Sexta Santa: Quem seria Jesus se ele ressuscitasse hoje no Brasil?
Ele não seria branco. Também não teria no olhar o tom das águas dos oceanos, nem estaria trajado de vestes tons terrosos. Com a mesma simplicidade que a História conta, seria, por sua vez, simples. Mas ainda mais marcado pela desigualdade que assola, movimenta e engaja nosso país, fruto da desigualdade que traria a chaga aberta em seu corpo negro, exposta ao andar sem camisa pelas ruas. Profetizando e sendo visto, muitas vezes, como?louco?
Talvez teria que trabalhar dobrado na defesa daqueles pelos quais morreu. Pudera, já que um dos motivos, além da desconfiança em ser aquele o novo "Messias", era justamente a missão que trazia e colocava em prática: ser quem estava ao lado dos pobres.
"Dar de beber a quem tem sede", como a escritura sagrada diz em Mateus, talvez agora seria ressignificada pela urgência. "Tem gente com fome", diria o certo Messias, enquanto se deslocaria aos morros e todas as terras que não tem chão. Será que seria visto como comunista?
Ao defender os direitos humanos, Jesus, se brasileiro fosse, teria como desafio maior propagar a palavra. Encontraria, entre tantas batalhas, a colocação em xeque de suas mensagens.
Talvez nem chegasse a viver. Por persistir na missão, será que também seria morto a tiros junto a seu motorista, em pleno centro da cidade, numa noite de quarta-feira, na volta para casa? Ou, então, estaria desaparecido na Amazônia por defender o meio ambiente e os povos da floresta?
Na Santa Ceia, não entraria na elite. Fugiria do Leblon e da Faria Lima. Seria possível encontrá-lo na região da Luz, em São Paulo, ou mesmo na Lapa, no Rio de Janeiro, ou qualquer canto que merece - e deve - tê-lo presente. Não seriam 12, tampouco 13 os sentados em sua mesa. Teria fartura, o pão sendo multiplicado, se desdobrando nas mais diversas formas de alimentos. "Não só de pão vive o homem", enfatizava.
No Cristo imolado hoje, a possibilidade cristã da renovação do ciclo, como todos conhecemos.
Será que o Jesus brasileiro ressuscitaria? Será que o deixariam? Poderia sofrer com a violência do Estado que amordaça, ou acabar preso injustamente.
A bem da verdade, Jesus brasileiro talvez nem chegasse a nascer. Ou mesmo nascendo, seria impactado pelo cotidiano que torna da rotina Via Crucis diária por quem vive em nosso "pa-tro-pi".
Triste pela falta de esperança, ao ver as crianças assustadas frente a ação da polícia numa escola, local que acumula casos de mortes.
Desamparado pelo crescimento da pobreza, sua causa maior, e o que dela se desdobra. Aflito pela insegurança que torna mulheres, trans, LGBTQUIA+, vítimas a cada segundo.
Jesus, se brasileiro, talvez desgostasse da ideia de retorno. "Pra quê? Tudo de novo". Mas ainda assim, o faria. Afinal, a História não morre, o recomeço se dá na mágica do que já se sabe.
Na Fé que mobiliza quem crê e não crê, que a verdade se imponha: o menino Jesus somos nós, a cada instante. Resta saber se queremos lutar as mesmas lutas daquele que foi crucificado, morto e sepultado. E que no sábado, encarna para sua nova vida.
E aí? Topa ser Jesus, brasileiro?
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