Há prazer em ver a infelicidade dos milionários antiéticos

Há prazer em ver a infelicidade dos milionários antiéticos e trapaceiros
O elenco de Succession - Divulgação/HBO

só para assinantes

Natalia Timerman

Cadastrar

Tenho uma sensação parecida ao assistir a séries como "Succession" e "The White Lotus".

Não estou falando dos roteiros, das atuações, da câmera que treme e tensiona, dos plot twists que, de tão esperados, não chegam a dar tantas voltas assim. Falo da riqueza. Do exagero que ao mesmo tempo incomoda e apraz, e parte do incômodo se dá pelo próprio fato do prazer, um de mãos dadas com o outro. Incômodo e prazer amalgamados: o verdadeiro significado do gozo.

Sim, há prazer em assistir aos super ricos se esbaldando, voando de helicóptero, torrando milhares de euros com prostitutas nas férias, há prazer de ver o exagero ou a assepsia elegante das roupas, os detalhes, o luxo, o dinheiro exercendo seu poder.

Não se trata apenas do prazer em se deparar com personagens maravilhosamente horríveis, trapaceiros, antiéticos, abusivos, nem do gozo diante da infelicidade deles, que ofereceria o alento moral de a riqueza não trazer, enfim, felicidade. Isso vovó já nos dizia contando histórias para dormir.

Trata-se de um prazer que a doença e a morte dos personagens até agudiza, porque com ele contrasta: pois doença e morte são o esfacelamento total da segurança, a farsa nossa de cada dia. Aquela riqueza toda esfregada na nossa cara tem como pano de fundo, como pressuposto, como fundamento a ideia (equivocada) de que aquilo tudo só existe porque existe segurança no mundo. Ou, formulando melhor: se há alguma segurança no mundo, é ali que ela está.

As melhores casas, roupas, comidas, festas: o destino de toda a exploração do planeta, de toda a pobreza, a convergência de milhares de hectares e séculos de horror, encontraria uma vergonhosa justificativa naquele nosso ínfimo prazer. Tudo bem, o diabo sussurra em nossos ouvidos. Está tudo bem, mundo cruel, porque há alguém que se regozija e se esbalda.

O prazer de que a riqueza exista como mera possibilidade. Mesmo que não seja nem nunca vá ser nossa.

O que você está lendo é [Há prazer em ver a infelicidade dos milionários antiéticos].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.

Wonderful comments

    Login You can publish only after logging in...