Jamil Civitarese: Moedas Com Taxa Zero: Quais os Desafios?
💥️Por Jamil Civitarese/ysoke.com
Ao trabalhar com a modelagem de hash rate em uma pesquisa, me deparei com a seguinte questão: criptoativos que são meios de pagamento tendem a ser algo prejudicados pela volatilidade. Nós, seres humanos, não gostamos da ideia de pagar preços distintos frequentemente pelo mesmo serviço: um exemplo claro é uma certa irritação com preços dinâmicos da Uber em momentos inesperados. Nosso comportamento termina por explicar algumas questões importantes sobre o design de criptomoedas. Nesse texto, tentarei focar num elemento simples das criptomoedas, suas taxas de transação, e como mesmo comparativamente baixas elas podem ainda ser uma barreira para o crescimento da criptoeconomia.
Primeiro, por que taxas? O bitcoin, primeira criptomoeda, financia os mineradores que mantem a rede de duas formas. A primeira é a emissão de novos bitcoins. Essa emissão irá se reduzindo lentamente até 2140, quando a quantidade de bitcoins emitidas será 21.000.000. Diversas moedas possuem limites similares, sendo essa fonte finita. A segunda é o pagamento de fees para os mineradores. Essas taxas são o resultado das interações econômicas entre os mineradores e os usuários. Há pesquisas interessantíssimas elucidando essa dinâmica de fees, todas mostrando que a existência de preço é sustentável em termos de teoria dos jogos. Isso é ótimo, pois a longuíssimo prazo a rede do Bitcoin deverá depender de fees.
Porém, percebe-se que há certo descompasso entre ser um bom meio de pagamento e taxas variáveis. As razões para Satoshi Nakamoto, pessoa ou grupo anônimo que criou o Bitcoin, não se importarem com isso podem ser muitas: apostar no Bitcoin como numerário aceito entre a população, algoritmos que estabilizem transações, acreditar na redução da volatilidade, entre outros. Contudo, pesquisas recentes sugerem que essa grande volatilidade é parcialmente fruto da própria estrutura de blockchain. Se houver essa tendência de fato, é possível dizer que um desafio para a adoção em massa será a estabilização de taxas de utilização. É fácil perceber que essa argumentação também vale para utility tokens.
Tendo isso em vista, há três potenciais soluções. A primeira seria tentar reformar a maneira que preços se formam em criptoativos. O Ethereum tem buscado essa solução para seus preços de gas em ether. Entretanto, isso não resolve a própria volatilidade do Ethereum e a questão é algo negligenciada. A segunda solução seria um novo algoritmo de consenso que não incentive saltos na volatilidade. Há propostas nessa direção, mas ainda sem grande relevância prática.
A terceira solução é a única frequentemente tentada: criar uma criptomoeda com design escalável e zero-fee, não necessariamente pensando no consenso ótimo. Essa é a proposta da IOTA e muitas outras criptomoedas. Com zero-fees, a volatilidade atingiria apenas os mantenedores da rede (mineradores, whales com stake e similares), não os consumidores. Esses players maiores têm menor aversão ao risco de acordo com essa pesquisa e maiores oportunidades/incentivos para acessar mercados futuros do token. Nisso haveria um certo equilíbrio sustentável. Dessa maneira, há o desafio de garantir as zero-fees usando proof-of-work ou proof-of-stake e que isso não gere spam ou grandes filas de transações. A questão é: tanto PoW e PoS são incentivados pela expectativa de revenda da criptomoeda minerada/recebida a um determinado preço. Se não há fees, é necessário sempre incentivar a criptomoeda via inflação de tokens. De certa maneira, ser deflacionário (como o ouro) é algo que atrai investidores e mineradores por facilitar que o ativo seja uma reserva de valor. A taxa de inflação em si não garante o equilíbrio, o preço tem papel fundamental. Se assumimos que quanto maior a inflação, menor o preço, temos um problema. Talvez essas moedas não incentivem a própria mineração de maneira efetiva.
Há um desafio de ordem econômica, portanto. Estudos de caso se fazem importantes para compreender a viabilidade de uma reserva de valor cuja emissão não é limitada. O Ethereum possui uma emissão menos restritiva que o Bitcoin e no chamado “the flippening” quase assumiu o primeiro lugar em capitalização de mercado. Entretanto, seu token tinha uma função clara: pagar gas, ou seja, fees. Essas taxas movimentam a criptoeconomia, de certa maneira. Em resumo, para haver uma criptomoeda de fato amigável a consumidores, há uma necessidade de engenharia econômica tão grande quanto a parte técnica no curto prazo. Não há muita discussão nessas linhas por enquanto na comunidade de criptoativos, mas creio que os projetos que resolverem esses problemas podem vir a ter maior futuro que os demais.
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