Se você ficar esperando uma decisão ou uma empresa perfeita, dificilmente vai sair do lugar. Aliás, portfólios nunca serão perfeitos — necessariamente, você precisará ter coisas caindo na sua carteira, porque a boa gestão de portfólio exige, para o alcance dos ganhos da diversificação, ativos negativamente correlacionados.
7. Jamais se esqueça de que o mundo é complexo, aleatório, tênue e o futuro é impermeável. Há muito especialista por aí, sobre tudo. Todos eles estão sempre dispostos a vir com uma receita pronta para você utilizar, sempre sabem mais do que você e vão criticá-lo independentemente do que você fizer. Dê ouvidos a uma única pessoa: a você mesmo. Mas lembre-se: você também não é um super-herói. Volte ao item 1.
8. Acrescente um “ainda” ao final de cada frase sobre as próprias autoavaliações negativas. Perceba o valor que isso tem. “Eu não sou um grande investidor, ainda.” “Eu não sou bilionário, ainda.” “A Empiricus não é uma empresa tão grande quanto eu gostaria, ainda.” “A experiência do nosso assinante não é da forma exata como eu gostaria, ainda.”
Esse é o resumo do mindset de crescimento da Carol Dweck. Você pode ser melhor a cada dia. Todas as suas habilidades (ou a falta delas) são mutáveis, até mesmo coisas que você não suporia, como sua capacidade de desenho. Imagine o quanto você pode melhorar como investidor ou empreendedor. Disponha-se a melhorar, todos os dias. Seu cérebro se expande fisicamente quando você aprende uma coisa nova.
9. Não se preocupe em ser original. Aliás, se você acha que está sendo original, apenas não leu o suficiente. A cópia é a maior das homenagens e você pode trazer uma prática de terceiros para dentro de casa. Uma ação cuja ideia partiu de você ou de um gestor amigo vai lhe pagar rigorosamente a mesma coisa. Não se remuneram direitos autorais na B3. Ao mesmo tempo, cuidado ao copiar. Como ouvi uma vez de um grande investidor, gestão de recursos é como um filme pornô. Você não pode ser bom em uma única posição, precisa ser bom em todas. Às vezes, você vai copiar a exposição do sujeito ao dólar, mas aquilo não faz sentido nenhum no seu portfólio — enquanto, para o gestor, aquilo representa potencialmente um hedge contra suas posições de alto risco, para você pode ser apenas uma aposta contra o real.
“Duas coisas me fazem continuar, sempre: a certeza de que estamos fazendo algo importante e a convicção de que eu não poderia fazer nada além disso na minha vida”, disse o executivo (Imagem: Pixabay)
10. Acima de tudo, encontre sua vocação. Às vezes, só eu sei o quanto é difícil estar na condição de CIO da Empiricus e de ser o rosto principal da Casa (injustamente, mais sobre isso abaixo). Talvez a Gabi saiba também, para ser bem sincero — obrigado por aguentar junto. Mas duas coisas me fazem continuar, sempre: a certeza de que estamos fazendo algo importante e a convicção de que eu não poderia fazer nada além disso na minha vida.
Hoje eu gostaria de encerrar agradecendo. Primeiramente, às pessoas da própria Empiricus . É muito injusto que eu apareça à frente da companhia. Os três leitores do Day One não têm ideia de quantas pessoas excepcionais temos aqui. São elas que fazem a Empiricus melhor a cada dia, fiéis à nossa filosofia, e ficam nos bastidores.
Quero também agradecer a pessoas do mercado que passaram a fazer parte do meu convívio mais recentemente, nos ajudando muito nesta nova fase da Companhia, de institucionalização, aproximação respeitosa do regulador e reconhecimento da nossa real projeção — sem arrogância alguma, mas também sem falsa modéstia e discurso politicamente correto. Se aqui não cito seus nomes é por respeito à sua privacidade. Saibam, porém, que, diferentemente do que se vê por aí, eu tenho enorme gratidão — e como a gratidão é cada vez mais rara, meu Deus.
E, por fim, o agradecimento mais importante: muito obrigado a você, assinante da Empiricus . Sem você, nada disso seria possível. Eu não me cansarei de agradecer. Tenho uma única forma de recompensá-lo: com muito trabalho, dedicação e o compromisso de continuar perseguindo a minha própria vocação, de levar para você aquilo que considero mais interessante para se ganhar dinheiro. Hoje e sempre. Cada dia, um Day One. Muito obrigado, por esse e pelos próximos 10 anos.
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