Quem é a brasileira que ajuda outras brasileiras a abortarem na Argentina

Quem é a brasileira que ajuda outras brasileiras a abortarem na Argentina
Edna Bayerlein mora na Argentina, onde recebe brasileiras que querem abortar - Acervo pessoal

Essas mulheres começaram a chegar à clínica onde Edna trabalha no final de 2023, por meio de uma ONG chamada Milhas Pela Vida das Mulheres. A organização, criada pela cineasta Juliana Reis em 2023, acolhia e dava assistência, especialmente financeira, a mulheres que precisavam realizar a interrupção de uma gravidez primeiramente na Colômbia, depois na Argentina e México, levantando fundos para que as viagens até esses países fossem realizadas.

A organização não realiza mais essa assistência hoje em dia e voltou sua atenção para o debate sobre a legalização do aborto no Brasil. "Ao invés da solução individual, passamos a incitar o debate sobre o aborto legal aqui para garantir que as mulheres acessem seus direitos fundamentais", diz Juliana.

Abortos custam de R$ 2,6 mil a R$ 5,3 mil

Mas arcar com os custos para realizar na Argentina um procedimento considerado ilegal no Brasil não consiste somente na viagem e hospedagem. O valor para fazer a interrupção na clínica onde Edna trabalha varia de US$ 500 a US$ 1.000 (cerca de R$ 2.630 a R$ 5.260, na atual cotação), dependendo do tempo de gestação. Edna recebe uma comissão por cada mulher que chega à clínica por ela.

O valor mínimo do procedimento —equivalente à renda média mensal do trabalhador brasileiro, R$ 2.652, segundo o IBGE no ano passado— faz com que o acesso a um aborto seguro não seja só uma questão de legalidade ou não, mas também de condição econômica. Por isso, Edna conta, os casos são analisados individualmente. "Uma vez parcelei o pagamento de uma mulher, disse para ela me pagar a segunda parcela quando pudesse, fiquei sem comissão", diz.

"Temos que cobrar um mínimo para cobrir os custos do material usado. Não somos uma ONG, mas somos pessoas, fazemos o possível. Só não conseguimos bancar a viagem até aqui."

Das ruas para o Congresso

A legalização do aborto foi aprovada no Senado argentino no dia 30 dezembro de 2023. Em uma madrugada histórica, o país vizinho juntou-se a Cuba e ao Uruguai entre os latino-americanos onde a interrupção da gravidez é legal.

Desde então, a chamada Interrupção Voluntária da Gravidez (IVE, nas siglas em espanhol) passou a ser autorizada até a 14ª semana de gestação, sem que a mulher precise explicar as razões pelas quais decidiu realizar a interrupção. Após esse período, o procedimento pode ser realizado em casos de estupro ou de risco para a vida e saúde da gestante, na chamada Interrupção Legal da Gravidez (ILE, na sigla em espanhol), que já era legalizado.

O procedimento é realizado por clínicas particulares e pelo sistema público de saúde da Argentina.

Para Edna, essa conquista é atribuída integralmente às mulheres do país, que foram às ruas reivindicar o direito. "Não veio de cima para baixo", diz. "Não é uma questão de vontade política, é uma questão de vontade do povo".

Talvez por isso, nem ela nem a clínica foram alvos de ataques de nenhuma natureza. "Chegamos a ter medo de expor o nome da clínica na porta, mas colocamos e nunca sofremos nenhum ataque. Aqui, a cabeça das pessoas é diferente".

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