Saberes ancestrais e cultura digital
A cultura digital é um campo de estudos e práticas que busca compreender e transformar as relações entre as tecnologias digitais e a sociedade. Nesse sentido, ela envolve aspectos como comunicação, informação, participação, criação, educação, entretenimento, cidadania e direitos humanos. Mas será que a cultura digital também pode dialogar com os saberes ancestrais, aqueles que são transmitidos de geração em geração por povos indígenas, quilombolas, caiçaras, curandeiras e outros grupos que mantêm vivas as tradições e as cosmovisões de seus antepassados?
Essa é a proposta da 1ª Conferência Temática da Cultura Digital, que acontece até o dia 26 de janeiro, de forma online e gratuita, com transmissão pela TV Tainã. O evento é uma preparação para a 4ª Conferência Nacional de Cultura, que será realizada em junho deste ano, e tem como tema ‘PermaCultura Digital: começo, meio e começo’. A ideia é organizar um debate sobre a cultura digital que integre o Caderno da 4ª Conferência Nacional de Cultura, um documento que orientará as políticas públicas para o setor nos próximos anos. Três propostas serão escolhidas para serem apresentadas na conferência nacional e as mais votadas serão incluídas no Plano Nacional de Cultura.
A conferência temática é promovida pela Rede da Cultura Digital Brasileira, uma articulação de mais de 20 coletivos, organizações e movimentos que atuam na área da cultura digital no país, coordenados pelo Ministério da Cultura (MinC) e pelo Laboratório de Cultura Digital da UFPR. O evento pretende reunir o público interessado em debater as principais questões da cultura digital no Brasil, como tecnologias de participação social, mapeamento e gestão da cultura, produção de indicadores, direitos autorais, pontos e pontões de cultura, redes de streaming nacionais, entre outros.
O tema principal foi proposto pela Rede de Produtoras Colaborativas, um conjunto de iniciativas que promovem a produção audiovisual comunitária e a democratização da comunicação. Segundo Fabs Balvedi, integrante da Rede, a PermaCultura é a sistematização de saberes ancestrais para a permanência de todas as formas de vida na Terra. “Entendemos que esse conhecimento, como proposta ética e metafórica para essa nova onda da cultura digital, tem uma grande potência”, afirma. Já o ‘começo, meio e fim’, aspas do mestre quilombola Nego Bispo, chega para somar ao movimento a ênfase contra colonial e ancestral que rege a cultura digital, nessa confluência entre tradições e transgressões que as tecnologias digitais podem promover.
Para João Paulo Mehl, coordenador executivo do Laboratório de Cultura Digital da UFPR, o Estado Permanente de Conferência é a grande inovação que o movimento da cultura digital brasileira traz para o processo da Conferência Nacional de Cultura. “O propósito é de arriscar um modelo de participação social radicalizado a serviço da inteligência coletiva do povo brasileiro”, explica. Ele destaca que a conferência temática é resultado de um processo colaborativo, onde foram coletadas 51 propostas para o tema central e sete mesas temáticas que serão realizadas ao longo dos três dias do evento. As ideias que não foram selecionadas para esta reunião serão incorporadas ao debate comunitário e o processo de participação será reaberto logo após o término do evento.
A conferência temática conta com a participação de convidados especiais, como o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, o ativista indígena Ailton Krenak, a educadora popular Maria do Rosário de Carvalho, o rapper GOG, a escritora Conceição Evaristo, o cineasta Joel Zito Araújo, a jornalista Eliane Brum, o filósofo Pablo Capilé, entre outros.
A conferência é uma oportunidade para ampliar o debate sobre a cultura digital no Brasil, reconhecendo sua diversidade, sua potência e seus desafios. É também uma forma de valorizar os saberes ancestrais, que podem contribuir para a construção de uma sociedade mais justa, solidária e sustentável. Como diz o manifesto da conferência, ‘a cultura digital é um campo de possibilidades, um espaço de encontro, um lugar de aprendizado, um tempo de transformação’.
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