Capitalização na nova Previdência: comparando Brasil e Chile

💥️Por Victor Oliveira, Mestrando em Instituições, Organizações e Trabalho na UFSCar, para o Terraço Economico.

Com a apresentação da PEC 6/2019, que trata da Reforma da Previdência, pelo governo Bolsonaro iniciou-se um debate intenso a respeito dos itens contidos na proposta. Uma das questões diz respeito à adoção do sistema de capitalização, em substituição ao atual sistema de repartição. Para variar, há muita desinformação e alarmismo, sobretudo daqueles contrários à Reforma da Previdência, em torno do tema.

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O artigo 201 da PEC diz que, um Projeto de Lei Complementar, de iniciativa do Executivo Federal irá dispor sobre a criação de um novo regime de Previdência Social, baseado no sistema de Capitalização Individual, para trabalhadores que ingressarem no mercado de trabalho após sua implementação.

Ou seja, a PEC não cria automaticamente um regime alternativo de Previdência, mas apenas uma disposição transitória, até que o governo apresente um Projeto de Lei, que será novamente debatido no Congresso Nacional, seguindo todos os trâmites legislativos e sem haver data para tal envio. Enquanto isso, o único sistema presente no país será o já existente na atualidade.

O pânico criado em torno da Capitalização vem de uma comparação com o nosso vizinho Chile, que adotou o sistema em 1981, em meio à ditadura de Augusto Pinochet. Os chilenos trocaram o sistema público de aposentadoria pelo privado, de capitalização individual, no qual cada trabalhador deposita ao menos 10% do seu salário e pode se aposentar aos 65 anos (se homem) ou 60 anos (se mulher). Não há contribuições do empregador ou do governo, fazendo com que o benefício fique abaixo do salário mínimo do país para 90% dos aposentados, de acordo com dados da Superintendência de Pensões do governo chileno.

Porém, uma pergunta fundamental e que responde também às inquietações dos preocupados com a possível mudança no regime é: quanto custou ao Chile, em termos fiscais, fazer essa mudança?

De acordo com estudo de Alberto Arenas de Mesa, que foi Ministro da Fazenda chileno entre 2014 e 2015, o déficit previdenciário chileno passou de 3,8% do PIB em 1981, para 6,4% em 1982 e seguiu acima de 5% do PIB nos 20 anos seguintes. No mesmo período, segundo o autor, o Chile conseguiu compensar essa perda com uma rigorosa disciplina nos demais gastos do governo central, que geraram uma economia média de 8,5% do PIB.

É exatamente o oposto do que pretende e necessita fazer o governo brasileiro. No ano passado, o governo federal (excluindo o Regime Geral de Previdência Social), teve um superávit de R$ 77 bilhões, enquanto o déficit previdenciário foi de R$ 198 bilhões, de acordo com o Tesouro Nacional. Os gastos previdenciários estão comprimindo cada vez mais as demais despesas do governo, e impedindo a realização de investimentos e a manutenção satisfatória dos serviços públicos. A proposta apresentada pela equipe de Paulo Guedes visa justamente frear o crescimento dos gastos previdenciários, para liberar espaço no orçamento ao crescimento de despesas essenciais.

Se o sistema de capitalização fosse introduzido agora, haveria, como no caso Chileno, um aumento no déficit previdenciário, e todo o esforço em tornar o atual sistema de repartição sustentável e organizar as contas públicas seria em vão. As demais despesas teriam de ser ainda mais comprimidas para pagar os custos de transição entre os regimes. Muito provavelmente, um sistema de capitalização não será introduzido no governo Bolsonaro, visto que demandaria uma situação fiscal extremamente confortável para tal mudança.

A hipótese mais plausível seria a adoção de um sistema misto, como proposto por Paulo Tafner e outros especialistas, no qual a capitalização seria um dos pilares, mantendo o sistema de repartição. Neste caso, a capitalização individual corresponderia a, no máximo, 30% do valor do benefício de aposentadoria no futuro.

Não faz sentido, portanto, inutilizar a PEC apresentada pelo governo apenas pelo artigo 201. Nossa situação é completamente distinta daquela que o Chile ostentava quando fez a mudança em seu sistema, não havendo possibilidade no curto/médio-prazo de fazer a transição para o sistema de capitalização individual puro. Dizer, a partir do artigo 201, que a Reforma da Previdência tem o único propósito de aumentar lucros de bancos e instituições privadas não passa de uma falsa narrativa para amedrontar a população e bloquear o debate sobre os demais pontos do projeto.

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