Beatriz Matos, viúva de
Em entrevista exclusiva à Mongabay, Beatriz conta de suas atribuições no cargo, fala da situação dos povos isolados e de recente contato no país e partilha memórias da sua parceria - pessoal e também de causa - com Bruno.
Aldeia de índigenas isolados no Acre💥️O que muda, na prática, no trabalho junto a esses povos, com a criação do Departamento de Proteção Territorial e de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato?
Na verdade, o que muda é a criação do Ministério. O Ministério dos Povos Indígenas coloca a questão indígena - e aí a questão dos isolados e dos de recente contato vai junto - no centro dos fóruns de decisão do país. Se tem uma reunião interministerial, você tem uma ministra indígena. Antes, essa pauta era repassada ao Ministério da Justiça, que é uma árvore com milhões de instituições. A Funai era mais uma. Agora, ela está em um centro de tomada de poder de decisão em um nível muito mais alto e de importância do que antes, que é como tem de estar.
Não se trata de uma questão subsidiária, uma questão pequena. É uma questão central no país, como a da igualdade racial. Isso muda completamente o lugar das pautas e dos indígenas na história do país. A gente está estruturando o ministério para que isso aconteça de fato. Está criado o espaço, agora precisamos fazê-lo acontecer concretamente. É isso que a ministra, as secretárias - que são mulheres indígenas em sua maioria -, pessoas de muito tempo de luta, que têm histórias com seus territórios, estão comprometidas a fazer.
💥️O que representa para você, na sua história com o Bruno, ocupar esse cargo?
É muito forte, porque se ele estivesse vivo talvez ocupasse esse cargo. Eu sinto que é uma continuidade do trabalho dele, porque a gente era parceiro, a gente trabalhava junto. A gente se conheceu lá no Javari. Quando eu tive os filhos — que eu tive dois meninos dele um atrás do outro, assim, foi meio na sequência —, era parceria. Ele ia para campo e eu ficava com as crianças. Ele voltava e a gente discutia o que ele viveu lá e eu falava com ele o que eu vivi antes, quando eu estava indo para campo.
A gente andava discutindo a minha volta, como seria o revezamento - já que os filhos estavam maiores, não acordavam a noite inteira, tinham desmamado. Daria, inclusive, para levar eles, a gente tem uma casa lá, né, então nosso sonho era ir para o Javari com os meninos. Os dois têm nomes de indígenas lá do Javari. A nossa ideia era ir lá na casa, ficar lá, como intervalo de campo, ir para as aldeias, voltar cada um para o seu trabalho, mas ter nossas férias para fazer isso, sabe, esse era o nosso plano de vida. Foi interrompido, mas é uma forma dele não morrer, né? Dar uma continuidade a isso. Eu estou sozinha mas eu estou com ele, e com nossos filhos.
E estou, também, com um monte de gente de quem ele se cercava, que trabalhava com ele, que respeitava ele, que tinha uma parceria muito profunda com ele, também dessa vivência no mato, na luta. Eu sinto que eu estou com muita gente, meio que representando essa história, esse trabalho, e é um trabalho que tem que ser feito, então também é uma alegria muito grande ter a oportunidade desse ministério estar acontecendo para a gente fazer um monte de coisas que a gente sempre quis fazer. Tem um pouco esse espírito.
Eu acredito que os indígenas que estão nesses cargos também estão com esse espírito. A gente tem um lugar agora que conquistamos e que a gente vai fazer valer. Vai fazer o que a gente quer fazer. Tem muito desse espírito aqui no ministério, isso é muito bonito. É muito trabalho, são muitos desafios, claro, ainda não tem orçamento próprio, a gente está estruturando, tem todas essas questões... É um ministério novo, mas é muita força de trabalho e muita vontade. E muita gente de luta. O pessoal é aguerrido, não está de brincadeira não.
✅Notícias da Floresta é uma coluna que traz reportagens sobre sustentabilidade e meio ambiente produzidas pela agência de notícias Mongabay, publicadas semanalmente em 💥️Ecoa. Esta reportagem foi originalmente publicada no site da Mongabay Brasil.
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