Rastreadores em sites opõem investigadores e ativistas da privacidade

Pesquisadores e especialistas em tecnologias digitais divergiram hoje no Fórum da Internet no Brasil (FIB) sobre o uso dos chamados ✅cookies, que são pequenos ‘pedaços de código’ que registram dados da navegação das pessoas, tais como números de IP, se o aparelho é um celular ou um computador de mesa, as configurações do navegador e a localização da pessoa. O FIB é o maior evento sobre Internet do país e ocorre em Goiânia até amanhã (7).

Esse tipo de tecnologia é utilizada, em geral, por agências de ✅marketing digital para que os anúncios “sigam” os usuários pelos ✅sites nos quais navegam. Nesses casos, o usuário pode apagar os ✅cookies instalados. Cada navegador oferece essa funcionalidade em determinado local de suas configurações. Mas também pode ser adotada por governos quando cidadãos visitam seus ✅sites, como os poderosos ✅cookies que a agência de inteligência dos Estados Unidos, a CIA, instalava nos computadores de quem visitava sua página.

No debate sobre o tema realizado no Fórum hoje (6), a avaliação sobre o uso desses recursos técnicos opôs defensores de práticas de vigilância para combate a crimes no ambiente ✅online, de um lado, e pesquisadores e ativistas preocupados com riscos à privacidade e à proteção de dados, do outro.

O perito em crimes cibernéticos Wanderson Castilho defendeu o uso dos ✅cookies como um recurso necessário para investigar e prevenir esse tipo de delito. Ele relatou casos em que o monitoramento por essas tecnologias auxiliou forças de segurança a chegar a pessoas que preparavam atentados terroristas. Para Castilho, esse tipo de possibilidade justificaria a coleta massiva de informações realizada por ✅cookies.

“O problema não está somente na coleta, mas no uso dela. Do ponto de vista de investigação, ela é necessária. Essas troca de arquivos é importante para a sua navegação. Da mesma forma como as empresas acabam sabendo tudo de vocês, na investigação queremos obter essa informação. Acabamos invadindo privacidade sim, para saber se você está cometendo delito. A nossa sociedade vai ficar mais segura a partir do momento em que você consegue prever, antecipar ataques terroristas”, comentou.

Privacidade

Laura Tresca, diretora-executiva da ONG Artigo XIX, que promove a liberdade de expressão e o acesso à informação, questionou o uso de ✅cookies. Ela citou o fato de que a prática já está bastante disseminada, com mecanismos permanentes e até com ✅cookies zumbi, que são reinstalados nos computadores mesmo após o usuário apagá-los. Laura citou uma pesquisa realizada pelo jornal norte-americano ✅Wall Street Journal, que mostrou que os 50 ✅sites mais populares do país instalavam, em média, 64 cookies por página, resultando em mais de 3 mil arquivos com informação do usuário.

“Segurança muitas vezes é uma desculpa para implementar medidas violadoras de direitos fundamentais como liberdade de expressão e privacidade. Existe Estado de Direito e os direitos fundamentais devem ser sempre observados. Não existe vigilância arbitrária porque pode ser que alguém vá cometer algum crime. Isso é perigoso, principalmente quando alguém está ameaçado. Hoje eu não sou considerado criminoso, mas no futuro uma organização de defesa de direitos pode ser considerada terrorista”, alertou.

O promotor do Ministério Público de Minas Gerais Lelio Calhau destacou que o tema é novo e não tem ainda decisões e jurisprudências consolidadas nos tribunais superiores. Em um cenário em que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, aprovada neste ano, ainda não está em vigor (o que ocorrerá somente em fevereiro de 2023), ele afirmou que o uso de ✅cookies, apesar da legalidade, pode ser enquadrado como abuso de direito em determinadas situações. Calhau citou como exemplo o fato desses mecanismos guardarem dados de pagamentos.

“Guardar código de segurança do cartão de crédito é ato totalmente abusivo. Quando o usuário dá anuência, em momento algum ele tem noção de que seu cartão e o código serão usados. São atos que cabem indenizações, tanto ilícitos quanto lícitos onde há abuso de direitos. Não é necessário pra navegação”, argumentou.

Discriminação comercial

O empresário Washington Almedia Jr., que atua com perícia e recuperação de dados, lembrou que os problemas do uso dos ✅cookies vão além das questões de segurança e vigilância. O processamento dessas informações do usuário por empresas permite um conhecimento que abre espaço para a oferta de bens e serviços de forma discriminatória.

“O plano de saúde tem acesso a informações minhas com relação aos remédios e médicos pra dificultar acesso meu ou colocar custo elevado, isso eu acho que tem que ser reavaliado. O dado precisa ser tratado de forma não tendenciosa. Não é esperado que as informações sejam tratadas pra analisar meu comportamento, pra tirar proveito financeiro pelas empresas”, defendeu.

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