Gordofobia na moda: ausência de diversidade escancara preconceitos
As influenciadores Letticia Munniz e Robertita, a estilista Isa e stylist Salisa Barbosa falam sobre gordofobia na moda — Foto: Reprodução/Instagram/Arquivo pessoal
“A grama do vizinho é sempre mais verde”, é essa a impressão que se tem sobre tudo na vida, quando visto de longe. De perto, a realidade das falas a seguir vai mostrar que a tal da diversidade na moda ainda precisa desfilar com o look mais gritante para se fazer vista.
De acordo com uma pesquisa da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), publicada em julho de 2022, 💥️85% das pessoas obesas já sofreram gordofobia no Brasil.
De certa forma, o universo da moda tem papel importante nesta engrenagem opressora e, por mais que avanços sejam apresentados, para quem vive o preconceito na pele a história é outra, como é o caso da estilista 💥️Isa, da grife Isaac Silva, as influenciadoras 💥️Letticia Muniz e 💥️Robertita e a stylist 💥️Salisa Barbosa.
💥️Letticia foi figurinha carimbada em vários desfiles da SPFW, que aconteceu em novembro de 2022. Ela afirma que essa falsa sensação de maior diversidade nas passarelas é gerada por se tratar de um assunto novo, apesar de que “os nossos corpos existem desde sempre”, explica, e, portanto, “nunca houve a não necessidade de se fazer moda para além do pequeno”.
2 de 6 Letticia Munniz no desfile da Misci no SPFW — Foto: AgNewsLetticia Munniz no desfile da Misci no SPFW — Foto: AgNews
Para Robertita, este é um tema que precisa sair do campo das ideias e das frases de efeito que geram engajamento na internet. Sobre o progresso que vemos nas passarelas, ela elogia, mas com ressalvas:
A marca brasileira Isaac Silva, comandada por Isa, já nasceu tendo como um dos pilares a inclusão de corpos fora do padrão de beleza estabelecido pela sociedade, então, para ela “o mundo da moda hoje só vai existir se falar sobre diversidade”, porque “o que as pessoas pedem é se ‘eu não me vejo, eu não compro’. Existe um levante muito grande, principalmente do consumidor final, para se ver nas campanhas [de publicidade]”.
Formada em moda em 2004, Salisa não ouvia, na época, se falar tanto em diversidade de gênero, racial e de corpos na moda: “As referências eram corpos magros para vestir uma parte da sociedade, e a influência das revistas e passarelas impactou na minha imagem como profissional de moda”. Depois de 20 anos, ela vê um avanço e “o que via e vivia já não cabe mais no tempo de hoje”, afirma.
Acompanhando as últimas fashion weeks internacionais, Robertita e Letticia veem um cenário ainda pior. A primeira questiona a indústria quanto a dificuldade de ver pessoas gordas como consumidoras.
3 de 6 Robertita posa durante Semana de Moda de Paris — Foto: Reprodução/Instagram
Robertita posa durante Semana de Moda de Paris — Foto: Reprodução/Instagram
Sem querer, quem responde à pergunta é a própria Letticia, que também critica a pouca aparição de modelos plus size e, raramente, com os looks de destaque da coleção.
É unânime entre os entrevistados: ao entrar na loja, uma pessoa não quer ser direcionada ao setor que, geralmente, é um departamento bem menor, nos corredores do fundo e tratado como “especial”. Para o grupo, o justo – para não dizer óbvio –, seria poder escolher entre qualquer peça da marca: “Temos que fazer uma moda que seja plural, que atenda ao desejo das pessoas”, defende Isa.
Letticia também levanta a questão da oferta de roupas que, para ela, estão sempre tentando esconder o corpo: “Não trazem sensualidade, não trazem tudo o que as pessoas estão usando, é sempre aquela moda do florido, do largo, do tricô e do camisetão”.
Para a estilista da Isaac Silva, existe uma falta de humanização ao desenvolver as peças, o que vai de encontro com o trabalho de Salisa. Como stylist, ela afirma que seu papel é, “acima de tudo respeitar o estilo de cada pessoa, [...] é trazer um novo olhar sobre possibilidades que até então não eram vistas ou aceitas.”
4 de 6 Isa, a frente da Isaac Sivla, tem como um de seus pilares a inclusão de corpos reais em suas coleções — Foto: Reprodução/InstagramIsa, a frente da Isaac Sivla, tem como um de seus pilares a inclusão de corpos reais em suas coleções — Foto: Reprodução/Instagram
A outra grave falha está na comunicação da empresa com o público. Em uma sociedade que só vê a magreza como modelo, ao se deparar com campanhas estreladas por pessoas gordas, presume-se que se trata de uma coleção plus size, e não para qualquer tipo de corpo.
Letticia acredita que esse pensamento, de que o corpo gordo seja uma coisa ruim, influencia em como as próprias marcas se posicionam: “É como se falassem ‘você não quer ter esse corpo aqui que é o certo? Então você vai ter que ir ali no fundo da loja ver as roupas sem graça que a gente fez’. É como se fizessem questão de perpetuar essa exclusão para que a gente continue se sentindo excluído”.
No caso das grifes de luxo, essa invisibilidade fica ainda mais gritante. Ao mesmo tempo em que muitas defender uma moda consciente, poucas oferecem numerações maiores. Acontece que todo mundo precisa de roupas para vestir e o acaba sendo o caminho mais viável para muita gente, contribuindo para o sucesso de uma produção massiva de roupas – feitas, em alguns casos, por mão de obra escrava.
No entanto, Salisa pondera ao falar desse consumismo em excesso: “Ignorar questões sociais, raciais e, simplesmente, condenar o consumo de fast fashion não é o caminho. É urgente que as marcas ampliem suas grades com responsabilidade e diversidade.”
5 de 6 A stylist Salisa Barbosa fala sobre a importância da diversidade de corpos na moda — Foto: Arquivo PessoalA stylist Salisa Barbosa fala sobre a importância da diversidade de corpos na moda — Foto: Arquivo Pessoal
Dica: não é apenas falando sobre o assunto na internet, como já disse Letticia anteriormente. Para Isa, é preciso saber olhar para o Brasil, entender suas necessidades e parar de tratar o como tendência: “O mundo precisa dessa mudança, é uma necessidade humana falar de diversidade. E existe uma falta de interesse em estudar o país e tem o fast fashion, que acaba alçando essa parte do mercado”
“É preciso uma mudança estrutural”, opina Letticia, “que não coloque a gente nesse lugar em que as pessoas se sentem no direito de estarem a todo tempo julgando o nosso corpo”. Ela também cobra uma virada de chave das grandes empresas brasileiras, para que desfiles como a de Isaac Silva e Meninos Rei, que teve Thais Carla e 💥️Jojo Todynho na passarela, não sejam mais raridades na moda.
Robertita diz que a “aceitação, o empoderamento e o autoamor são consequências do respeito, consciência e autopreservação”, e são essas mudanças que ela espera ver no futuro, mas aqui “futuro” não é sinônimo de anos, mas sim de amanhã!
Ao mesmo tempo, como se estivesse em uma sala de espera infinita, ela também torce para que programas opressores de sejam atualizados: “As dinâmicas, as lógicas e os padrões estão enferrujados. Isso é desproporcional, constrangedor e inadequado, então eu espero ver novos tons, novos espaços, novas possibilidades, novas tecnologias, novos rostos.”
6 de 6 Thais Carla e Jojo Todynho apresentam coleções da Meninos Rei — Foto: SPFW/Divulgação/Reprodução/InstagramThais Carla e Jojo Todynho apresentam coleções da Meninos Rei — Foto: SPFW/Divulgação/Reprodução/Instagram
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