Ele largou sucesso no mundo da moda para voltar a aldeia no Amazonas
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Foi assim que o estilista Sioduhi, indígena do povo pira-tapuya natural de uma aldeia no interior do Amazonas, estreou na 5ª edição do Brasil Eco Fashion Week, em 2023, com um fashion vídeo (espécie de desfile gravado por conta da pandemia). Mas foi em 2022 que os likes viraram aplausos.
No mundo dos brancos, que prioriza a linearidade do tempo, é possível dizer que aos 27 anos Sioduhi, o homem de porte mignon e cabelos lisos e escuros, que dá nome à marca, "chegou lá".
Quando menino, saiu da aldeia Mariwá, no Território Indígena do Alto Rio Negro, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM), ganhou fluência no português apenas aos 17 anos (sua primeira língua é tukano, idioma predominante dos povos indígenas daquela região), e se tornou um bem-sucedido artista na maior cidade da América Latina. E fim.
No entanto, Sioduhi não cai na armadilha da linearidade, uma vez que para os povos originários o tempo corre de forma circular. Na crença indígena, muitos eventos podem ser vividos em diversos momentos, de forma paralela.
Da metrópole para a aldeia
Por isso, ele não hesitou em decidir voltar ao Amazonas no início deste ano, após viver por 12 anos em São Paulo e de ter sido convidado a integrar o line-up da São Paulo Fashion Week, maior semana de moda da América Latina.
"Quando voltei por vinte dias para a minha aldeia percebi que precisava me reconectar. É preciso ter sabedoria para não se deslumbrar com o mundo do branco", disse em conversa a 💥️Ecoa o pira-tapuya, que só se reconheceu indígena entre os 23 e 24 anos.
✅É necessário entender o que é o meu tempo. Eu não posso adoecer por causa disso [correria imposta pela indústria da moda,] nem adoecer outras pessoas. Agora preciso me reconectar com as minhas raízes e meus ancestrais 💥️Sioduhi
Alta costura indígena
A história de Sioduhi é muito similar a de outros tantos indígenas que migraram da aldeia para a vida na cidade ainda quando adolescentes para estudar: sem dinheiro, sem emprego, sem contatos.
De forma sintética: morou em pensionato, depois na casa da família de um amigo que havia conhecido no Amazonas, cursou faculdade de administração. Mas foi no curso técnico de moda que encontrou sua vocação.💥️ "Foi então que descobri que fazer moda é muito elitista", relembra.
O contato com os ancestrais transpassa o místico. Produzir peças urbanas está muito mais relacionado com um tio, cujo ofício era ser alfaiate, do que com a vivência em São Paulo.
"💥️A alfaiataria é um dos maiores processos colonizadores que há. Então, por que não adaptar sob uma ótica indígena?", questiona o artista que continuamente pergunta para os "parentes" (forma como indígenas chamam outros indígenas) como se sentem e se identificam em relação às peças, além de dar descontos e, em alguns casos, cobrar apenas o frete.
Para conseguir se inserir no mercado, utilizou-se da internet para mostrar suas criações. Seus vídeos não chegaram a viralizar, mas caíram nas mãos - ou melhor, nas telas - de expoentes da moda como a estilista Flavia Aranha e o empresário Rafael Morais.
"O futuro é sustentável, por isso precisamos usar técnicas ancestrais" diz. O nome da coleção sintetiza bem este pêndulo entre cidade e aldeia: Manioqueen.Retorno às origens
💥️No momento, Sioduhi pretende entrar em um hiato. Voltará para a aldeia, se reconectará com os ancestrais e os parentes que ainda estão vivos. Mas isto não é sinônimo de descanso.
Paralelamente, finalizará as entregas da coleção Manioqueen que entrará nas rotas comerciais - uma loja em Manaus -, realizará workshops e, com ajuda de "parentes latino-americanos", expandirá a sua coleção para o Peru.
"O indígena nunca está só. Temos que estar conectados com nossas bases, nossos ancestrais", diz no meio da avenida Paulista. "Por exemplo, tive de pedir licença por estar aqui, por estar pisando em território guarani", relembrando que, apesar dos prédios, perfurações, estresses e perigos, a avenida mais famosa de São Paulo, no seu âmago, ainda possui alma indígena. Como todos brasileiros.
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