Silvio Santos foi o terror e a alegria das agências de propaganda

O Grupo Silvio Santos usa o próprio SBT para fazer propaganda das suas empresas. É uma emissora a serviço de um conglomerado de companhias, que vão dos cosméticos aos títulos de capitalização. Mas a maior marca do grupo sempre foi o próprio dono, empresário, apresentador e garoto-propaganda: Silvio Santos, morto neste sábado (17) aos 93 anos.

Nascido Senor Abravanel, no Rio de Janeiro, Silvio começou a vida como camelô e tornou-se bilionário, fazendo uma história digna da "jornada do herói", ressaltada nas obras do escritor e mitólogo americano Joseph Campbell.

Talvez essa trajetória já o fizesse um marketeiro por excelência, capaz de algumas excentricidades que acabaram sendo aceitas pelo mercado publicitário. "Silvio é obviamente uma figura icônica da televisão, mas ele é muito simbólico também para o universo dos negócios do marketing, da publicidade e da comunicação como um todo", diz Roberta Iahn, professora e coordenadora-adjunta do curso de Comunicação e Publicidade da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

"Ele desbravou o mercado, junto com outras figuras como Walter Clark e José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni", diz ela, referindo-se a dois ex-diretores gerais da TV Globo. "São personagens que inventaram o modelo comercial e de entretenimento da TV, que negociaram com todo o setor, ao entenderem que só iriam sobreviver se tudo funcionasse junto –o veículo de comunicação e seus programas, a agência de propaganda e seus anunciantes."

Mas enquanto a Globo foi em busca do seu "padrão de qualidade", o SBT, criado em 1981, era imprevisível e arrojado como o dono. "Silvio foi super criticado em muitos momentos, quando colocava um programa no ar, por exemplo, e achava que não tinha que ser naquele horário. Do nada, ele tirava o programa e colocava outro no lugar. O mercado publicitário ficava louco com isso", diz Roberta, que nos anos 1990 trabalhou na agência de publicidade Archote.

Esse tipo de comportamento trazia insegurança para o mercado anunciante, que planeja meticulosamente cada inserção publicitária. "Não dava para saber qual público veria o anúncio, mas esse era o jeito do Silvio, ele ia testando a audiência. Essa acabou sendo a cara do SBT", diz ela, que lembra de situações "sui generis", como quando a apresentadora Adriane Galisteu, que comandava o programa Charme, apareceu em 2008 de pijamas diante das telas. O seu programa havia mudado diversas vezes de horário, até que foi parar à 1h30 da manhã, o que motivou o "protesto" de Galisteu.

Criou a própria marca e bordões célebres como 'Quem quer dinheiro?' e 'É namoro ou amizade?'

Mas essas "extravagâncias" também tinham um lado bom, lembra o publicitário Alexandre Peralta, sócio da Peralta Creatives. "Ele ofertava tempos de comerciais maleáveis, como o de 34 segundos. Ninguém no mercado fazia isso", diz Peralta, que construiu sua carreira em grandes agências como AlmapBBDO, DM9 e Africa, antes de abrir o próprio negócio.

Parte do mercado sabia que poderia conseguir no SBT negociações e encaixes que eram impensáveis na Globo, diz ele. "As outras emissoras seguiam sempre o mesmo padrão: vinhetas de 3, 5 ou 10 segundos, comerciais de 15 ou 30 segundos ou 1 minuto", afirma.

Na opinião de Peralta, tal fato se deve ao talento do comunicador de construir credibilidade para a sua própria marca, Silvio Santos, que foi sendo emprestada para os outros negócios do grupo. "Ele tinha um talento incomum de criar identificação com as pessoas e se comunicar com elas de maneira genuína, não imitava ninguém. Era o senhor do improviso e fazia dar certo", diz.

Silvio Santos criou um personagem, uma marca, para si mesmo, e a partir daí foi criando produtos e empresas, como Baú da Felicidade, Lojas do Baú Crediário (rede vendida depois para o Magazine Luiza), banco Panamericano (vendido para o BTG), Tele Sena, Jequiti Cosméticos e Hotel Jequitimar, afirma o publicitário.

"Não consigo pensar em um influenciador nos dias de hoje que tenha tamanho poder de persuasão", diz Peralta, lembrando ainda dos bordões célebres como "Quem quer dinheiro?" e "É namoro ou amizade?".

Numa época em que ninguém falava de marketing de influência, marketing viral ou branded content, ele já dominava todas essas técnicas, lembra. "Ele não precisou de inteligência artificial para conquistar o público: sempre apelou para o humano dentro de cada um, fez conexões e gerou emoção."

Roberta Iahn concorda. "Ele primeiro construiu a própria figura, do homem próximo do público e, em torno da credibilidade dela, foi criando as próprias atrações e os próprios negócios", afirma. "E ele reforçava isso com declarações de impacto, como 'eu sou o homem que mais paga imposto de renda no país', porque é o brasileiro símbolo da honestidade. Isso foi tão forte que, mesmo quando o banco dele quebrou, a sua imagem pessoal não foi arranhada", diz, referindo-se ao Panamericano.

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