Cordeiro atirado em piscina provoca revolta na Argentina
A brincadeira espetaculosa envolvendo uma iguaria cara produziu imediatamente um debate acalorado sobre desigualdade, privilégio e justiça (Imagem: Reuters/Ricardo Moraes)
Um helicóptero paira lentamente sobre a casa de férias de um magnata argentino do ramo da moda. De repente, aparece algo escuro. É a carcaça de um cordeiro, que cai rapidamente. A queda do peso morto na piscina faz um observador rir alto.
O mergulho provocou uma explosão midiática. Um vídeo da façanha frívola e mórbida ocorrida em 9 de janeiro surgiu na terça-feira, desencadeando uma investigação e um debate furioso sobre exagero e desigualdade em um país que enfrenta uma profunda crise econômica.
Novas evidências vieram à tona esta semana, quando o governo informou que a inflação atingiu 54% no final do ano, a maior em quase três décadas. Os reajustes de preços reduzem o poder de compra em uma nação ávida por carne, onde mais de um terço da população vive abaixo da linha de pobreza e luta por comida regularmente.
A brincadeira espetaculosa envolvendo uma iguaria cara produziu imediatamente um debate acalorado sobre desigualdade, privilégio e justiça.
“Este é outro capítulo da mesma novela que mostra como as pessoas ricas da América do Sul fazem piada com as pessoas pobres”, disse Nestor Pitrola, ex-parlamentar afiliado ao Partido dos Trabalhadores. “Isso não vai acabar bem. Estes ricos, que odeiam pagar impostos, devem ser punidos por sua maneira desprezível de zombar dos pobres.”
“Manteiga no telhado”
O cordeiro caiu na piscina de uma casa em José Ignacio, no Uruguai, alugada por Federico Alvarez Castillo, proprietário da marca argentina de vestuário de primeira linha Etiqueta Negra.
Ele e a esposa, a ex-modelo Lara Bernasconi, veraneavam nessa cidade repleta de butiques, restaurantes sofisticados e residências de milhões de dólares, onde argentinos famosos passam férias.
Segundo um assistente de Castillo, o casal não tinha comentário imediato e nenhuma acusação foi apresentada contra eles.
O vídeo logo gerou reações negativas, com críticas vindas de políticos de esquerda, do ministro das Relações Exteriores e de veganos, entre outros. Programas de televisão dedicaram horas ao debate, com o vídeo sendo pausado a cada quadro e veterinários tentando entender se foi um cordeiro morto ou um porco vivo que caiu.
Uma hashtag pedindo para as pessoas boicotarem produtos Etiqueta Negra viralizou no Twitter.
O incidente se encaixou em um ditado de décadas referente ao desperdício da elite: “Jogar manteiga no telhado.” A frase supostamente descreve as festas dos argentinos em Paris na década de 1920, quando a economia do país era uma das maiores do mundo, impulsionada por exportações de trigo, carne bovina e grãos.
A época atual é mais sóbria e rigorosa. Autoridades uruguaias abriram uma investigação depois que vizinhos reclamaram da carne que caiu do céu. No Uruguai, onde os milionários do continente guardam dinheiro e se divertem, é proibido atirar objetos de aeronaves.
Castillo se recusou a revelar quem atirou o cordeiro ou o motivo disso, mas admitiu que ele e sua família retiraram o corpo da piscina e colocaram na grelha, de acordo com o porta-voz da promotoria, Daniel Baubet.
Investigadores estão tentando encontrar o helicóptero.
Bernasconi telefonou para a produção de um programa de televisão na Argentina para dizer que não tinha ideia de quem encomendou o sobrevoo.
“Só tenho a dizer que jogaram um cordeiro morto na nossa piscina”, disse ela.
A promotora encarregada do caso, Ana Dean, está convencida de que o casal sabe quem jogou o cordeiro, segundo um oficial do tribunal que não tem autorização para ser identificado na imprensa. Segundo essa pessoa, ninguém comeria um cordeiro sem conhecer sua procedência.
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